Dia Internacional dos Museus: instruções para uso imediato


Ex.ma SenhoraArlete Soeiro3.a subsecretária da secretária-adjuntaPrograma de Auxílio aos Povos Indolentes e FalidosGabinete do secretário-geral Ban Ky-moonSede da ONU-NY-EUA Dr.ª Arlete Soeiro, Já transmiti ao Dr. Ban Ky indicações sobre como assegurar um estrondoso impacte da celebração do Dia Internacional dos Museus em Portugal (cruzei–me com ele numa datcha russa na Crimeia quando esta ainda…


Ex.ma Senhora
Arlete Soeiro
3.a subsecretária da secretária-adjunta
Programa de Auxílio aos Povos Indolentes e Falidos
Gabinete do secretário-geral Ban Ky-moon
Sede da ONU-NY-EUA

Dr.ª Arlete Soeiro,

Já transmiti ao Dr. Ban Ky indicações sobre como assegurar um estrondoso impacte da celebração do Dia Internacional dos Museus em Portugal (cruzei–me com ele numa datcha russa na Crimeia quando esta ainda era ucraniana – não a datcha, que essa já era russa, mas sim a Crimeia!). Repito, à atenção da secretária-adjunta, o essencial da coisa, abstendo-me de me alongar em considerandos e explicações.

Trata-se, em suma, de garantir que no domingo 18 de Maio todos os museus estão fechados, assegurando acesso gratuito a todos os estádios de futebol, onde decorrerão grandes jogos sob o lema: “Abaixo as salas escuras, viva a bola em pleno dia!” No Porto recomenda-se a profusa afixação de cartaz com Pinto da Costa, capa negra, ar furioso e de copo na mão, legendado: “Não fui eu que pedi um Dragon’s Museum, foi Lisboa que decidiu!” Na catedral da Luz, antecedendo o histórico dérbi SLB-Charneca do Lumiar Futebol Clube, Passos Coelho fará uma curta alocução subordinada ao tema “hoje é o primeiro dia sem troika, mas é sobretudo o dia sem museus – comigo o Estado deixará de importunar os cidadãos oferecendo-lhes aquilo que não querem!” Em fundo ouvir-se-á a voz de Miguel Relvas entoando em surdina: “Cultura para que te quero/na terra da emigração/o euro é quem mais ordena/dentro de ti, ó meu bolsinho!”

Estas iniciativas marcarão de forma indelével o Dia dos Museus, tornando Portugal notícia em todo o mundo – que é como se sabe aquilo que todos queremos: eu, a troika, os portugueses, o governo e talvez mesmo o fantasma de Eusébio. E serão, sem margem para dúvidas, celebrações coroadas de êxito. Como é sabido, os portugueses detestam os museus. Gostam mais de futebol e de fado. A Fátima já não vão porque ganharam a mania de andar de pé, perdendo o bom costume de se deslocar rastejando de joelhos. Os portugueses não gostam de museus e o Dr. Barreto Xavier tem vindo a satisfazer-lhe o gosto. Ou, mais acertadamente, a exacerbar-lhes o desgosto. Reduz orçamentos, cancela exposições, manda devolver o papel higiénico, despede funcionários, abrevia subsídios, corta a água corrente e o ar condicionado e vende o património ao desbarato. Clímax absoluto desta sagaz política é fechar todos os museus no dia 18 de Maio, afixando nos portões em letras gordas: “É domingo, vão à missa e dediquem-se à família, ou aproveitem para emigrar que os voos são mais baratos ao fim-de-semana!”

Barreto Xavier é a encarnação do “não há dinheiro!”, acompanhado, caso o cidadão insista, invocando direitos, respeito por contratos, ou outras ninharias supérfluas, por um esgar: “Vá-se daqui embora que no Estado não há nada para si!” – acentuado por deitar fora a língua e, quando tal se revele necessário, pelo chamar da polícia.
Ele é o máximo executor desta política, o zénite da arte, o incomparável Zeus da gestão: não gasta um cêntimo, exporta obras de arte e mantém o povo feliz. É o 3 em 1. Todos ganham: reduz o défice orçamental, aumenta o superavit comercial e faz o povo feliz. Yupyyy!

Felizmente, Barreto Xavier não é valor desperdiçado. Tem lugar de relevo assegurado no Goldman Sachs após este ter bancado o convite feito pelo FMI para o cargo de “superior adviser” do programa CIPSGUP – Como Iludir Papalvos sem Gastar Um Penny.
Ainda há justiça no mundo!

Inclino-me e retiro-me,
Ricardo Barata de Leão
ricardobarataleao@gmail.com