Conan Osíris. “Se sentisse pressão tinha-me suicidado depois de lançar o álbum”

Conan Osíris. “Se sentisse pressão tinha-me suicidado depois de lançar o álbum”


Depois do sucesso inesperado do seu segundo álbum, Adoro Bolos, e do mediatismo que a participação no festival da Eurovisão lhe trouxe, Conan Osíris pretende com a atuação no Coliseu de Lisboa fechar um ciclo


Dois anos foram o suficiente para virar do avesso a vida de Conan Osíris, alter-ego de Tiago Miranda. Autor de Adoro Bolos e autor da faixa Telemóveis que lhe permitiu vencer o Festival da Canção e a participação na Eurovisão. Agora, apresenta-se pela primeira vez no Coliseu de Lisboa num concerto que, admite, serve para fechar este ciclo da sua carreira e que vai permitir mais liberdade e excessos no seu espetáculo.

Antes de atuares no Coliseu deste um concerto na China, como foi a experiência?

A China foi super-elucidante, foi muito mais do que ir tocar a um sítio. Descobri uma certa sanidade e validação nas minhas próprias linguagens, algo que não estou muito habituado a sentir, por isso, foi uma experiência fixe a nível de viagem. A nível pessoal foi uma experiência super fixe, não sei se tem a ver com o próprio budismo que, a bem dizer, é o que está mais implementado e é o que sentes no trato com as pessoas, acho eu, pelo menos é a única explicação que tenho para o pessoal ser todo tão cordial e calmo.

Como é que receberam as tuas músicas por lá?

A primeira coisa que notei foi o respeito. Não estava ninguém a conversar. Podiam não me conhecer e não fazer ideia do que estavam a ver, mas estava toda a gente calada a ver e a apreciar o show. Quando sentiram mais conexão com a parte musical e começaram a dar de si começaram a cantar, a dançar a tentar imitar os nossos gestos. Foi uma experiência super gratificante e que significou que o nosso show estava a fazer sentido só na base da música e não nas palavras e no significado daquilo que estávamos a dizer. Ultrapassou a barreira linguística. Tanto na China como em Macau, embora em Macau estivessem mais portugueses.

Já deste concertos em São Paulo, Berlim, Oslo, Paris e Barcelona. Sentes que há uma grande diferença entre os públicos internacionais e na maneira como reagem à tua música?

Depende do conhecimento que a pessoa tenha da língua portuguesa, a partir do momento em que a pessoa entende o que estou a dizer a experiência torna-se um bocado diferente, mas sim, muda bastante. Também tem bastantes semelhanças ao mesmo tempo, depende muito da vibe. Por exemplo, em Barcelona, atuei numa festa que parecia tipo o São João, com montes de gente e estava uma energia mesmo brutal, parecia que estava a tocar no Terreiro do Paço. Presumo eu que não estivessem a perceber, mas estava uma energia como se estivessem.

E achas que os públicos estrangeiros também reagem de uma forma tão efusiva aos teus instrumentais?

Depende do background da festa. Essas festas em Barcelona foi muito isso, o público queria mesmo consumir este estilo de música. Estavam a cantar bué e a dançar bué, como se fosse uma festa de rua. Mas também há shows mais calmos, como em Oslo, com um background mais nórdico, mais respeitoso, não tão para dançar mas mais de visualizar e tentar entender as palavras e os seus significados. É sempre curioso estar em cima de palco e notar esses microclimas que se vão criando dependente do sitio e da venue e do tipo de festa que é.

Falando agora do concerto no Coliseu, este parece estar anos-luz afastado dos teus primeiros concertos marcados pelo minimalismo do teu set, onde te apresentavas a solo com o teu dançarino João Reis Moreira. Quais são para ti as maiores diferenças?

Achámos que fazia sentido. Sendo um show em Lisboa, na nossa casa, já fizemos bué shows, Musicbox, Lux, parecendo que não já passaram quase dois anos desde o primeiro concerto na Zé dos Bois, tínhamos que aproveitar o coliseu para fazer algo um pouco mais diferente

Este palco parece ser o ideal para mostrar todo o excesso da tua imaginação?

Well, vamos ter de esperar para ver, estamos agora nos ensaios a tratar disso

Como é que reagiste a esta transição de um set minimalista para um espetáculo com tantos adereços e músicos?

