Lufeng Ye foi passear com o seu cão Boris em Viseu no dia 23 de setembro de manhã, e depois seguiu para o trabalho como fazia habitualmente, horas depois quando chegou a casa reparou que o animal piscava muito os olhos.
“Comecei a entrar um bocado em pânico e limpei-lhe os olhos outra vez com soro fisiológico”, afirmou à TVI24. “Na manhã do dia seguinte reparei que o cão tinha os olhos completamente brancos e levei-o de urgência ao oftalmologista canino, em Aveiro”, acrescentou.
O diagnóstico foi claro: “Os sinais clínicos exibidos e a manifestação aguda são compatíveis com queimaduras de córneas bilaterais por agente químico”. No entanto não foi possível identificar o agente que provocou a queimadura, apenas que a cegueira se ficou a dever ao contacto com um produto tóxico.
O dono de Boris deu conta da sua revolta e vários comentadores chamaram a atenção para o facto de a Câmara Municipal de Viseu ter andado a pulverizar herbicidas nas ruas e passeios durante a madrugada nos dias anteriores.
O homem acredita que o cão “possa ter sido contaminado na zona do Inatel [bairro de Marzovelos] porque havia uma zona com ervas ligeiramente mais altas e daí o contacto mais direto com os olhos”, contou à TVI24. “É um perigo temível. Conforme foi com o meu cão, podia ter sido uma criança. Temo que, no futuro, possa voltar a acontecer”.
A preocupação dos munícipes acerca destas pulverizações já é anterior ao episódio com este cão, no Facebook já existia uma página com o nome STOP Glifosato Viseu, referindo-se à substância utilizada pela autarquia.
O glifosato é um componente presente em muitos herbicidas e é utilizado sobretudo para eliminar ervas daninhas nos jardins e ruas das localidades, apesar de a Organização Mundial de Saúde referir que esta é uma "provável" substância cancerígena.
Contactada pela TVI24, a autarquia respondeu que “não efetua aplicação de quaisquer produtos fitofarmacêuticos em espaços verdes”. No entanto, reconheceu que na zona de Marzovelos, local provável para o contacto do produto no cão, foi aplicado, por uma empresa autorizada, o herbicida Sereno na madrugada do dia 19 de setembro e que, “por parte da autarquia”, foi utilizado “o herbicida Roundup Ultra Max”
A autarquia frisou que ambos os produtos fazem parte da lista de herbicidas para utilização em zonas urbanas e de lazer emitida pela Direção Geral de Agricultura e Veterinária, “sendo por isso autorizada a sua aplicação na via pública”.
Sublinhe-se que o passeio no qual o animal terá ficado cego ocorreu três dias depois da pulverização, os avisos sobre a utilização destes produtos nem sempre são feitos e quando o são têm apenas uma antecedência de 24 horas.
A médica veterinária, coordenadora da Campanha “Autarquias sem Glifosato” e membro da Quercus, Alexandra Azevedo, disse que “infelizmente estes produtos [Sereno e Roundup] estão classificados como não perigosos, e alguns [do género] nem têm classificação toxicológica, o que ainda é mais surpreendente”.
Para a especialista ninguém pode afirmar que foi a causa nem se pode descartar que não terá sido, o que não podemos afirmar categoricamente é que não foi. Faz todo o sentido haver a suspeita”.