Relatório. Portugal deve criar um comité para o aleitamento materno

Relatório. Portugal deve criar um comité para o aleitamento materno


Relatório sobre tendências do aleitamento mostra que há áreas em que somos bons alunos e em que os outros países europeus até deviam aprender connosco 


É comum ouvir-se que não nascem bebés em Portugal e que precisamos rapidamente de contrariar estas estatísticas. A taxa bruta de natalidade está, efectivamente, bem longe dos 24,1% que se registavam em 1960 mas, segundo um ranking da organização não governamental Save the Children, somos o 16.o melhor país do mundo para se ser mãe. Quanto ao aleitamento infantil, há indicadores em que os outros países europeus até deviam aprender connosco, mas devia ser criado um comité nacional para coordenar as iniciativas nesta área, alerta o relatório da Iniciativa Mundial sobre Tendências do Aleitamento Materno. 

A criação do comité é a principal recomendação do relatório ontem apresentado, explica ao i Jacqueline de Montaigne, responsável pela iniciativa em Portugal: “O objectivo é apoiar e encorajar as autoridades a agir. Precisamos de controlar a promoção dos leites artificiais e de aumentar a taxa de aleitamento materno nos seis meses.” Aumentar a licença de maternidade poderia ajudar a melhorar esta taxa, mas não corrigiria a situação:“Se as mães têm acesso à informação e são protegidas, podem dar de mamar em exclusivo até aos seis meses, independentemente de estarem ou não a trabalhar”, justifica. O aleitamento materno exclusivo é fundamental para o bebé e é um processo que reduz a mortalidade infantil, sendo reconhecido como tal pela Organização Mundial de Saúde e a UNICEF. 

Em Portugal há muitas iniciativas independentes nesta área da saúde, mas “nada é monitorizado ou gerido”. A existência de um Comité Nacional para o Aleitamento Materno e Alimentação Infantil, com um coordenador nacional e representantes de várias áreas, é necessária de forma a discutir os assuntos mais prementes: “As autoridades não estão a agir fortemente nesta área. Queremos muito que as iniciativas sejam coordenadas e vigiadas”, considera Jacqueline de Montaigne. 

ALTOS E BAIXOS A pontuação de Portugal no relatório da Iniciativa Mundial sobre Tendências do Aleitamento Materno foi até “muito mais positiva do que se esperava” e mostra que esta é uma área em que também somos bons alunos. Como pontos positivos destacam-se os guias de alimentação infantil em casos de VIH e sida como sendo “100% exemplares”.

Na verdade, este é um ponto em que os outros países deveriam pôr os olhos: “Portugal foi dos primeiros países a pertencer a esta iniciativa. Daqui a uns anos, toda a Europa tem de fazer isto e temos de aprender uns com os outros.” A licença de maternidade, actualmente de 120 a 150 dias, podendo ser gozada por ambos os progenitores, é também “muito boa”, tal como a alimentação complementar, onde Portugal soma 100%. 

Nos pontos menos positivos destaca-se a falta de guias de alimentação específica para situações de emergência, como no caso dos refugiados que o nosso país vai receber. Outra crítica vai para a forma como algumas empresas olham para a amamentação: “Em Portugal é protegido por lei que as mulheres saiam mais cedo do trabalho para amamentar, mas não é consagrado que haja um espaço para tirar o leite ou até para terem as crianças lá com elas”, explica Jacqueline de Montaigne, acrescentando que, “se as empresas percebessem que uma mãe que amamenta tem menos possibilidade de faltar para tomar conta de um bebé doente”, a longo prazo poderiam ter benefícios. Mas será um problema de flexibilidade das organizações? “Os empregadores deviam ser mais flexíveis mas, acima de tudo, mais informados”, remata.

Principais recomendações

•  Deverá ser criado um Comité para o Aleitamento Materno em Portugal, com representantes de vários sectores (departamentos governamentais, organizações não governamentais e profissionais de saúde).  
•  Aumentar o número de hospitais acreditados pela Iniciativa Hospitais Amigos do Bebé em Portugal, tanto no sector privado como no público.
•  Devia ser criado um órgão dentro da ASAE que monitorizasse o cumprimento do decreto-lei n.º 217/2008 de 11 de Novembro – fórmulas para lactentes e fórmulas de transição.
•  A formação relevante sobre alimentação de lactentes e crianças pequenas deve ser livre de influências comerciais e de acordo com o Código Internacional de Marketing de Substitutos de Leite Materno e subsequentes resoluções da Assembleia Mundial da Saúde, e uma grande parte da formação podia ser mais centrada no aleitamento materno.
•  Os Cantinhos de Amamentação que ainda existem dentro do Sistema Nacional de Saúde precisam de ser avaliados e documentados.
•  Deverá ser criado um guia independente sobre a alimentação de lactentes e crianças pequenas focado, especialmente, na alimentação de crianças até aos dois anos de idade. Não existem recomendações nesta área.
•  É recomendado que Portugal adopte oficialmente o Guia Operacional para Profissionais de Apoio e Administradores de Programas nas Situações de Emergência – Alimentação de Lactentes e Crianças Pequenas em Situações de Emergência, e o incorpore nos seus planos de emergência existentes.
•  As informações sobre o aleitamento materno na primeira hora de vida e os dados sobre a duração mediana em meses do aleitamento materno dos bebés deveriam ser registadas em todas as unidades de saúde para que se possam obter dados mais realistas.
•  Deverá ser desenvolvida uma campanha que incentive o aleitamento materno em detrimento da utilização do biberão.
•  O aleitamento materno exclusivo até aos seis meses deve ser incentivado pelos profissionais de saúde e, consequentemente, a introdução de alimentação complementar deverá ocorrer apenas depois desse período, de acordo com as recomendações da OMS.