Benfica. Foi um verdadeiro 31 para o 35

Benfica. Foi um verdadeiro 31 para o 35


O Benfica de Rui Vitória só venceu um clássico esta época. Entre bate-bocas com Jorge Jesus, pressões dos adeptos e lesões importantes como a de Luisão, o técnico de 46 anos aguentou-se até ao fim, sempre sereno e confiante na “família benfiquista”. Só que como já não pode jogar, foi graças a outro homem aparentemente…


O Prof de substituição Rui Vitória

Regra geral, ninguém gosta de professores de substituição. Principalmente quando o anterior, mais velho, credenciado, energético e sempre de pastilha na boca deu aos seus alunos ou, vá, adeptos, um bicampeonato que fugia há 31 anos. O professor de Educação Física Rui Vitória foi o substituto do “mestre da tática” Jorge Jesus (JJ) no Benfica. Chegou no seu primeiro dia de aulas para se estrear à frente de um Ferrari – ou equipa grande (já tinha lá passado pelos juniores dois anos), entenda-se –, durante o verão do ano passado, para substituir JJ, que preferiu ir dar aulas de tática para o rival Sporting, que já não sabe nada sobre a matéria de ser campeão há 14 anos.

O prof prometeu zero títulos, deixou uma mensagem de “entrega, trabalho e dedicação” em jeito de low profile, mas o público, os comentadores e os próprios adeptos que olharam para ele – o único título relevante em 14 anos de carreira tinha sido a Taça de Portugal pelo Vitória de Guimarães em 2013 – não prestaram muita atenção. O homem de Alverca, ou “pé de chumbo” como era conhecido quando era jogador da bola, entrou muito mal: perdeu a Supertaça, foi derrotado 3-0 na Luz para a Liga e foi eliminado da Taça de Portugal em Alvalade. Mas como sabia que se “se fosse fácil” não seria para ele nem para a sua equipa, negou que seria “comido de cebolada”, pegou nos jovens – Renato Sanches, Gonçalo Guedes ou Ederson, por exemplo – para o plantel principal, como bem gosta, confiou em Jonas (melhor marcador da liga) e montou um “batalhão familiar” que entrou numa guerra rumo à conquista do tricampeonato.

O técnico ribatejano lá foi conquistando os seus recordes  – 11 triunfos seguidos tal como JJ, o maior número de vitórias (5) de sempre na nova edição da Liga dos Campeões e 88 pontos no campeonato –, sempre tranquilo, algo silencioso, fazendo com que as suas aulas começassem a dar resultados: o “inferno” da Luz que poderia desestabilizar Vitória ficou convencido após a vitória por 1-0 em Alvalade que deu o primeiro lugar ao Benfica, que nunca mais largou. “Na altura havia poucos professores nessa área e convidaram-me para dar aulas [na Escola Gago Coutinho], algo que faço desde os 19 anos”, disse o professor em entrevista ao i em 2011, quando andava pelo Paços de Ferreira. Pois é, o treinador de 46 anos não chegou aqui porque “gostavam dos olhos dele”, mas sim porque tem experiência na arte de guerrear e educar.

E mesmo que tenha vindo em substituição, a turma benfiquista deu-lhe, afinal, positiva. Em troca? Levaram um tricampeonato que não tinham há 39 anos. Triiii, é hora de entrar para festejar, dá licença, prof Rui? “Sim, sim”, dirá. Mas agora espera que prestem mais atenção, caros alunos do futebol. Ou não. Logo se vê no próximo semestre.

Axl Jonas pistolas

Por esta altura, já todos percebemos que o brasileiro de 32 anos não é pistoleiro nenhum, nem o duplo de Harrison Ford num futuro novo filme de “Indiana Jones”. Nem sequer o substituto, estilo Axl Rose nos AC/DC. Mas o avançado precisava de uma nova alcunha, e aqui está ela, até porque, tal como Rose quando chegou à nova banda, Jonas, antes de ter chegado a uma nova aventura, agora em solo português, foi muito criticado.