Para mim é como entrar numa casa com uma assoalhada ou estar numa mansão com setenta quartos, eu adapto-me ao sitio onde estou, atribuo o mesmo valor e o mesmo significado. Sem querer menosprezar o Coliseu ou soar ingrato, acho que todas as casas tem que ser respeitadas, portanto tanto respeito uma casa com cem lugares, a tasca do Chico que tem sete mesas, ou o Coliseu que tem milhares de lugares, temos que nos adaptar visualmente ao sitio onde estamos

Sentes que este concerto é uma confirmação do teu trabalho ou o encerrar de um ciclo?

É literalmente as duas. Fechar canções, fechar este período de dois anos em que temos estado a tocar o Adoro Bolos, fechar essa porta. Não no sentido de nunca mais tocar nada antiga ou que nunca mais vai acontecer nada com o João. Fechar no sentido de que quero ter férias finalmente, ficar um bocado em casa, ter as minhas inspirações novas, fazer as minhas cenas novas e ter ideias novas para 2020.

O que muita gente deve estar a perguntar deve ser: e agora, o que é que vem depois de Adoro Bolos?

Primeiro temos que ver se o mundo não acaba na passagem de ano para 2020 [risos]. Não quero que pensem que [o próximo álbum] vai ser uma sequela do Adoro Bolos, vai ser uma coisa diferente. Não quero que o Adoro Bolos se torne um statement do género, agora o que vou fazer para a frente vai ser o Adoro Bolos 2. Isso não existe, vai ser uma coisa nova.

Esta progressão nos concertos ao vivo também vai ser sentida nas tuas próximas músicas com arranjos e produções mais grandiosas e ousadas?

Vou manter a minha linguagem e os meus métodos mas agora com um bocadinho mais de conhecimentos técnicos.

Depois do mediatismo da Eurovisão e do sucesso de Adoro Bolos sentes mais pressão para fazer os teus próximos trabalhos?

Não. Imagina, se sentisse pressão não tinha feito mais nada desde que o álbum saiu. Parece que o Diabo saiu da tumba. É só opiniões e cenas, se tivesse sentido pressão nem sequer tinha ido ao festival da canção. Se sentisse pressão tinha lançado o álbum e depois suicidava-me [risos], mas isso não acontece, portanto no pressure whatsoever, a única pressão que sinto é a do tempo

Dado as tuas influências menos convencionais, e até a forma como começaste a fazer música no teu quarto, achas que já estás a marcar uma nova geração de músicos?

Não sei se estou a marcar, mas faço parte de uma nova geração. Não diria que marquei alguma coisa, acho que tudo o que faço sempre existiu. Sempre existiram pessoas a fazer musica sozinhas, sem formação musical e que faziam musica na mesma. Não gosto muito de me ver como uma pessoa que começou alguma cena. Gosto de ver que faço parte de uma cena qualquer que eu não sei ainda o que é, mas que as pessoas dizem que é uma coisa nova.

Já tivemos grupos como os Buraka Som Sistema ou até os Blasted Machanism que para além da sua música impressionava pela sua presença e apresentação, sentes que vens desse tipo de background?

Não é para ser generalista, mas acho que tudo o que está acima de ti te influencia, mesmo que seja indirectamente. Eu considero que sofres influências de coisas e pessoas que nem consomes directamente. Eu não ouço fado, mas a minha mãe ouvia tanto fado que acabou por ficar entranhado no meu estilo vocal. Não me consigo sentar com uma guitarra a tocar um fado porque simplesmente não sei, mas tenho esse código genético em mim. Da mesma forma que influências como Buraka, claramente, ainda por mais vindo da cena de kuduro, dos Blasted que tinham elementos de folk misturado com música eletrónica e tudo mais, claro que sim, claro que me influenciou, assim como me influenciou a Romana… a melhor maneira de descrever as minhas influências é um vídeo de uma cena do Big Show Sic que era o ‘Olá Princesa’. O João Baião enviava um miúdo para a casa de uma miúda pequena para lhe fazer uma entrevista e dar-lhe bué da presentes. Há um episódio em que o enviado do João Baião está a falar de música com uma menina e lhe pergunta ‘então que musicas é que tu ouves?’ e ela responde: ‘Marilyn Manson’ e começa a cantar a Beautiful People. Depois de seguida diz que a cantora preferida portuguesa é a Romana e começa a cantar a Já Não Sou Bébé da Romana. Se pesquisares este vídeo no Youtube, vais entender bué bem, num vídeo bué curto, como funcionam as minhas influências e como eu sou essa miúda. Esta é a maneira mais simples de explicar as minhas influências.