Votar aos 16… mais do que justo!


A minha cadela não vota, porque os canídeos não têm direito a decidirem quem nos vai governar. Todavia, exatamente por estar fora destas questões, a sua opinião é abalizada, neutra e extremamente lógica e racional. Nas horas em que está (parece estar) a dormir na sua caminha, a minha cadela reflete e ajuíza. E conta-me “coisas”…


“É assim porque sim!” não é resposta que se dê a uma questão de cidadania como aquela que a Carolina fez, pondo em causa o direito de voto só a partir dos 18 anos. “Mas, vá, digam porque é que eu não posso votar?” – insistiu ela, desagradada com a “não-resposta” dos progenitores. Os pais da Carolina entreolharam-se antes de um deles responder: “Ora, porque não tens 18 anos!”. “Isso sei eu”, exclamou ela, “mas porque é que, tendo 16 anos, não posso votar, se posso casar, se já vou presa, se me obrigam a escolher uma área profissional, se…”. Antes que a filha desfiasse mais umas quantas obrigações, respondeu, imperativo: “Porque o voto é só aos 18 anos!”, já enfadado da questão e considerando que a filha devia ser burra. “Mas porque é que é só aos 18 anos?”. Aí o progenitor, francamente irritado pela insistência numa coisa tão óbvia, gritou: “Olha, se não estás contente vai perguntar ao Marcelo ou ao Costa!”. Assim deu por terminado o episódio.

Ontem, num dos passeios que dei com a minha cadela, refletimos sobre esta questão, cujo debate já tem uma longa história, de décadas – pelo menos nos países nórdicos e muito particularmente nos encontros de pediatria e de saúde infantil e juvenil -, e concluímos que a pergunta da Carolina era mais do que pertinente. Aliás, por não haver agora eleições, eu e a minha cadela considerámos ser o momento ideal para discutir o assunto.

Será correto que a população juvenil não tenha direito a voto, ou seja, não possa interferir na escolha dos vários governantes que, afinal, tomarão decisões que são determinantes para o seu presente e futuro? Será este preceito constitucional verdadeiramente democrático? Se não, quais as alternativas possíveis? Serão elas melhores e exequíveis? Ainda agora, quando do Brexit, foi muito glosada a questão etária, e de os “velhos” terem votado para sair, prejudicando assim a vontade dos “novos” que era ficar. Houve até quem arranjasse uns algoritmos para ponderar os votos conforme o grupo etário (devo dizer que considerei a defesa dessa tese de uma tremenda desonestidade intelectual, porque os votos valem o mesmo, e se assim não fosse e fizéssemos, por exemplo, uma distribuição dos partidos políticos portugueses por grupo etário, muita coisa haveria também a dizer).

A idade de votar é um assunto tremendamente importante e o debate não é de hoje – relembro, como exemplo, o número um do “Expresso”, em 1973, que escolheu para a primeira página uma discussão sobre a idade mínima para exercer esse direito, na altura ainda legalmente fixada nos 21 anos. 

A eleição dos cidadãos que nos representam nos diversos níveis políticos – autarquias, Assembleia da República, Parlamento Europeu, Presidência da República – tem como base a escolha de quem julgamos ir defender melhor os nossos direitos, proporcionar-nos um melhor presente e criar melhores bases para um futuro agradável e feliz. No fundo e em resumo, quem estará mais bem colocado para nos apoiar na luta por uma melhor qualidade de vida, que é afinal o que ambicionamos. Por outro lado, exige-se das crianças e dos adolescentes um grande empenhamento nessa mesma luta – cada vez mais se atribuem responsabilidades, se exigem atitudes e se recomendam comportamentos aos cidadãos destes grupos etários que ultrapassam, em seriedade, rigor e importância presente e futura o mero exercício do direito de voto, afinal renovável e corrigível periodicamente. 