Na altura em que jogava no Grémio (24 golos na primeira época e 42 na segunda), o site espanhol Mundo Desportivo descreveu-o como o “pior avançado do mundo” em 2009. Ui, ui. Cinco anos depois, e com uma experiência pálida por Espanha no Valência, o “Jonas Pistolas”, como ficou conhecido pelos adeptos benfiquistas, chegou em 2014 à Luz como jogador livre, aos 30 anos. No ano passado, no bicampeonato de Jorge Jesus de águia ao peito, chegou aos 31 golos em todas as competições mas, para a primeira liga, o ex-portista Jackson Martínez, com um pé mais afinado, tirou-lhe o primeiro lugar. Insatisfeito, pegou no samba brasileiro para fintar adversários e converteu-se no matador que o emblema encarnado não via desde 1989/90. Piu, piu, era o som que saía daqueles remates sem defesa.

E mais: andou a correr atrás de Cristiano Ronaldo, Higuaín e Luis Suárez pela Bota de Ouro por essa Europa fora, onde foi somando mais golos que algumas equipas da primeira liga (e continua à frente do União da Madeira, veja-se), para convencer os críticos de que não era preciso mais preocupação no ataque do Benfica – tem também 32 tentos certeiros, mas desta vez só no campeonato, e que foram dando três pontos cruciais. Nem o mercado chinês – a dar ares de Hollywood às estrelas velhas do futebol –, que este ano tem levado inúmeros compatriotas seus, o seduziu. E porquê? Porque estará por Portugal pelo menos até 2018, como diz o seu contrato. “Sinto-me feliz aqui”, disse depois de ter recebido o prémio de melhor futebolista do ano da Liga pelo Clube Nacional de Imprensa Desportiva.

O que falta ainda são os golos contra os rivais Porto, Sporting (e Braga) para o campeonato. É como Axl: mesmo velho e sentado numa cadeira, conquistou o público no Passeio Marítimo de Algés este ano. Só faltou levantar-se.

Ederson

Foi lançado no “jogo do título” em Alvalade. O Benfica precisava de vencer e, mais do que tudo, de não sofrer golos. À última hora, Júlio César ficou fora de jogo com uma lesão. Com 22 anos, mostrou-se tão seguro que não mais saiu da baliza até final da época. Agarrou o lugar com luvas bem seguras, fez 21 jogos sempre a titular. E ainda ganhou uma chamada à seleção do Brasil. Nada mau para quem era suplente de um dos mais consagrados guarda-redes mundiais.

Lindelöf

Quando Luisão se lesionou temeu-se o pior: saía o capitão e a defesa prometia abalar. Jardel (também ele fundamental e com golos cruciais) parecia ter ficado sem companhia. Nada mais enganoso. Com a chamada do sueco de 1,86 m, nada mudou. Acalmou os medos, serenou o jogo lá atrás e deu confiança à equipa na frente. Com o brasileiro, fez uma dupla sem grandes rasgos mas muito comprometimento.

Renato Sanches

Vai ser tão bom, não foi? É assim a trajetória de Renato na Luz. Chegou, tomou conta do meio-campo com aquele corpanzão, meteu dois golos de rajada (um contra a Académica e outro, decisivo, em Guimarães), encheu o campo nos jogos – a roubar e a distribuir as bolas. Esteve quase a manchar tudo com a expulsão na Madeira, mas a equipa defendeu-o e, no dia a seguir, bateu os recordes com a transferência de 35 milhões para o Bayern. Tudo numa época.

Raúl

Mitroglou foi (muito) importante – o golo em Alvalade foi um dos vários fundamentais para este título –, mas Raúl foi cirúrgico. Aqueles golos ao fim contra o Rio Ave e a Académica mantiveram a equipa à tona. O mexicano acaba a época com 11 golos, incluindo os decisivos na Liga dos Campeões, como na eliminatória com o Bayern, que ainda permitiu sonhar. Uma época em cheio para a terceira opção de ataque.