Nelson Cruz tinha mesmo razão, Pedro Pessoa, o seu treinador e presidente da Escola em Almada com o seu nome, é uma pessoa que não tem medo de dizer o que lhe vai na alma. “Para mim, que sou treinador dele há 16 anos, não foi uma grande surpresa ver o Nelson a vencer. A nível competitivo ele não é inferior a nenhum dos seus adversários”. Para quem já tem muitos anos de atletismo, a vitória do fim-de-semana passado no campeonato nacional de corta-mato só peca por tardia: “Ele só não foi campeão há dez anos porque há muita coisa que acontece no atletismo que não devia. Podia ter tido uma vida mais confortável, e não teve”, diz ao i.
O feito que muito alegrou Pedro, Almada e o seu projecto “familiar” do qual o seu atleta é um dos fundadores, concretizou-se também pelo apoio nas bancadas, e pelas ajudas de custo da Câmara Municipal de Almada e da Junta de Freguesia da Sobreda. “Têm sido espectaculares em termos de apoio”, diz o treinador. E a sua Escola, que desde 2013 já conta 70 atletas dos oito aos 60 anos, é também um motivo de orgulho. “Em três anos fizemos o que os clubes em vinte anos nunca fizeram. Todos os anos temos tido campeões”, quer na estrada, quer no corta-mato. E David Ferreira, neste último campeonato nacional, foi um deles, garantindo uma medalha de bronze.
E como é que se faz a gestão deste projeto da margem Sul de Lisboa? A sede fica em casa de Pedro Pessoa onde “se trata da burocracia” juntamente com mais duas pessoas. Depois, aos pais que inscrevem os seus filhos no projeto, é-lhes pedida uma quota anual a rondar os 39 euros. “É simbólico, e os pais ficam sócios, dá para comprar os fatos de treino aos atletas”. A isso juntamos ajuda financeira da junta e da câmara, garantindo as condições mínimas para organizar a participação nas provas nacionais.
Os treinos fazem-se na pista de atletismo da Sobreda, com jovens, muitos deles, que nunca praticaram desporto, mas que “são de grande valia”, garante. E todas as modalidades, do salto em comprimento às barreiras, estão na Escola – que se realizam à segunda-feira e à sexta-feira.
Para este treinador o atletismo português “não tem grandes probabilidades para medalhas” no Rio’16 mas existem, por outro lado, condições para competir, daqui a sete, oito anos, a nível internacional. “Isto vai lá pela persistência, conheço três ou quatro miúdos [como o seu filho, sub-23 do Benfica] que, como as famílias estão ligadas ao desporto, poderão ombrear na Europa”, afirma. Falta claro o apoio financeiro, tanto da Federação como do Estado.
A sua escola precisa agora de mais divulgação, mas se mantiver o espírito familiar que junta atletas jovens e séniores, treinadores, e família, o sucesso de certeza que baterá à porta. “Se isso não existir não é possível. Nós puxamos e aplaudimos, aliás, fizemos isso com o Nelson, os jovens estavam em cada ponto da corrida a incentivar”.
Está dada a receita de quem já tem muitos anos disto.