“Doença misteriosa mata cães na Noruega”. Foi sob este título que, no sábado, a agência Associated Press deu conta de dezenas de mortes de cães no país escandinavo depois de apresentarem sintomas de vómitos, debilidade repentina e diarreia ensanguentada. Foram reportadas mais mortes em redor de Oslo, mas também houve casos nas cidades de Bergen, Trondheim e ainda no condado de Nordland. Depois das necropsias, o Instituto Veterinário Norueguês (equivalente à Direcção-Geral de Veterinária portuguesa) detetou duas bactérias não especificadas no organismo dos animais vitimados. Contudo, para lá da rapidez com que a ‘doença’ progrediu e dos sintomas comuns, as autoridades norueguesas não conseguiram traçar nenhum paralelo entre os casos nem estabelecer uma fonte comum à morte destes animais. “Ainda não sabemos se é contagioso ou apenas uma série de casos individuais”, disse o porta-voz do Instituto à televisão NRK. “Ter cães saudáveis a morrer tão rápido é, naturalmente, preocupante. É uma situação muito especial na qual nunca estive envolvido”, assumiu o diretor do organismo, Jorun Jarp.
Até ao momento, foram contabilizadas cerca de 25 mortes e as autoridades sanitárias norueguesas recomendam às pessoas que, em caso de sinais de alerta, procurem rapidamente a ajuda de um médico veterinário.
Novo vírus é pouco provável O caso saltou rapidamente as fronteiras da Noruega e as autoridades veterinárias da vizinha Suécia começaram a ser inundadas com questões vindas de donos preocupados com uma eventual doença contagiosa. Por cá, apesar da distância do fenómeno, também há quem se questione acerca do estranho surto. Mas Luís Montenegro, diretor clínico do Hospital Veterinário Montenegro, acredita que não há razões para sobressalto. “Não há razão para entrar em alarmismos até porque, principalmente no verão, estes quadros de mortes rápidas por gastroenterite aguda são comuns”, refere, sublinhando que, até ao momento, as autoridades sanitárias “não encontraram nada que justifique que estamos perante um novo vírus nem passaram nenhuma informação nesse sentido à comunidade científica”.
O médico veterinário considera que se todas as mortes de cães que apresentem um quadro similar fossem reportadas à mesma autoridade, tanto Portugal como os outros países já teriam contabilizado casos suficientes para fundamentar uma notícia semelhante. “Se eu e os meus colegas reportássemos e cruzássemos informação, certamente teríamos números a apontar. Há muitos casos de gastroenterite severa que duram entre 24 a 72 horas”, explica.
Para Luís Montenegro há uma série de fatores que justificam esta preponderância estival. Os cães não só andam mais na rua – e, por isso, têm mais acesso a matérias putrefactas – como, mesmo dentro de casa, estão mais expostos a comida estragada. “Principalmente quem cozinha a comida dos cães em casa e a deixa desacautelada até à noite está sujeito” a que esta se transforme numa fonte de bactérias.
Se esta é uma realidade comum a todos os países, há especificidades deste verão norueguês – um dos mais quentes dos últimos anos – que poderão dar pistas sobre o caso. “Com tantas alterações climatéricas, há a possibilidade de que, na Noruega, os cães estejam a ter acesso a mais matérias em decomposição do que noutros anos”, aponta o veterinário, lembrando que é necessário que os tutores ajustem os comportamentos às mudanças do meio ambiente.
Para lá dos fatores ambientais, poderá haver outra explicação que vai ao encontro da tendência de não vacinar os animais. Na Europa, “de uma forma geral, têm-se descurado um pouco as reformas vacinais”, garante Montenegro. Com as doenças cada vez mais controladas, há donos que escolhem não vacinar os seus animais, o que pode levar ao aparecimento de “novos surtos de doenças”.
E serão as duas bactérias reveladas pelas necropsias sinal de que poderemos efetivamente estar perante um novo vírus ou uma doença até aqui desconhecida? Nem por isso. “Na gastroenterite bacteriana vai haver sempre predomínio de algum tipo de bactérias”, explica Luís Montenegro, avançado que as bactérias encontradas nos animais teriam não só que ser as mesmas como estar “no mesmo número” – um cenário que não é confirmado pelo Instituto Veterinário Norueguês.
Uma atenção serena As autoridades norueguesas continuam a monitorizar o caso, até porque estão preocupadas com a rapidez com que esta ‘doença’ tem atingido os cães e porque ainda não descartaram empiricamente – nem provaram – que não se trata de um problema contagioso.
Os sinais, contudo, são positivos: não há relatos de casos fora do país e ontem não havia notícias de mais mortes semelhantes na Noruega. Mas como prevenir é sempre melhor do que remediar, os tutores devem, como em qualquer outra situação, manter-se serenamente atentos. Na gastroenterite, a presença de sangue nas fezes ou no vómito e a prostração do animal são os primeiros sinais de alarme. E uma gastroenterite aguda, que avança muito rapidamente, pode ser fatal para cães muito jovens ou já debilitados, lembra o especialista, reforçando que a intervenção nas primeiras horas é essencial.
O que pode fazer para proteger o seu cão
Ter as vacinas e desparasitações em dia
• Consulte o médico veterinário para cumprir ou rever os programas vacinais e de desparasitação
• Quem teme vacinar o seu animal em excesso pode sempre pedir análises específicas que medem a população de anticorpos existentes e, a partir daí, ajustar o programa de vacinas – em qualquer um dos casos, não deve nunca deixar de vacinar o seu animal (há surtos de doenças controlados, mas há sempre a possibilidade de que surjam novos surtos e novas doenças)
Melhorar a alimentação do animal
• Não deixe a comida desacautelada (principalmente quem cozinha a própria refeição do animal). Às vezes, basta o aumento de três ou quatro graus para os alimentos se estragarem durante o dia, uma situação menos provável no inverno
Melhorar o habitat e a higiene
• Mantenha uma boa higiene tanto do animal como do espaço onde se encontra
Esteja atento aos sinais
• Uma gastroenterite aguda pode ser fatal para animais jovens ou debilitados ou caso não haja uma rápida intervenção
• Caso o seu cão se mostre prostrado ou se detetar sangue nas fezes ou vómito procure de imediato a ajuda de um médico veterinário