Cultura. Já foram cancelados mais de 4200 espetáculos

Cultura. Já foram cancelados mais de 4200 espetáculos


Por cada espetáculo cancelado em Portugal, houve 18 artistas a ficar sem rendimentos. Dados foram ontem revelados pela fundação GDA.


Os espetáculos começaram a ser cancelados na primeira quinzena de março, ainda antes de entrar em vigor o primeiro período do estado de emergência, a 22 desse mês. Depois, já se sabe, o corte de eventos – quer em sala, quer ao ar livre – foi total. Dois meses volvidos, começam a fazer-se contas – e os números aplicados a um setor tradicionalmente frágil são preocupantes. A Fundação Gestão dos Direitos dos Artistas (GDA) tem vindo a medir o pulso à área durante a pandemia e revelou ontem os dados do seu mais recente inquérito. Perto de mil profissionais responderam às perguntas, colocadas no site do organismo em março, revelando que, em média, ficaram mais de 20 pessoas sem rendimento por cada espetáculo cancelado no país. “Segundo as quase mil respostas recolhidas, por cada espetáculo cancelado ficaram em média sem rendimento 18 artistas envolvidos, para além de 1,3 profissionais de produção e 2,5 técnicos”, informou a GDA, a entidade que em Portugal gere os direitos de propriedade intelectual de músicos, atores e bailarinos, em comunicado enviado ao i.

No total, a entidade estima que já tenham sido cancelados mais de 4200 espetáculos no país, maioritariamente concertos – houve “2.964 concertos cancelados, 69% do total”, afirmam. “Foram também registados pelos artistas que responderam ao inquérito disponível no site oficial da GDA, o cancelamento de 1.048 récitas de teatro (24% do total) e de 100 espetáculos de dança (2%), para além de 175 espetáculos de outra natureza (4%)”, diz a GDA.

Um retrato mais lato A maioria dos artistas a responder ao inquérito trabalha na área da música. Mais concretamente, 67% são músicos; 23% são atores, 6% provêm de outras profissões do espetáculo e 4% são bailarinos. “Os resultados acabam por refletir muito as características da relevância da amostra, uma vez que somos uma casa de atores, de bailarinos e de músicos”, afirma Luís Sampaio, vice-presidente da GDA. A ideia da fundação é, agora, juntar os números aos dados de outras entidades para assim traçar um retrato o mais fiel possível da atual situação dos profissionais das artes no país. “Somados aos dados da AMP e do CENA-STE, os nossos resultados poderão contribuir para a construção de um retrato da situação que seja fiel à realidade dramática que está a ser vivida por muitos artistas em Portugal”, acrescenta Luís Sampaio, indicando que irão “disponibilizar a informação recolhida” ao Sindicato dos Trabalhadores de Espetáculos, do Audiovisual e dos Músicos (CENA-STE)”, assim como à Associação dos Músicos de Portugal (AMP).

No mês passado, o CENA-STE já tinha divulgado as conclusões de um outro inquérito, lançado a 19 de março, onde afirmava que 98% dos profissionais de espetáculo tinham visto os seus trabalhos cancelados devido à pandemia. Cerca de 1300 pessoas responderam a este questionário, indicando que, devido aos trabalhos cancelados entre o período de março e maio, tinham perdido um valor médio de receita, por cada trabalhador, de 1500 euros. Após divulgar os resultados, o CENA-STE pediu o “levantamento exaustivo do tecido cultural existente para “diagnosticar necessidades específicas de regiões ou comunidades” e indicou ao Governo um pacote de medidas a serem tomadas “a curto, médio e longo prazo durante os próximos dois anos”. Entre as propostas, contava-se a criação de uma “cartão-cultura”, uma espécie de vale atribuído mensalmente aos cidadãos para ser gasto em cultura e espetáculos.

O novo inquérito levado a cabo pela GDA vem, na mesma linha, alertar para a precariedade dos artistas e as necessidades de apoio ao setor. Entretanto, os dados já foram apresentados em reuniões com o Governo, nomeadamente com a ministra da Cultura, com o Presidente da República e com a presidente da Associação Nacional de Municípios. E se noutros setores o desconfinamento é também sinónimo de retoma da vitalidade, na cultura o caminho será mais tortuoso: por exemplo, os festivais de música foram proibidos até dia 30 de setembro, anunciou o Governo na passada quinta-feira. E os espetáculos em sala funcionarão apenas com lugares marcados, o que, a juntar às novas regras de distanciamento social, fará com que o número de espetadores diminua drasticamente.