Guardar metade da terra para a natureza? Ideias para garantir o futuro do planeta

Guardar metade da terra para a natureza? Ideias para garantir o futuro do planeta


Árvores a sério ou artificiais? E se a solução for aquicultura de algas? Ou partículas que dispersem os raios solares? Reunimos algumas propostas lançadas nos últimos anos para responder aos desafios do planeta, umas mais disruptivas e outras mais pragmáticas. É o caso desta novidade em Itália: o Governo está a estudar um desconto de…


Biodiversidade

Um relatório divulgado este ano pela ONU alertou para a ameaça crescente à biodiversidade, com um milhão de espécies em vias de extinção. Quarenta por cento das espécies de anfíbios, quase 33% dos recifes de corais e mais de um terço de todos os mamíferos marinhos estão sob ameaça. Uma das propostas mais radicais foi lançada pelo biólogo norte-americano Edward O. Wilson. No livro Half Earth, publicado em 2016, defendeu que a única solução para evitar o colapso dos ecossistemas e da espécie humana passa por constituir reservas numa área equivalente a metade da superfície da Terra, o limite “seguro” que garantiria a estabilização de 80% das espécies, diz. Wilson acredita que seria também um objetivo simbólico. Em 2017 comparou o momento ao discurso de Kennedy, quando este fixou o objetivo de pôr o homem na Lua numa década. “Podemos fazer isso em dez anos”, disse à Globo, dando o exemplo do mar. “Apenas 3% dos mares do mundo são protegidos hoje pelas nações territoriais, aquelas que têm litoral e mares territoriais. São chamadas zonas económicas exclusivas. Como vamos passar de 3% para 50%? É fácil (…) Basta proibir a pesca em mar aberto, fora das zonas territoriais dos países. O mar aberto não é de ninguém. Qualquer um pode pescar lá. E vemos a vida marinha a encolher enormemente. Se o proibíssemos, o mar aberto tornar-se-ia um grande viveiro de imensas quantidades de peixes e vida marinha”.  
 

Florestas artificiais

Os incêndios na Amazónia colocaram os perigos da desflorestação na ordem do dia, também pelo contributo da floresta na absorção de CO2. E se a “fotossíntese” artificial for a solução para mitigar as emissões? Nos últimos anos foram anunciados diferentes protótipos. Klaus Lackner, do Centro para Emissões Negativas de Carbono da Universidade do Arizona, inventou uma estrutura que captura carbono através de uma reação química com um tipo de resina. “As nossas árvores são especialistas em captura de dióxido de carbono e são cerca de mil vezes mais rápidas do que as árvores naturais”, disse em 2016. Este ano, uma dupla de investigadores alemães publicou resultados sobre uma nova tecnologia. “Como as árvores verdadeiras, a tecnologia usa dióxido de carbono e água como alimento e a luz do sol como fonte de energia, mas em vez de transformar o dióxido de carbono e água em folhas e ramos, produz produtos ricos em carbono, como álcool”, descreveu o Fórum Económico Mundial. Matthias May, um dos autores, defende que a diminuição das emissões é a solução mais económica, mas a tecnologia terá de ser uma aliada da descarbonização. Segundo o investigador, uma área do tamanho do Havai com “folhas artificiais” poderia captar tanto CO2 como toda a Europa coberta das plantas mais sedentas de carbono. 

Cultivar algas

Cultivar algas para aumentar a capacidade de absorção de carbono é outra das propostas. Há até uma empresa que propõe um biorreator portátil para instalar em casa e “limpar” o ambiente. Uma equipa de investigadores da Universidade da Califórnia publicou este ano um artigo na revista Current Biology em que defendem que o cultivo em massa de algas, que posteriormente seriam afundadas no oceano, contribuindo assim para a captura de CO2 da atmosfera, pode vir a ser uma arma de peso no combate às alterações climáticas. Os investigadores consideram que isso poderia ser algo a considerar nos planos de neutralidade carbónica a nível local, aliando-se a outras medidas de redução de consumo. E dão um exemplo: alocar 3,8% da zona económica exclusiva ao largo da Califórnia à aquicultura de algas seria o suficiente para compensar o carbono produzido pelo setor agrícola neste estado – com outras vantagens, como garantir habitat a espécies marinhas e combater a acidificação do oceano. 

