Os três lados da mesma história
São só três partidas de verso-refrão-verso mas tocam em repeat e não se perde nada se se jogar ao dia da marmota no meio deste processo. Um trio de canções que aguenta estar sozinho no mundo. “Sábado à Tarde”, “1991” e “Che Guevara Eunuco” nasceram porque sim, daí que serem reveladas sem mais companhia acontece pela mesma razão: porque toda a gente merece estar no meio deste triângulo amoroso, de garagem com garagem e mais uma garagem pelo caminho. Anos 90 à séria, com a Feira da Ladra e o “Ruptura Explosiva” no meio das memórias, com guitarras de flanela e cabelos desgrenhados; mas actual como o raio no nervo daquilo que se canta, nas letras de café, imediatas mas longe de perdidas, nada surge por acaso. “Aquelas Três” é um EP e um exemplo de economia criativa. A canção é um ser que reclama por atenção e não precisa de um disco de corpo adulto para se fazer notar. (download a preço escolhido pelo ouvinte em feromona.bandcamp.com). Por Tiago Pereira
Cinco segundos de janelas abertas a alta velocidade ao cair da noite
Parti para “Confess” com uma vantagem – não conheço o primeiro e aclamado álbum de Twin Shadow, “Forget”, o que oferece a possibilidade de evitar a angústia de um segundo encontro falhado depois de um primeiro promissor. “Confess” foi, em média, um primeiro encontro agradável, um copo a dois num bar povoado num início de noite quente por figurantes bem vestidos a folhearem a “Wallpaper”. É pop electrónica elegante, com o problema – comum a alguma pop electrónica elegante – de não deixar um final de boca prolongado. George Lewis Jr., aka Twin Shadow, explica que o álbum foi inspirado por viagens de mota em Los Angeles depois de uma recuperação longa de um acidente. “Five Seconds”, o single e ponto alto do álbum, vem mesmo daí. É música de corações ao alto, janelas abertas e alta velocidade, num cenário com a luz de um filme de Michael Mann. “You Call Me On” e “The One” não deixam cair a bola. O resto rende uma vaga melancolia sintética, mas não marca. Por Bruno Faria Lopes
O peso da crew, das rimas, dos skates e tudo mais
Vindo das conspirações colectivas de crew que passa as tardes dividida entre rimas e skates, e no geral a provocar distúrbios pela populaça que vai passando – leia-se, a Raider Klan Mafia. Já ouvimos isto umas quantas vezes nos últimos tempos. A parte interessante é que rappers e produtores como Spaceghostpurrp, de 21 anos e vindo de Miami, vão encontrando momentos de profunda penumbra introspectiva no meio desta vida social toda. É hip-hop denso que não teme a incursão pelo que é estranho e, aqui e ali, mesmo pelo esquizofrénico assolado pelas questões complexas do ego inflamado, do dinheiro e das gentes da noite. Curioso que este “Mysterious Phonk” venha com o selo da 4AD, editora que se confunde com o indie-rock, bem menos efusivo nisto do “somos nós contra eles”. Fica mais uma amostra que o hip-hop está aí para inventar e já se dissimulou confortavelmente no seio da música alternativa que acolhe toda a gente. Sem grandes sorrisos, mas tudo bem. PorRicardo Lima Esteves