Turismo insustentável. Cidades arriscam perder a identidade

Turismo insustentável. Cidades arriscam perder a identidade


Filas intermináveis, aumento do lixo, transportes lotados, monumentos danificados pela sobrecarga de visitantes: o turismo de massas está a descaracterizar os principais destinos turísticos. No Porto, avisa a revista “Der Spiegel”, quem sofre são os residentes


Os números chegam das mais variadas fontes e não deixam margem para enganos: Portugal continua na moda e o turismo não pára de crescer. Em 2017, passaram por cá 24,1 milhões de hóspedes e houve 65,8 milhões de dormidas – ambos os dados representam um aumento superior a 10% face a 2016 -, revela o relatório de Estatísticas do Turismo, divulgado pelo Instituto Nacional de Estatísticas (INE). Com a vinda dos estrangeiros a disparar, é necessário criar uma relação de equilíbrio entre os turistas e os habitantes locais, de modo a “responder às necessidades” de ambos e evitar a perda de identidade das cidades, afirma o Turismo de Portugal.

Um recente artigo publicado na revista alemã “Der Spiegel” destaca a cidade do Porto, mas não pelas melhores razões: de acordo com a publicação, os turistas estão a destruir os espaços públicos mais visitados na invicta. A “Spiegel” culpa as companhias aéreas low cost por contribuírem para “uma forma de turismo de massa que faz com que os moradores locais se sintam estrangeiros” nas próprias cidades.

Na livraria Lello ou na Torre dos Clérigos, por exemplo, é comum verem-se grandes filas durante todo o dia. A revista alemã também escreve sobre o impacto que a tecnologia tem nas visitas. A maioria das pessoas está preocupada em tirar fotografias, ao invés de explorar os livros que a Lello dispõe ou conhecer a história dos Clérigos. Mas esses são pequenos exemplos dos transtornos que o turismo de massa pode causar. O aumento do lixo nas cidades, do tráfego rodoviário, do preço dos produtos em zonas turísticas ou a destruição de alguns monumentos devido à avalanche de visitas – há casos em que as famosas pontes com cadeados acabam por ceder ao peso -, são também outras consequências deste fenómeno.

De acordo com a revista alemã, os principais afetados por este movimento constante de pessoas são os residentes: os proprietários dos imóveis preferem alugar alojamentos aos turistas por um preço que gera mais lucro, a fazê-lo aos moradores locais “que precisam de um lugar acessível para morar”; os transportes públicos ficam rapidamente cheios; e os nativos podem vir a representar uma minoria nos cafés e restaurantes que frequentam, devido ao número exagerado de turistas.

Contudo, em Portugal a perda de identidade das cidades ainda é longínqua, avança a entidade que regula o turismo em Portugal. Por enquanto, o objetivo passa por “captar mais e melhor turismo”, combinando “o crescimento económico com a preocupação sempre presente pela sustentabilidade ambiental e social do país”, de modo a que a pressão turística não se faça sentir.

O Turismo de Portugal salienta ainda que a grande procura que Portugal tem registado leva a que seja implementada uma estratégia com o objetivo de “uma desconcentração da procura e redução de sobrecarga dos destinos tradicionalmente mais visitados”, de modo a alargar as ofertas “a todo o país”.

Reações políticas Os dados do Turismo de Portugal revelam que na cidade do Porto existem 8477 registos de Alojamento Local (AL) na plataforma online. Devido a um aumento na procura por parte de novos investidores, o Bloco de Esquerda propôs à Câmara do Porto a suspensão de novos pedidos de licenciamento de AL no centro histórico da cidade, a partir de novembro.

Em Lisboa, o PCP investiga se a capital está em “lotação esgotada” e o partido quer impor limites ao turismo. Os vereadores comunistas João Ferreira e Ana Jara defendem “limites na utilização do espaço da cidade por parte da atividade turística”. A Capacidade de Carga Turística em Lisboa é uma das propostas de planeamento e ordenamento da cidade do PCP: a medida passa por fixar um número máximo de pessoas que possam usufruir de um espaço sem comprometer os seus “padrões de qualidade”.

Pressão turísitca na Europa São várias as cidades europeias frequentemente mencionadas pela comunicação social, devido ao número de pessoas que por lá passam todos os anos: tal como Barcelona, onde os movimentos antiturismo são cada vez mais comuns. Segundo as entidades espanholas, em 2016 passaram por Barcelona mais de 30 milhões de turistas.

Em Londres, Inglaterra, uma das medidas aplicadas para controlar o número de turistas que procuram a cidade foi criar um limite de alugueres em plataformas como o Airbnb. Por ano, há uma limitação de 90 dias por cada imóvel. Já em Milão, onde para já as medidas ainda são tímidas, foram proibidos os selfie sticks e as garrafas de plástico em algumas das áreas mais emblemáticas da cidade.

Também em Berlim têm estado a ser pensados caminhos para regular a entrada de estrangeiros. Desde o início do ano passado que as plataformas de aluguer de curta duração deixaram de poder funcionar na cidade.

Em Roma, os problemas com turistas obrigaram a cidade a destacar seguranças para zelarem pelas fontes da cidade. Além do limite de visitantes que podem aceder a alguns locais icónicos, existem multas de 240 euros para quem se atreva a entrar ou a sentar-se naqueles monumentos.