Covid-19. Estamos a ignorar  mais uma pandemia?

Covid-19. Estamos a ignorar mais uma pandemia?


“Isto é um grande se”, ressalva Carmo Gomes, referindo-se à mutação da covid-19 encontrada em martas. “Consegue imaginar o que seria as vacinas não serem eficazes contra esta variante e o vírus propagar-se?”, questiona. “O que representaria? Uma nova pandemia?”.


Ainda nem saímos desta pandemia, já enfrentamos receios de outra. Num desenvolvimento que fez surpreendentemente poucas manchetes pelo mundo fora, foi encontrada uma variante mutante do SARS-CoV-2 em martas da Dinamarca, criadas para produção de peles. Isso em si não é novidade, os cientistas já encontraram centenas de mutações do vírus. Os alarmes soaram quando nos apercebemos que esta afeta o espigão da SARS-CoV-2, a pequenina peça de maquinaria viral que o torna tão eficiente a penetrar células humanas – exatamente aquilo que os nossos anticorpos, e todas as vacinas que estão a ser desenvolvidas, têm como alvo. Dias depois, sabia-se que dezenas de pessoas foram infetadas por esta variante do vírus na Dinamarca, que tem menos de seis milhões de habitantes e uns 17 milhões de martas; na semana seguinte, já se falava em centenas de casos.

“Se, por acaso – e isto é um grande se – se confirma que esta variante do vírus não pode ser contrariada pelas vacinas que estão neste momento em desenvolvimento, isso é gravíssimo”, alerta ao i o epidemiologista Manuel Carmo Gomes, professor na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (FCUL). “Imagine o que seria todas estas vacinas não serem eficazes contra esta variante do vírus, e o vírus propagar-se entre nós”, continua. “Consegue imaginar o que isso representaria? Uma outra pandemia”.

Entretanto, a Dinamarca já optou por um abate de martas à escala de industrial, matando dezenas de milhões de animais. Mas a ação das entidades internacionais face à ameaça foi tudo menos decisiva, lamenta o professor da FCUL. O último relatório do Centro Europeu de Prevenção e Controlo das Doenças (ECDC, na sigla inglesa), divulgado quinta-feira, pedia “prevenção de infeções e medidas de controlo para trabalhadores e visitantes de quintas de martas”, bem como testes aos animais, sem sequer mencionar o abate já em curso ou restrições de viagens, referindo que “estudos e investigações estão em curso para clarificar as possíveis implicações”.

“Portanto, reconhecem que, aparentemente, os anticorpos neutralizantes que nós temos para combater o vírus – nós, as pessoas que estão infetadas e desenvolvem anticorpos – não respondiam bem perante esta variante dos vírus que surgiu nas martas, o que é um sinal de alarme, mas que era necessária mais investigação”, afirma Carmo Gomes.

“Fiquei um bocado com uma sensação de déjà vu em relação à atitude que a Organização Mundial de Saúde tem tomado, junto com o ECDC – que está em geral está alinhado com a OMS”, considera. “Acho que devemos ser proativos, já assistimos a demasiado atitudes defensivas. Primeiro em relação às máscaras: puseram em causa que as máscaras podiam ser úteis, depois recuaram e recomendaram as máscaras. A seguir em relação em relação aos aerossóis: puseram em causa que a transmissão por aerossol tivesse um papel importante, depois recuaram e reconheceram que era tão ou mais importante que as gotículas”.

Já o Reino Unido, face à notícia da mutação na Dinamarca, optou imediatamente por fechar o seu corredor de viagem com o país, cancelar todos os voos dinamarqueses e obrigar os britânicos de regresso do país a fazer quarentena. “Em Portugal, nós normalmente estamos alinhados com o ECDC, mas creio que o Reino Unido fez muito bem. Porque se se confirmar o pior cenário – repito, se se confirmar – é péssimo, terrível”.

Mas afinal, o que é que se sabe destas mutações?

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