Descobertos vários túmulos à volta do globo com o cadáver vivo da História

Descobertos vários túmulos à volta do globo com o cadáver vivo da História


Um guerreiro solitário, objetos de culto ao fundador de Roma e três gerações de amazonas: eis o generoso saldo arqueológico das primeiras semanas deste ano.


Sete palmos de terra podem levar-nos muito longe. Mais do que em profundidade, a viagem pode atravessar séculos, até milénios. É o caso de um túmulo que foi descoberto há algumas semanas no sul de Inglaterra, em West Sussex. Recuando cerca de dois mil anos, na altura em que a terra foi aberta para ser sepultado um guerreiro estávamos entre o final da Idade do Ferro e o início da época romana. As eras fizeram o seu trabalho e do esqueleto não sobrou nada, sendo assim impossível interrogar os ossos sobre a morte, mas o facto de ter sido enterrado juntamente com uma lança de ferro e com a espada numa bainha ricamente decorada, além de mais uns quantos pertences, indicam que o estatuto social deste homem deveria ser elevado. O achado foi reclamado pela equipa da Archaeology South-East, da University College London, considerando-o “incrivelmente raro”, pois trata-se de um dos poucos túmulos descobertos naquela região.

Com toda a sua solenidade, a História tende a ser um tanto avara nos nossos dias, isto depois do período áureo da pilhagem dos seus tesouros, essas décadas em que o roubo de antiguidades se tornou uma febre, de tal modo que eram muitas vezes os cônsules e embaixadores ocidentais a fazerem de salteadores, empenhando-se pessoalmente em promover aventurosas expedições nas nações para as quais eram enviados, saqueando preciosidades que despachavam para os seus países, onde as peças eram disputadas pelos museus. Desta vez, o túmulo foi encontrado por acidente, durante uma escavação nas proximidades da cidade de Chichester, num local onde serão construídas 175 habitações.

Jim Stevenson, líder da equipa de arqueólogos que está a investigar o túmulo, disse à Sky News que não é garantido que o homem ali enterrado fosse um guerreiro. “Tem havido algum debate em relação a quem terão sido em vida estas pessoas cujos últimos ritos respeitavam a tradição guerreira. Seriam realmente guerreiros ou eram apenas trajados como tal?” Além das armas, o indivíduo tinha a seu lado um recipiente de madeira e alguns frascos feitos de argila local. Curiosamente, foram as condições do terreno que determinaram a destruição total do esqueleto. Para Stevenson, as “oferendas funerárias” encontradas no túmulo parecem sugerir que o indivíduo tenha sido alguém importante.

Nos últimos tempos tem-se registado uma série de outras descobertas de grande relevância arqueológica. Há dias, a viagem foi ainda mais longe no tempo: os especialistas que andam de volta do Fórum Romano na capital italiana mergulharam numa área subterrânea perto da Cúria e descobriram um sarcófago com 1,4 metros de comprimento que tinha sido escavado na pedra da colina de Campidoglio, e ainda retiraram um elemento circular que deverá corresponder a um altar. O entusiasmo que este achado está a provocar liga-se às suspeitas de que os dois objetos possam estar ligados a Rómulo, o fundador de Roma, e pensa-se que remontem ao séc. vi a. C.

Desta vez, a descoberta não foi obra do acaso. Os investigadores que trabalham no Parque Arqueológico do Coliseu estavam a seguir pistas que o célebre arqueólogo italiano Giacomo Boni, desaparecido há quase um século, desencantou estudando documentação que apontava para a presença de um santuário dedicado ao fundador de Roma. A descoberto do sarcófago ao lado da rostra, as arquibancadas do Fórum Romano, parece confirmar o local onde, segundo Marco Terencio Varrone e outros historiadores antigos, garantem que foi enterrado Rómulo. 

Também este ano, logo no início de janeiro, uma outra descoberta foi noticiada, envolvendo desta vez um cemitério de uma povoação no oeste da Rússia. Na localidade de Devitsa foi encontrado um túmulo com esqueletos de quatro mulheres de três gerações diferentes e que terão vivido na segunda metade do séc. iv a.C. A equipa de arqueólogos a cargo da investigação acredita que eram amazonas, mulheres guerreiras que pertenciam aos citas, um povo nómada que habitou vastas extensões de terra no sul da Rússia, na Ucrânia e na Ásia central desde o séc. ix a.C. até ao séc. iv d.C. Na cabeça de uma das mulheres foi encontrada uma cobertura feita de ouro que, segundo a equipa do Instituto de Arqueologia da Academia Russa de Ciências, é o primeiro adorno deste género encontrado numa sepultura de uma amazona e no troço intermédio do rio Don, na Rússia.

No que toca a um balanço do que já nos trouxe este ano, as contas estão feitas. Mas se cruzarmos a fronteira para 2019, damos com um buraco de fechadura por onde espreitar a vida e a morte há mais de 3500 anos, na Grécia Antiga. Perto de Pilo, no Peloponeso, desta vez coube a uma equipa norte-americana, arqueólogos da Universidade de Cincinnati (Ohio), a descoberta de dois túmulos em forma de colmeia e que remontam à Idade do Bronze. Neles foram encontradas joias e uma série de artefactos que documentam a vida das comunidades que ali se dedicavam à agricultura. São túmulos que precedem e dão origem à era clássica da Grécia, esse período em que mais firmemente foi embalado o berço da nossa civilização, quando começaram a ser construídos os grandiosos e tocantes monumentos e esculturas que desde então nos enfrentam com uma ideia de beleza e harmonia insuperáveis. A equipa liderada por Jack Davis e Sharon Stocker acredita que o motivo por que não se perdeu o conteúdo dos dois túmulos é estes terem ruído ainda na Antiguidade, o que os salvaguardou da sanha dos saqueadores.

Nestes túmulos de estrutura circular foram encontrados centenas de artefactos com influência minoica, micénica e até egípcia, incluindo um anel em ouro com dois touros ladeados por espigas de cevada, que será uma das mais antigas representações, talvez a mais antiga, de animais domésticos participando na atividade agrícola. Jack Davis mostrou-se imensamente entusiasmado com a descoberta da sua equipa, afirmando que “há 50 anos que não se descobriam túmulos tão substanciais como estes num complexo palaciano da Idade do Bronze”.