Aos mesmos adolescentes se reconhece (se obriga!), aos 16 anos, a capacidade de escolha profissional, que tipo de curso a prosseguir, a partir desta idade, o direito a constituir família, a responsabilidade criminal pelos seus atos e tantas coisas mais. Acresce que o grupo etário das crianças e dos adolescentes é em Portugal, paralelamente talvez com o dos idosos, o mais desprotegido em termos sociais e económicos.

Diga-se ainda que o ministério que tem uma das maiores fatias do Orçamento é o da Educação e que esta se dirige quase exclusivamente à população infantil e juvenil que, afinal, não tem quaisquer direitos de, direta ou indiretamente, se expressar sobre quem está melhor colocado para gerir de forma eficiente esse dinheiro todo.

É necessário abrir o debate sobre a redução da idade de voto para, por exemplo, os 16 anos, idade em que quase todos os adolescentes são já capazes de tomar decisões informadas sobre o seu futuro, pelo menos mais do que em muitos dos outros grupos etários. Além de que, se se deseja a participação dos jovens como cidadãos, não há motivo para lhes negar um dos direitos que melhor expressam essa participação. Mais cedo ou mais tarde o problema do (não) direito de voto dos “menores de 18” constará da “agenda do dia” – convém irmos pensando no assunto, como muito bem pensou a Carolina e como a minha cadela e eu. 

 

P.S. – Quantos adultos votam sem sequer saber o que os partidos defendem ou se é ou não do seu interesse? Quantos votam por indicações dos caciques, seja da aldeia ou da família? Quantos votam porque a família lhes indica o símbolo? Quantas pessoas votam pelo good looking dos candidatos, ou pelas mentiras que propagam? Não deveríamos pensar que os jovens, pelo menos a partir dos 16, têm mais do que idade para votar? A minha cadela crê que sim… e este ano, tendo feito 18 anos reais (mais de 90 anos humanos), a sua lucidez ultrapassa a de muitos decisores, talvez porque tenha apenas em vista o interesse dos humanos.


Votar aos 16… mais do que justo!


A minha cadela não vota, porque os canídeos não têm direito a decidirem quem nos vai governar. Todavia, exatamente por estar fora destas questões, a sua opinião é abalizada, neutra e extremamente lógica e racional. Nas horas em que está (parece estar) a dormir na sua caminha, a minha cadela reflete e ajuíza. E conta-me “coisas”…


“É assim porque sim!” não é resposta que se dê a uma questão de cidadania como aquela que a Carolina fez, pondo em causa o direito de voto só a partir dos 18 anos. “Mas, vá, digam porque é que eu não posso votar?” – insistiu ela, desagradada com a “não-resposta” dos progenitores. Os pais da Carolina entreolharam-se antes de um deles responder: “Ora, porque não tens 18 anos!”. “Isso sei eu”, exclamou ela, “mas porque é que, tendo 16 anos, não posso votar, se posso casar, se já vou presa, se me obrigam a escolher uma área profissional, se…”. Antes que a filha desfiasse mais umas quantas obrigações, respondeu, imperativo: “Porque o voto é só aos 18 anos!”, já enfadado da questão e considerando que a filha devia ser burra. “Mas porque é que é só aos 18 anos?”. Aí o progenitor, francamente irritado pela insistência numa coisa tão óbvia, gritou: “Olha, se não estás contente vai perguntar ao Marcelo ou ao Costa!”. Assim deu por terminado o episódio.

Ontem, num dos passeios que dei com a minha cadela, refletimos sobre esta questão, cujo debate já tem uma longa história, de décadas – pelo menos nos países nórdicos e muito particularmente nos encontros de pediatria e de saúde infantil e juvenil -, e concluímos que a pergunta da Carolina era mais do que pertinente. Aliás, por não haver agora eleições, eu e a minha cadela considerámos ser o momento ideal para discutir o assunto.

