Curvas difíceis


Li nos últimos dias, entre tantos comentaristas (desculpem não me lembrar do autor), um escrito de certa pertinência que indiciava a era da “pós-verdade” como tendo entre nós uma relação simbólica com o desaparecimento físico de Mário Soares, ou seja, que estamos perante uma metafórica coincidência: “pós-verdade/pós-Soares”. Ora, à partida, colocadas as coisas nesses estritos…


Só que, se inserirmos e contextualizarmos a nossa realidade específica em termos globais, geopolíticos, talvez as coisas não sejam bem assim e, perante a emergência dos diversos populismos, talvez fosse prudente e recomendável que se estudasse mais e melhor a sua natureza e relatividade política naquilo que me parece ser, precisamente, o espaço da sua maior fragilidade: a incultura.

Para prevenir e combater eficazmente estas supostas inevitabilidades haverá que fugir, antes de tudo, à subtil iniquidade das teses redutoras tão características da pós–verdade. Estude-se com abertura. Permitam-me a analogia, é bom que saibamos que, nos finais do séc. xix, foi o ferro o material que “armou” e deu a grande plasticidade às revolucionárias construções de betão armado, mas também foi a sua oxidação natural, a sua corrosão a abrir as fendas ameaçadoras que lançaram novos e complexos desafios à conservação de tais estruturas arquitetónicas. Aí, tecnicamente, o problema está a resolver-se bem. E nas democracias, sem ingenuidades, com cultura política e com seriedade intelectual, também a coisa se resolverá. Não há fatalidades. 


Curvas difíceis


Li nos últimos dias, entre tantos comentaristas (desculpem não me lembrar do autor), um escrito de certa pertinência que indiciava a era da “pós-verdade” como tendo entre nós uma relação simbólica com o desaparecimento físico de Mário Soares, ou seja, que estamos perante uma metafórica coincidência: “pós-verdade/pós-Soares”. Ora, à partida, colocadas as coisas nesses estritos…


Só que, se inserirmos e contextualizarmos a nossa realidade específica em termos globais, geopolíticos, talvez as coisas não sejam bem assim e, perante a emergência dos diversos populismos, talvez fosse prudente e recomendável que se estudasse mais e melhor a sua natureza e relatividade política naquilo que me parece ser, precisamente, o espaço da sua maior fragilidade: a incultura.

Para prevenir e combater eficazmente estas supostas inevitabilidades haverá que fugir, antes de tudo, à subtil iniquidade das teses redutoras tão características da pós–verdade. Estude-se com abertura. Permitam-me a analogia, é bom que saibamos que, nos finais do séc. xix, foi o ferro o material que “armou” e deu a grande plasticidade às revolucionárias construções de betão armado, mas também foi a sua oxidação natural, a sua corrosão a abrir as fendas ameaçadoras que lançaram novos e complexos desafios à conservação de tais estruturas arquitetónicas. Aí, tecnicamente, o problema está a resolver-se bem. E nas democracias, sem ingenuidades, com cultura política e com seriedade intelectual, também a coisa se resolverá. Não há fatalidades.