Falar com as televisões. Foi esta a primeira exigência do homem que, armado com uma caçadeira de canos serrados, sequestrou ontem três pessoas e se barricou no edifício da Comissão de Protecção de Crianças e Jovens (CPCJ) de Lagos, no Algarve. A segunda reivindicação, e a que motivou o sequestro, era falar com os dois filhos (de 14 e 20 anos), com os quais estaria privado de contactar “há mais de um ano”.
“Quando me deixarem falar com os meus filhos, vão todos para casa”, prometia António Duarte à CMTV. Ao fim de nove horas conseguiu e cumpriu a promessa, entregando-se à polícia sem oferecer resistência.
Ao que o i apurou, António Duarte e a mulher teriam tido problemas de alcoolismo, existindo indícios de violência. E os dois adolescentes terão chegado a estar sinalizados. O casal, que esteve emigrado em França, ter-se-á separado há um ano e os menores ficaram a viver com a mãe, em Lisboa, com o apoio da Associação de Apoio à Vítima (APAV). E será essa a justificação para que António Duarte não saiba do paradeiro dos filhos.
Abuso sexual
Mas António Duarte tem uma versão diferente e assegura que as queixas de violência não correspondem à verdade. O homem de 40 anos conta que, o ano passado, soube que a filha tinha sido violada pelo tio (seu irmão), enquanto estava ainda em França. Nessa altura, a mulher estaria em Portugal, mas os dois menores teriam ficado a cargo do tio. Veio a Portugal de propósito para apresentar queixa dos abusos sexuais. Quando chegou, os filhos e a mulher já não estavam contactáveis.
António Duarte garante que fez queixa da suposta violação, primeiro à CPCJ e depois à Polícia Judiciária, onde ainda anteontem foi pedir acompanhamento psiquiátrico e psicológico, dada a sua situação de desespero e ansiedade por não saber dos filhos. E a culpa de estes estarem “escondidos” é, acusa, dos funcionários da CCPJ de Lagos, que actuaram no caso. “As outras pessoas que estavam aqui (não os reféns) é que arranjaram esta bronca”, queixou-se.
Já tinha começado o período de negociações com a Unidade Especial de Polícia quando o i chegou à fala com uma dos três reféns. A funcionária da CPCJ garantia então que estava tudo bem e que a situação estaria controlada, sem no entanto adiantar mais informações, uma vez que o sequestrador só estava disponível para falar com as televisões, como veio a acontecer ainda durante a tarde.
No local estiveram cerca de 100 elementos da PSP – incluindo o Grupo de Operações Especiais –, que delimitaram um perímetro de segurança. As instalações da CPCJ de Lagos situam-se numa zona habitacional, perto da Escola Júlio Dantas, que não sofreu qualquer perturbação no funcionamento das aulas.
Os negociadores da polícia atenderam o pedido do barricado e puseram-no em contacto com os filhos. Tal como prometera, António Duarte deixou sair os três reféns: uma funcionária da CPCJ e dois homens, um professor e um militar da GNR que estavam no local na hora do sequestro. Depois de ter sido dado alarme, às 9h15 da manhã, dois agentes dirigiram-se de imediato ao local. Houve um disparo e o agente que ia à frente foi atingido de raspão na face, mas sem gravidade.