O Estado português convocou Maria Rebelo Pires, uma jovem de 18 anos portadora de uma deficiência única no mundo que provoca um nível de incapacidade de 97%, para o Dia da Defesa Nacional. A mãe da Maria, que tem um blogue exatamente com este nome, usou a sua página para responder a esta convocatória.
Ana Rebelo começa por frisar que o Estado tem conhecimento do nível de incapacidade de Maria “porque o documento que atesta esta incapacidade foi passado por uma entidade Estatal e envolveu nada menos que três ministérios – Saúde, Segurança Social e Finanças”.
“Na convocatória pode ler-se que a falta injustificada resulta na situação Militar Irregular, ficando a Maria sujeita à aplicação de sanções previstas na lei. Não queremos que isso aconteça e a verdade é que a Maria não tem justificação para não comparecer; não está doente (deficiência não é doença), não tem testes ou exames na escola e está no país. Acredito até que ela vá gostar de viver este dia – e nós pais ficaríamos muito felizes se isso acontecesse. A Maria adora andar ao colo e nesta cerimónia não faltarão colos musculados a quem ela pedirá abraços bem fortes, que retribuirá educadamente. Já a continência, não sei se sairá à primeira. Mas não se preocupe, como ela gosta de jogos de repetições e é mestre em mimetização, vai vibrar. Quem sabe no final do dia já comande as tropas e imponha continência ao seu ritmo, sempre ao seu ritmo. Não por desrespeito à autoridade, mas porque a Maria é mesmo assim”, escreve a Mãe da Maria.
No final, Ana Rebelo coloca questões ao Diretor-geral de Recursos da Defesa Nacional: “será que tem por lá “equipa” pronta a enfrentar este desafio? Se calhar estou a ser pessimista, mas prometo-lhe que se tiver recursos capazes, ela lá estará”, escreve a autora do texto, que aproveita para fazer uma lista das condições necessárias para que a sua filha possa participar no Dia da Defesa Nacional:
“- Espaço para colocar a cadeirinha, de preferência num local com boa visibilidade, e alguém para a empurrar;
– Instalações sanitárias com muda fraldas e alguém para as mudar;
– Almoço: qualquer coisa – a Maria é bom garfo -, mas tem de ser passado e ficar em ponto Cerelac, porque ela não mastiga. Ah, não come sozinha.
– Lanches: seringas de alimentação e gente capacitada para dar comida por sonda. O iogurte (sem pedaços) a meio da manhã e da tarde tem de ser dado pela gastroestomia. Não é nenhum luxo, é que a Maria não ingere líquidos pela boca – e se se engasga, aí é que são elas!
– Podem ocorrer algumas aventuras com a prótese ocular – que não vale a pena estar aqui a descrever –, mas convém ter na equipa alguém que domine o manuseamento deste apetrecho”.
“Como vê, tudo coisas simples e a Maria é uma Militar em potência. No entanto, antes de a deixar ao vosso cuidado, compreenda que eu, como mãe galinha, preciso de garantias de que tudo vai correr bem”, conclui.