“Ferro Rodrigues usou uma linguagem desrespeitosa com os portugueses”
“Muitos enfermeiros estudam e põem em prática o reiki, que se assemelha mais a magia do que à ciência”
“Rezava e pedia ao Senhor para me salvar da depressão”
Temos os festejos do 25 de Abril e do 1.o de Maio e não vamos ter os festejos do 13 de Maio. Também não temos as missas abertas, onde podem estar pessoas com o distanciamento pedido…
Há uma coisa importante nesta questão. Nós podíamos inferir daqui que, se os outros têm legitimidade para fazer o 25 de Abril, o 1.o de Maio e até já se põe a hipótese da Festa do Avante!, porque não havemos de ter também essa legitimidade? É curioso, porque tenho estado aqui a ver, mesmo do ponto de vista das datas, como os bispos se anteciparam, por exemplo, ao confinamento, ao estado de emergência decretado pelo Presidente da República. Parece-me que isso foi muito importante também para podermos dizer que não houve uma suspensão do direito de religião da Igreja Católica e das outras religiões em Portugal porque foi a própria religião que antes veio dizer aos seus fiéis “calma, fiquem em casa”. O mesmo aconteceu com Fátima, não é? Houve algumas formas legítimas de dizer “então, se uns podem, porque é que nós não podemos?” e a própria Igreja veio dizer: “Nós não queremos ter vantagem sobre os outros. Queremos cumprir todas as regras e as leis, não queremos que haja para nós leis próprias para o nosso 13 de Maio”. Foi neste sentido que se enquadrou. Repare que, se a Igreja tivesse querido fazer um finca-pé quanto ao 13 de Maio, teria tido um problema, que é o problema que estão a ter os outros. Então, mas como é? A Igreja tem um estatuto próprio, diferente de todas as outras instituições em Portugal, tal como agora os partidos políticos têm? É isto que me parece importante que possamos ver. A própria Igreja, na prudência que teve, não se quis meter à frente de um campo de batalha. Que iria ser um campo de batalha, não é? Neste momento, se me pergunta se eu gostaria de ter o Santuário de Fátima cheio de fiéis ou com alguns fiéis… não sei, é estranho. Gostaria que não tivesse havido algumas destas celebrações, para que todos pudéssemos estar unidos num confinamento para o mesmo.
Nessa crónica disse: “Num dos funerais tive de tirar fotografias ao momento para mandar para os filhos, não puderam vir assistir, estavam longe”. Mas depois diz: “A segunda figura do Estado acha estúpido…” Continua estúpido com isto tudo?
Eu sou estúpido. Continuo a sentir-me estúpido em relação à linguagem que as pessoas usam, isso sim. Acho que não se pode usar, temos de medir… Para mim, dizer “seria estúpido não celebrar o 25 de Abril” e depois dizer que “então íamos mascarados para uma celebração do 25 de Abril” são duas coisas que não têm em conta o contexto atual. Nós precisamos de nos respeitar uns aos outros.
Sente que o presidente da Assembleia da República desrespeitou, é isso?
Acho que é uma linguagem desrespeitosa. Porque eu não me senti estúpido por estar à frente de uma celebração com uma pessoa apenas. Estou há dois meses com uma pessoa e não me sinto estúpido por celebrar. Também não me sinto estúpido por andar açaimado, como às vezes costumo brincar, com uma máscara. Claro que ninguém gosta de ter aquela porcaria à frente da boca.
Acha que a política está acima dos outros portugueses?
Sim, nesse caso concreto. Parece-me que se houvesse um ano em que não se festejasse o 1.o de Maio ou o 25 de Abril… como, aliás, acontece agora com Fátima e como tem acontecido e vai acontecer com muitos espetáculos e muitos eventos celebrativos que são, do ponto de vista de cada um, a coisa mais importante. Há pessoas para quem a coisa mais importante da vida é ir a esses concertos de verão, porque querem aquilo, porque não se interessam nada pelo 25 de Abril ou pelo 13 de Maio. O que está mal é nós pensarmos que porque eu gosto, porque eu quero, porque eu acho importante, tenho de impor ao país uma coisa que não é realmente adequada neste contexto.
Escreveu que em Itália – que tem uma situação muito mais complicada que a nossa – vão abrir as igrejas a partir de dia 18. Disse também: “Quer queiramos quer não, cortar o cabelo é, hoje, mais importante do que ir à missa. Sim, porque nunca se ouviu dizer que os cristãos precisam de estar tão juntinhos para celebrar a missa como os barbeiros estão dos seus clientes”.
Isso é uma coisa importante que deverá fazer-nos refletir. Penso que neste diálogo que tem de haver entre aquilo que é o social, a sociedade, e a revisão que nós queremos também nas políticas públicas, tem que haver um reconhecimento da parte fundamental do homem que é a vida interior, a vida espiritual. Isso ficou provado agora. Um funeral faz parte da vida espiritual da pessoa, não faz parte apenas da vida psíquica da pessoa. A vida espiritual é isto, a relação que estabelecemos entre nós. Uma política ou uma forma de desconfinamento que permite que eu possa cortar o cabelo mas que não me permite que eu venha cuidar dos cabelos interiores, das coisas interiores, está a limitar-me e está a dar-me um sinal de que, em Portugal, nós consideramos a religião como uma coisa secundária na vida humana. Não podemos considerar a religião como uma coisa secundária. Mesmo que, para muitas pessoas, a religião seja uma coisa secundária, a religião é uma coisa transversal a todos os homens. Somos a primeira sociedade de ateus. Eu diria: não há, na história da humanidade, em nenhuma civilização, uma cultura ateia. A não ser a cultura contemporânea que começa a aparecer, alguns focos de ateísmo e até alguns focos de poder, digamos assim, do ateísmo. Que depois querem dominar tudo o resto. Mas a sociedade que nós temos é a sociedade espiritual. É uma sociedade cristã, é uma sociedade católica. Portanto, há determinados pontos que nós precisamos mesmo de perceber. Como é que nós podemos ajudar…
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