Mais tarde, enquanto tirava o curso de Marketing e Publicidade, começou a aventurar-se pela Europa, em vários Inter Rails que só contribuíram para uma inquietação cada vez mais intensa.
Depois de cinco anos a trabalhar como criativo de publicidade, não resistiu mais ao apelo e partiu. Deu uma volta ao mundo que mudou para sempre a sua concepção de viajar e até a sua maneira de estar. A partir daí, começou a dividir o tempo entre Portugal e viagens várias. Em 2008 realiza o projeto "Até onde vais com 1000 euros?” (juntamente com Carlos Carneiro). O blog da viagem ganhou o Super Blog Awards de 2008 e o livro com a história desta aventura foi publicado em 2009. Na mesma altura, passa a integrar a equipa da Nomad, estreando-se com a viagem à "Indochina".
Recém chegado de uma aventura de scooter pela Índia – que a par da Birmânia elege como os seus destinos favoritos -, Jorge Vassallo responde agora às perguntas do colega e líder Nomad Mateus Brandão.
Diz-se por aí que ser líder Nomad é uma das melhores profissões do mundo. Quão sortudo te definirias?
Ser líder Nomad é sem dúvida nenhuma, uma das melhores profissões do mundo. Mas a palavra “sortudo” pode ter várias leituras – e acho que ninguém “aterra” aqui por acaso. Acima de tudo, faço aquilo que mais gosto – algo de que hoje em dia nem toda a gente se pode gabar. Contudo, como em qualquer conquista, para aqui chegar foi preciso abdicar de alguns confortos, tomar decisões em determinados sentidos, escolher um estilo de vida que é tudo menos convencional. E não me arrependo nada.
Qual a coisa que mais aprecias na humanidade?
A capacidade de se superar, de surpreender, de fazer possível o que se pensava impossível.
E que ‘qualidade pessoal’ tens esperança de sair reforçada com as tuas viagens?
A capacidade de relativizar o Outro; o ambiente à minha volta, as diferenças, os imprevistos, as expectativas.
Qual a tua estação do ano preferida e onde?
Ora aqui está uma pergunta cuja resposta estou a ter dificuldade em encontrar.
Uma vez conheci um marajá na Índia que me disse que tinha o sonho de visitar Portugal na Primavera. E uns amigos japoneses convenceram-me que, quando um dia eu visitar o país deles, devo ir no Outono. Mas perguntas-me pela minha estação preferida, num determinado lugar… não sei responder. Posso dizer-te qual a que não gosto. Não gosto do Inverno, dou-me mal com o frio. Gosto da ideia romântica da neve lá fora e da lareira acesa, e pontualmente pode até saber bem, mas todos sabemos que o Inverno não é isso.
Então, de todos os sítios por onde tens passado, onde não te importarias de viver e porquê?
Curiosamente – por muito mundo que conheça – continuo apaixonado por Sintra, onde cresci. Tenho lá as minhas raízes, é um lugar místico e vejo-me a envelhecer ali. Mas também não me importava de viver em Luang Prabang, no Laos. É uma espécie de Sintra na Ásia; tem qualquer coisa que me faz sentir em casa, uma energia única. Num registo diferente, acho que Istambul também era capaz de me agarrar, ou até Bangkok – porque são cidades com uma identidade muito própria, uma mistura de muitas coisas e ao mesmo tempo genuínas.
Tu que viajas 300 dias por ano, para onde gostas de ir nas férias?
Gosto de ir a casa… E obviamente gosto de ir a sítios onde nunca fui, de ser desafiado e surpreendido. Mas às vezes o que mais apetece é “ficar". Desfazer a mochila e arrumar os livros numa prateleira. Ficar só "de papo para o ar”, a tomar banhos de mar e a ler um livro à sombra de uma palmeira. O clássico.
Tu que és um apaixonado por ela e que recentemente a percorreste de vespa; a que sabe a India?
A Índia sabe a uma mistura intensa de desafios, emoções e insólitos. Tal como a comida – que é feita com muitas especiarias e ervas aromáticas – a Índia em geral é uma grande salgalhada. É picante e doce, é salgada e amarga, tudo ao mesmo tempo, e tudo em doses “puxadas”.
Como sabes a vida está cara. Hoje, como, com quem e onde irias com 500€?
Agora, com 500 euros, levava alguns amigos a jantar fora. [risos]
Quais os últimos 3 livros que leste?
Acabei de ler há dias o “The Architect’s Apprendice”, da Elif Shafak. É a minha autora turca preferida. Gosto muito da maneira como escreve. Este último livro é mais “clássico” mas muito giro também. É sobre um miúdo indiano que no século XVI vai para Istambul com o seu elefante albino – o mesmo que foi oferecido ao Sultão Suleimani.
Antes desse li o “Sleeping on Jupiter”, de Anuradha Roy. Confesso que o comprei por engano. Achava que estava a comprar um livro da Arundhati Roy – a autora do “Deus das Pequenas Coisas” – mas afinal era outra escritora, os nomes é que são parecidos. Curiosamente, gostei imenso da história que quero conhecer mais da obra desta senhora. E soube esta semana que o livro está na “shortlist” para o Booker deste ano…
Antes destes dois li o "Fernão Capelo Gaivota”, de Richard Bach, que foi reeditado com um capítulo inédito.
Neste momento estou a ler o primeiro volume do “1Q84", do Haruki Murakami, e a contar os dias para o lançamento do novo livro de Salman Rushdie, o meu autor favorito.
Estranho que da tua lista não conste “O Principezinho” em suaíli. Podes explicar-nos essa tua paixão pelo livro de Saint-Exupéry e qual o idioma que falta à tua colecção e que mais gostasses de ver na tua estante?
Sempre tive um carinho muito especial pelo “O Principezinho", mas a ideia da colecção só apareceu há uns cinco anos. Na viagem “Até onde vais com 1000 euros?”, com o Carlos Carneiro, ficámos duas semanas em Tarfaya – uma pequena cidade sahauri, entalada entre o Sahara e o Atlântico. Curiosamente, o entreposto marroquino onde Saint-Exupéry passou um tempo considerável e, imagine-se, onde até se encontra um museu dedicado ao autor. Curiosidades. Mas esta e outras experiências tornaram ainda mais intensos os sentimentos que nutria pelo livro. E um dia, sabendo que é uma das obras mais traduzidas do mundo, fiz as contas às voltas que dou todos os anos e pensei que podia ser uma colecção interessante. Neste momento devo ter umas cem edições. Quase todas compradas por mim, sempre nos lugares originais. Não faço encomendas mas aceito ofertas. [risos]
Quanto ao idioma, gostava de ter uma versão em braille. Sei que existe, mas ainda não me cruzei com nenhuma.
Alain de Botton escrevia sobre ‘a arte de viajar’. Partilhas dessa opinião de que viajar pode ser uma arte?
Acho que depende do artista, claro.
Quando tiveres 80 anos, o que contarás aos teus filhos?
Primeiro tenho que ter filhos. E depois tenho que chegar aos oitenta. E se chegar aos oitenta com filhos, já agora gostava de ter netos também. E bisnetos. Dito isto, espero que eles tenham paciência para ouvir a mais recente aventura, porque tenciono continuar a viajar aos oitenta.
{relacionados} Artigo escrito por Mateus Brandão ao abrigo da parceria entre a Agência de Viagens de Aventura Nomad (www.nomad.pt) e o Jornal i.