O imposto da carne

A medida já foi discutida na Suécia e na Dinamarca e tornou a ser discutida este verão na Alemanha, com uma proposta de deputados do Partido Verde e do SPD para o aumento do IVA da carne da atual taxa reduzida de 7% para 19%. Do lado da CDU houve alguma abertura, com o pressuposto de as receitas serem usadas no bem-estar animal e na agricultura sustentável, mas a ideia foi rejeitada pela ministra da Agricultura. Nos últimos dias, Merkel anunciou um plano de ação climática que avança com um novo preço para o dióxido de carbono e aposta em carros elétricos e viagens de comboio. Sobre a carne, não houve novidades. A ONU defende a redução do consumo e a aposta em produtores locais e, por cá, gerou controvérsia a decisão da Universidade de Coimbra de proibir vaca nas cantinas. Segundo um estudo feito em seis municípios portugueses, o consumo de carne representa em Portugal entre 23% e 26% da pegada ecológica da alimentação. O desperdício alimentar (17% da produção alimentar anual) é outro aspeto a ter em conta na relação entre prato e ambiente.

Filtro solar

 Uma equipa da Universidade de Harvard anunciou que este ano iria estudar uma nova abordagem ao problema do aquecimento global, libertando na estratosfera partículas de carbonato de cálcio. A ideia é criar uma barreira aos raios solares e combater o efeito de estufa. Para já, trata-se de uma primeira experiência em que dois balões dirigíveis vão libertar as partículas e analisar o impacto na densidade de aerossóis, química atmosférica e dispersão de luz , explica o site da Experiência de Perturbação Estratosférica Controlada (SCOPEX), com um orçamento de 3 milhões de dólares e financiamento da fundação Bill Gates. Apesar de ter sido prometida para o final de 2019, ainda não se sabe quando terá lugar a experiência e se vai mesmo acontecer. A última novidade foi a constituição de um painel para estudar as implicações éticas, ambientais e geopolíticas da experiência. O tema é sensível: já foi proposto o uso de dióxido de enxofre para arrefecer o planeta e a base são erupções vulcânicas, como a do monte Tambora, em 1815, em que a ejeção de partículas resultou num arrefecimento do planeta. Teme-se os efeitos colaterais, por exemplo na composição da chuva. E alguns autores avisam que a bioengenharia solar pode virar-se contra o feiticeiro, se retirar urgência à necessidade de reduzir as emissões. 

Menos plástico

O problema não está apenas na enorme ilha de plástico no meio do Pacífico (e como limpá-la) e nos riscos dos microplásticos para a saúde humana e animal. Um relatório publicado este ano pelo Centro de Direito Ambiental Internacional, uma plataforma ambiental sediada nos EUA, alertou para o impacto da indústria e do ciclo de vida do plástico nas emissões de CO2, estimando que em 2050 será responsável por 10% a 13% do excesso de carbono e poderá pôr em causa o objetivo de conter o aquecimento global a 1,5 oC. A proibição de sacos leves, palhinhas e cotonetes tem sido um dos caminhos – em Portugal, a venda de produtos de plástico de uso único deverá ser proibida a partir do segundo semestre de 2020. Em Itália, um projeto de decreto ambiental noticiado nos últimos dias pela imprensa prevê a criação de um desconto de 20% na compra de produtos a granel que não tenham qualquer tipo de embalagem e descontos também para embalagens recicláveis. No que toca a alternativas, o campo dos “bioplásticos”, de origem renovável, continua a crescer, embora nem todos sejam biodegradáveis. No Reino Unido foi nos últimos dias notícia um prémio atribuído a um plástico feito a partir de restos de peixe e algas vermelhas, Marina Tex.