Um ponto de interrogação chamado Pedro Passos Coelho. É o que o PSD tem desde a noite da hecatombe autárquica – ou, nas palavras do líder, um dos piores resultados da sua história institucional.
Se poucos esperavam um resultado pior do que o de 2013, ainda menos esperavam que Passos Coelho voltasse atrás na sua recandidatura a líder do partido, que foi o que sucedeu na noite eleitoral.
Passos foi de lançar-se na corrida a semana passada (“Quando aparecerem eleições internas, apresentar-me-ei a essas eleições. Não sou de virar a cara”) a recuar dramaticamente depois das autárquicas (“Farei a minha reflexão sobre as condições em que poderei ou não manter-me em disputa interna num mandato que terá eleições legislativas”).
Quer isto dizer que Passos fez marcha-atrás no que tinha delineado depois de falhar os objetivos a que se tinha proposto: mais mandatos autárquicos que o Partido Socialista e um resultado menos mau que o de 2013. Falhou ambos.
E o facto de o congresso do início do próximo ano eleger o líder que enfrentará Costa nas legislativas fê-lo, disse o próprio, reconsiderar. Uma coisa seria ir a eleições legislativas com esperança de disputá-las com o PS; outra, bem diferente, seria esperar tanto tempo por 2019 para lá chegar com a mesma humilhação deste domingo.
“Não deixarei de ponderar devidamente os resultados que foram alcançados na medida em que a estratégia nacional não ficará seguramente imune à avaliação desses resultados”, afirmou na noite eleitoral autárquica. E se, antes, a recandidatura a líder era garantida – as conversas com os líderes distritais já tinham meses –, o resultado autárquico mudou isso ao ponto de fazer Passos reconsiderar. Parar para pensar.
Rui Rio, sabe o i, confrontado com este cenário na liderança de um partido que ambiciona ver seu, foi bastante pressionado por apoiantes e conselheiros a pronunciar-se de imediato. Não o fez. Mas vários senadores não conseguiram evitá-lo: Santana Lopes deixou escapar um “mau demais”; Ferreira Leite vaticinou a ausência “de condições”; Paulo Rangel não desmentiu a evidência de “consequências”.
Rio, por agora, está em silêncio. Mas os telefones, nas hostes laranjas, não param de tocar.
Autárquicas: mancha no currículo de todos
O dilema maior da reconsideração de Passos, além da aceleração de calendário interno e da mudança de ciclo afinal bem avistada por Marcelo Rebelo de Sousa, é também um problema para quem queria avançar, mas não já. Dois mil e dezanove é o número – o ano – que não sai da cabeça de todos os eventuais sucessores. Como chegar lá e o que lá fazer.
Luís Montenegro, ao que o i apurou, não está com substancial vontade de herdar a cadeira neste momento. A derrota autárquica é uma derrota do “passismo” e, inevitavelmente, o ex-líder parlamentar também é um dos rostos do passismo’. Pedro Duarte e José Eduardo Martins, acérrimos críticos do anterior governo (PSD/CDS), sofreram derrotas abaixo dos 20% para a presidência das assembleias municipais de Porto e Lisboa, respetivamente, e o primeiro teria mais ambições que o segundo no curto/médio prazo. A derrota autárquica, nesse sentido, não afetou só Passos e o dito passismo: afetou o partido no seu todo, geração a geração.
Até Rio, o protocandidato mais provável, viu a hecatombe cair–lhe ao colo quando Rui Moreira, reeleito presidente da Câmara do Porto, afirmou a sua vitória como uma derrota do antecessor, que apoiou antes Álvaro Almeida.
Do ponto de vista da estrutura, hoje correm duas leituras. Ou Passos decide que avança mesmo para congresso, independentemente das autárquicas, e põe termo à sua “reflexão” depressa; ou vai arrastando a espera de modo a adiar o avanço de Rio e dar tempo a uma alternativa para alinhar o que há de aparelho passista.
Dentro do quadro da sucessão veem-se também duas opções. Por um lado, alguém com estatuto senatorial e popularidade nacional para segurar o barco, perfilando-se Pedro Santana Lopes como melhor hipótese. “Não deixou de estar próximo das bases, das populações, das terras. A provedoria de uma Santa Casa proporciona isso. Fá-lo com naturalidade”, observa fonte próxima do referido ao i.
Por outro lado, contempla-se a alternativa de uma geração mais jovem – com os olhos também em 2019 – avançar para marcar terreno e sustentar posição no aparelho. Em qualquer das circunstâncias – com regresso senatorial, promoção geracional ou persistência de Passos Coelho –, uma coisa é certa: não se quer entregar o partido de bandeja a Rui Rio.
Ontem, segundo o semanário “Expresso”, o social-democrata reuniu-se com os seus conselheiros mais próximos, Manuela Ferreira Leite, Ângelo Correia, Feliciano Barreiras Duarte e Nuno Morais Sarmento.
A decisão é minha e é bom que o saibam
“Aquilo que resultar da minha decisão dependerá da minha reflexão.” Foi assim que Pedro Passos Coelho se pronunciou sobre a sua recandidatura – ou não recandidatura – à liderança do PSD, ontem, à saída do Palácio de Belém.
A reunião da sua comissão política, que ainda não se dera, e o conselho nacional do partido, que será esta noite, não têm, então, influência direta na introspeção do líder da oposição. Passos foi recebido como líder do PSD pelo Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, assim como os demais homólogos, na “ressaca” dos resultados autárquicos.
Para o ex-primeiro-ministro trata-se de uma “questão prematura” a que envolve o seu futuro à frente do partido, apesar de as eleições para o cargo e o próximo congresso interno estarem aí à porta.
Segundo Passos, as eleições locais e a derrota do Partido Social Democrata nestas não foram sequer tema da audiência com Marcelo Rebelo de Sousa. “Não falámos de eleições autárquicas, trocámos impressões sobre a situação portuguesa e europeia, no essencial dentro da perspetiva do quadro económico-financeiro”, disse Passos, que não muda a preferência pelas temáticas orçamentais, preferindo-as àquilo que desconsidera como “análise política”.