Prémio Pessoa 2018 distingue o cientista Miguel Bastos Araújo

Prémio Pessoa 2018 distingue o cientista Miguel Bastos Araújo


Especialista em biogeografia na área da biodiversidade e alterações climáticas recebe o galardão do jornal “Expresso”, que distingue uma personalidade portuguesa que tenha tido uma “intervenção particularmente relevante e inovadora na vida artística, literária ou científica”.


Miguel Bastos Araújo é geógrafo, investigador da Universidade de Évora e catedrático da Universidade de Copenhaga e do Imperial College de Londres, tem 49 anos e, como assinala o "Expresso", é um dos maiores especialistas mundiais em alterações climáticas e biodiversidade.

O cientista é o galardoado nesta 32.ª edição do prémio, que conta com o patrocínio da Caixa Geral de Depósitos, e tem o valor pecuniário de 60 mil euros. No fundo, o júri do Prémio Pessoa 2018 veio assinalar internamente (leia-se: reconhecer em Portugal o que se tornou evidente além fronteiras) o mérito científico que o trabalho de Miguel Bastos Araújo granjeou lá fora, sendo que o resultado da sua investigação lhe valeu, este ano, o Erns Haeckel Prize, atribuído pela Federação Ecológica Europeia. A cerimónia da entrega desse prémio terá lugar durante o 15º Congresso da organização, que decorrerá em Lisboa, em agosto de 2019. A Federação reúne 18 organizações ecológicas de 18 países e será, a partir de janeiro, presidida pela portuguesa Cristina Máguas.

Por esta altura, em 2016, numa publicação no Facebook, Pedro Almeida Vieira, antigo jornalista do "Expresso" dedicado à área do ambiente, lembrava que "há uns anos (para aí mais de 10), o meu amigo Miguel Araújo quis regressar a Portugal e candidatou-se a um concurso de professor numa universidade de Lisboa. A candidatura foi recusada por motivos muito esquisitos… Nunca mais voltou… Talvez ainda bem: ficou por Espanha e acabou ontem a receber o Prémio Rei Jaime I…"

O júri do Prémio Pessoa vem, por isso, salvar a honra de um país que frequentemente é o último a saber quando um dos seus se torna grande lá fora. Miguel Bastos Araújo perfila-se, hoje, como uma das figuras de maior relevo no diagnóstico dos desequílibrios que a acção humana tem provocado no planeta, tendo recebido "importantes prémios internacionais", obtidos nos últimos cinco anos. Destacam-se o Ebbe Nielsen Prize (2013), o Wolfson Research Merit Award (2014), o King James I Award (2016) e o Ernst Haeckel Prize (2019).

Bastos Araújo é o primeiro geógrafo a ser distinguido com o Prémio Pessoa. De resto, é também a primeira vez, nas suas 32 edições, que é destacada uma pessoa da área do ambiente. O "Expresso" vinca que Bastos Araújo é um dos investigadores mais citados nos rankings das publicações académicas e um dos autores mais consagrados internacionalmente pelo trabalho desenvolvido sobre as alterações climáticas e o seu impacto na biodiversidade. Já o galardoado, numa reacção àquele jornal a partir de Madrid, encara a distinção como sinal do reconhecimento da importância do estudo da biodiversidade "num momento em que existem movimentos de contra-ciclo que procuram prejudicar a agenda da conservação da biodiversidade". E acrescentou: "Sinto que não é um prémio só meu”.

Na notícia veiculada pelo jornal do grupo Impresa, é destacada uma afirmação feita por Miguel Bastos Araújo numa entrevista ao "El País" quando foi anunciado que tinha recebido o Erns Haeckel Prize: "Estamos a mudar o funcionamento elementar do planeta. O Homem é uma espécie de muito sucesso, que pode chegar a morrer do seu próprio êxito. Sobrevivemos a alterações climaticas, no passado. Atravessámos uma idade do gelo que era muito adversa e não possuiamos a tecnologia atual. Mas, uma coisa é sobreviver e outra é o mundo em que vamos viver no futuro e se ele corresponde ao que queremos. Caminhamos para um cenário em que vamos pagar um preço muito elevado pela adaptação e também de qualidade de vida".

