O que é que um banqueiro percebe de gin? Perguntem a Anshuman Vohra

O que é que um banqueiro percebe de gin? Perguntem a Anshuman Vohra


Investiu 5 mil dólares no Banco Espírito Santo três meses antes do colapso. Perdeu tudo. 


Mesmo assim a frustração não foi tão grande como o empate do Real Madrid a 13 de Maio: “Oh, adoro o Ronaldo!”.

A conversa foi-se desenrolando à volta de um gin. O dele com uma boa água tónica, muito gelo, um pouco de lima – só casca – e algumas sementes de coentro. O meu com limão e framboesas, preparado para surpreender. Quero saber como se passa da banca de investimentos para a produção de gin. “Não sei o que sabe sobre banqueiros”, começa por dizer, mas interrompo-o com uma provocação: “Temos Ricardo Salgado, penso que os portugueses sabem tudo o que há para saber sobre banqueiros.” Sorri. “É verdade, tinha-me esquecido disso. De facto, os banqueiros sabem alguma coisa sobre finanças e muito sobre bebida. Por isso, como pode adivinhar, para mim foi fácil.”

Anshuman Vohra, filho de diplomata agora reformado, mudou-se para Nova Iorque, nos Estados Unidos, há 15 anos, na esperança de vir a ser um homem da Times Square. Esteve três anos no departamento de fusões e aquisições do JP Morgan e depois em pequenos bancos antes de se lançar no seu próprio negócio, a Bulldog, uma marca de gin premium. “Trabalhei com companhias fantásticas, tive oportunidade de ver empresários em acção, e essa foi a melhor parte, aprender com pessoas que tinham uma visão, uma paixão, e conseguiram tornar o seu produto realidade, do conceito à estratégia comercial.” Ficou quase obcecado com ideia de ter a sua própria empresa, era o sonho americano. 

“À sexta-feira eu e os meus colegas íamos beber uns copos. Todos pediam vodka com isto, vodka com aquilo, e um dia perguntei ao empregado porque é que era eu o único a beber gin. Mostrou-me o bar e tinha 22 marcas de vodka e duas marcas de gin.” Garante que foi a única vez que voltou entusiasmado para o escritório da parte da tarde. “Googlei e descobri que até há 40 anos o gin se vendia mais que a vodka. Foi assim até James Bond ter feito algo que viria a mudar a história da humanidade, ao substituir um gin por uma vodka.” Num instante o mercado encheu-se de marcas como a Absolut e mudou a forma como as pessoas encaravam a bebida, a percepção dos sabores, a imagem. O gin, entretanto, tinha-se deixado envelhecer, com uma imagem antiquada e chata.

Decidiu pedir uma série de amostras a destilarias e um dia recebeu 12 garrafas no escritório. “Experimentei-as todas e não sei o que aconteceu depois. Lembro-me de acordar no meu apartamento, na manhã seguinte, e pensar: tenho de entrar nesta indústria.” Em Junho de 2006 deixou o emprego.

Habituado a viajar pelo mundo, viveu em países tão diferentes como a Índia, o Vietname, os EUA ou a Nigéria e treinou o palato para sabores exóticos e botânicos, que quis incorporar no seu gin. Uma receita única que congeminou com a destilaria com que agora trabalha.

Actualmente a Bulldog está em 70 países – começou em Nova Iorque em 2007 e na Europa dois anos depois. Chegou a Portugal em 2011 e este é já o quarto maior mercado da marca. Vende, ao todo, 1,5 milhões de garrafas e facturou 11 milhões no ano passado, prejudicado pela queda do euro, já que 70% das vendas são no mercado europeu.

Aos 36 anos, o CEO tem planos para continuar a fazer a marca crescer. Não será, pelo menos para já, a vender na China, “um  país de whisky”. A próxima fronteira será a América do Sul: “Se eu conseguir pôr os brasileiros a beber Bulldog como os portugueses, posso reformar-me”, garante.

Anshuman gosta de Portugal, e não só daquele cantinho, o Gin 66 Bar, ao lado da estação do Rossio, na Baixa de Lisboa, onde bebemos o nosso copo, acompanhado por uma entrada de queijo e presunto pata negra da Manteigaria Silva: “Este queijo é espectacular. É português? Li o rótulo, é de Azeitão. Posso levar para Nova Iorque? Os tipos no escritório vão adorar isto.”

Mas nem todas as recordações relacionadas com Portugal, onde já esteve uma dezena de vezes, são igualmente felizes. Entre um gole do seu gin e um pedaço de pão com queijo, conta que também fez maus investimentos. “Comprei acções do Banco Espírito Santo três meses antes do colapso. Perdi todos os dólares que investi, perto de 5 mil.” A quantia não foi suficiente para o pôr a rezar a Nossa Senhora de Fátima, até porque no dia 13 de Maio, véspera da nossa conversa, ainda não tinha chegado a Portugal. “E precisava de um milagre, estive a assistir ao jogo do Real Madrid [empatou com a Juventus e foi eliminado], que perdeu. Sempre que vou assistir a um jogo eles perdem. Oh, adoro o Ronaldo!” – jogador que não conhece mas “gostaria de conhecer um dia. “Vi qualquer coisa sobre ele ter doado uma quantia enorme por causa do tremor de terra no Nepal, 60 milhões. Fiquei muito sensibilizado. Talvez um dia, daqui a muito tempo”, a Bulldog venha a patrocinar o clube espanhol.