Será correto que a população juvenil não tenha direito a voto, ou seja, não possa interferir na escolha dos vários governantes que, afinal, tomarão decisões que são determinantes para o seu presente e futuro? Será este preceito constitucional verdadeiramente democrático? Se não, quais as alternativas possíveis? Serão elas melhores e exequíveis? Ainda agora, quando do Brexit, foi muito glosada a questão etária, e de os “velhos” terem votado para sair, prejudicando assim a vontade dos “novos” que era ficar. Houve até quem arranjasse uns algoritmos para ponderar os votos conforme o grupo etário (devo dizer que considerei a defesa dessa tese de uma tremenda desonestidade intelectual, porque os votos valem o mesmo, e se assim não fosse e fizéssemos, por exemplo, uma distribuição dos partidos políticos portugueses por grupo etário, muita coisa haveria também a dizer).

A idade de votar é um assunto tremendamente importante e o debate não é de hoje – relembro, como exemplo, o número um do “Expresso”, em 1973, que escolheu para a primeira página uma discussão sobre a idade mínima para exercer esse direito, na altura ainda legalmente fixada nos 21 anos. 

A eleição dos cidadãos que nos representam nos diversos níveis políticos – autarquias, Assembleia da República, Parlamento Europeu, Presidência da República – tem como base a escolha de quem julgamos ir defender melhor os nossos direitos, proporcionar-nos um melhor presente e criar melhores bases para um futuro agradável e feliz. No fundo e em resumo, quem estará mais bem colocado para nos apoiar na luta por uma melhor qualidade de vida, que é afinal o que ambicionamos. Por outro lado, exige-se das crianças e dos adolescentes um grande empenhamento nessa mesma luta – cada vez mais se atribuem responsabilidades, se exigem atitudes e se recomendam comportamentos aos cidadãos destes grupos etários que ultrapassam, em seriedade, rigor e importância presente e futura o mero exercício do direito de voto, afinal renovável e corrigível periodicamente. 

Aos mesmos adolescentes se reconhece (se obriga!), aos 16 anos, a capacidade de escolha profissional, que tipo de curso a prosseguir, a partir desta idade, o direito a constituir família, a responsabilidade criminal pelos seus atos e tantas coisas mais. Acresce que o grupo etário das crianças e dos adolescentes é em Portugal, paralelamente talvez com o dos idosos, o mais desprotegido em termos sociais e económicos.

Diga-se ainda que o ministério que tem uma das maiores fatias do Orçamento é o da Educação e que esta se dirige quase exclusivamente à população infantil e juvenil que, afinal, não tem quaisquer direitos de, direta ou indiretamente, se expressar sobre quem está melhor colocado para gerir de forma eficiente esse dinheiro todo.

É necessário abrir o debate sobre a redução da idade de voto para, por exemplo, os 16 anos, idade em que quase todos os adolescentes são já capazes de tomar decisões informadas sobre o seu futuro, pelo menos mais do que em muitos dos outros grupos etários. Além de que, se se deseja a participação dos jovens como cidadãos, não há motivo para lhes negar um dos direitos que melhor expressam essa participação. Mais cedo ou mais tarde o problema do (não) direito de voto dos “menores de 18” constará da “agenda do dia” – convém irmos pensando no assunto, como muito bem pensou a Carolina e como a minha cadela e eu. 

 

P.S. – Quantos adultos votam sem sequer saber o que os partidos defendem ou se é ou não do seu interesse? Quantos votam por indicações dos caciques, seja da aldeia ou da família? Quantos votam porque a família lhes indica o símbolo? Quantas pessoas votam pelo good looking dos candidatos, ou pelas mentiras que propagam? Não deveríamos pensar que os jovens, pelo menos a partir dos 16, têm mais do que idade para votar? A minha cadela crê que sim… e este ano, tendo feito 18 anos reais (mais de 90 anos humanos), a sua lucidez ultrapassa a de muitos decisores, talvez porque tenha apenas em vista o interesse dos humanos.