No perfil que traçou de Miguel Araújo, o "Expresso", refere que, tendo orientado "dezenas de mestrados e doutoramentos, é, há cinco anos consecutivos, um dos autores mais citados em publicações científicas e académicas". E informa também que, no prestigiado ranking anual da empresa americana Clarivate Analytics – o "Highly Cited Researchers 2018" -, , divulgado no início de dezembro, figurava entre os 15 investigadores mais citados do mundo a trabalhar em Portugal (Universidade de Évora), num universo de 4000 cientistas. A lista incidiu apenas nos artigos altamente citados, que representaram 1% do que se publicou no mundo em 21 áreas científicas.

Nascido em Bruxelas, o cientista vive entre Madrid e Évora. Tendo-se licenciado em 1994 em Geografia e Planeamento Regional (na Universidade Nova de Lisboa), em 1996 obteve o mestrado em Conservação, no University College, em Londres, onde completou também o doutoramento em Geografia, em 2000. É investigador coordenador no Museu Nacional de Ciências Naturais (parte do Conselho Superior de Investigação Científica em Madrid, Espanha), investigador coordenador convidado na Universidade de Évora, e Professor Catedrático convidado na Universidade de Copenhaga e no Imperial College de Londres.

Quanto ao júri da edição deste ano do Prémio Pessoa, foi uma vez mais presidido por Francisco Pinto Balsemão, e conta ainda com a seguinte composição: Emídio Rui Vilar (vice-presidente); Ana Pinho; António Barreto; Clara Ferreira Alves; Diogo Lucena; Eduardo Souto de Moura; José Luís Porfírio; Maria Manuel Mota; Maria de Sousa; Pedro Norton; Rui Magalhães Baião; Rui Vieira Nery; Viriato Soromenho-Marques.

O semanário deixou claro que o trabalho do investigador no campo das alterações climáticas foi o elemento preponderante na atribuição do prémio e, no anúncio da sua atribuição, Balsemão disse que o trabalho do geógrafo "tem contribuído para reforçar as bases científicas da política de ambiente, em particular desenvolvendo mecanismos de gestão e de redução da incerteza, no sentido de permitir uma melhor protecção da biodiversidade no quadro de mudanças profundas introduzido pelas alterações climáticas em curso".

"Numa altura em que, no plano político, económico e cultural, a nível global, se erguem tantas vozes e forças poderosas, criando obstáculos ao contributo das ciências para o estudo e a busca de soluções para os problemas fundamentais da sobrevivência humana, nomeadamente no que respeita à crise do ambiente e das alterações climáticas, a atribuição do Prémio Pessoa 2018 a Miguel Bastos Araújo constitui um sinal claro de que o conhecimento, a ciência com consciência e as políticas públicas nela inspiradas, são indispensáveis para alimentar a esperança num futuro sustentável”, refere a nota de imprensa sobre o Prémio Pessoa 2018. 

Na cerimónia de anúncio do prémio, que decorreu em Sintra, Balsemão referiu ainda que "além da autoria de uma vasta bibliografia científica de mais de duzentos títulos, que se encontram entre as publicações mais citadas na literatura académica das áreas mencionadas, Miguel Bastos Araújo tem-se distinguido também pelo contributo para a formação de novos investigadores e para o desenvolvimento de projectos científicos de grande relevo". Outro aspecto mencionado, é criação da Cátedra de Biodiversidade Rui Nabeiro, na Universidade de Évora, sob a direcção de Miguel Bastos Araújo. "Um caso raro de mecenato científico em Portugal", destacou o presidente do grupo Impresa.