Arte Urbana. Abril, murais mil


Tamara Alves aprendeu a controlar uma grua para pintar “25 de Abril Hoje”, o maior e mais simbólico mural que fez até hoje e que deverá estar pronto no domingo.Numa das fachadas do Fórum Lisboa, na Avenida de Roma, as figuras que começam a surgir na enorme parede com fundo cor-de-rosa intrigam os moradores que…


Tamara Alves aprendeu a controlar uma grua para pintar “25 de Abril Hoje”, o maior e mais simbólico mural que fez até hoje e que deverá estar pronto no domingo.
Numa das fachadas do Fórum Lisboa, na Avenida de Roma, as figuras que começam a surgir na enorme parede com fundo cor-de-rosa intrigam os moradores que ali passeiam os cães e que agora têm uma nova paisagem. São figuras “numa dança que mantém o conceito de luta, de trabalho de equipa”, explica a artista de 30 anos que conquistou por unanimidade o júri do concurso público presidido por Júlio Pomar, a propósito das comemorações dos 40 anos do 25 de Abril.

Noutra zona da cidade, na Calçada da Glória, o movimento de turistas de eléctrico para baixo e para cima não pára. “A vida só tem um sentido”, lê-se em letras brancas nos carris, uma frase assinada pelo artista Mais Menos. Num dos murais da exposição “Venham mais sete!”, inaugurada na Calçada da Glória pela Galeria de Arte Urbana (GAU) no início da semana, Mais Menos deixou outra frase irónica com letras douradas: Moral de Abril, escreveu sobre um fundo preto. A técnica é de “ouro sobre luto”, escreve o próprio no Facebook.

O artista foi um dos sete convidados pela GAU a reinterpretar “o património muralista produzido aquando do PREC, com a sua visão dessa herança iconográfica”. A exposição, inaugurada mesmo a tempo das comemorações, não deixa ninguém indiferente, principalmente os turistas.

“Há muitos franceses que param e que dizem que o meu mural tem muitas parecenças com o quadro de Delacroix”, conta Carlos Farinha, de 43 anos. O português é filho de imigrantes e viveu tantos anos em França que não consegue esconder o sotaque francês. Também não consegue esconder que se inspirou no famoso quadro do francês Eugène Delacroix, “A Liberdade Guiando O Povo”, para o seu mural, o primeiro da Calçada da Glória.

“Optei pelo Salgueiro Maia com a bandeira de Portugal em vez da Marianne, porque é um herói nacional”, explica. “Ele está sobre uns restos aqui em baixo, que talvez não sejam muito perceptíveis, mas são submarinos, a Torre de Belém, o Camões, vários objectos… No fundo o que quis representar é que está tudo à venda, até os valores e os valores de Abril, a liberdade, têm de ser respeitados.”
Noutro dos murais, Nomen, nascido precisamente em 1974, pintou uma “Última Ceia” com José Sócrates, Paulo Portas, Isaltino Morais, Passos Coelho, Cavaco Silva, Valentim Loureiro e outros que tais na mesma mesa a trincharem Portugal. Hugo Makarov, Miguel Noronha, Telmo Alcobia e Tinta Crua compõem o resto dos artistas escolhidos para a exposição.

Telmo Alcobia diz ter pintado em sete dias o que na altura do 25 de Abril sete pessoas pintavam num dia. “Havia o que desenhava o cartaz, o que tinha mais jeito para as letras, o que fazia os pormenores… Era um esforço colectivo, quase em linha de montagem, para optimizar os conhecimentos de cada um”, conta.

Com 34 anos, ainda não era nascido na altura do 25 de Abril mas sempre cresceu num ambiente político. Aliás, o seu trabalho costuma reflectir isso e para a exposição foi só uma questão de adaptar a sua linguagem aos “cartazes do PREC”. “Em vez de usar um mote específico de um partido, decidi usar o 25 de Abril sempre, no sentido em que não é só de 40 em 40 anos que nos devemos lembrar do que é que havia antes e do que se alterou.”