A primeira semana do novo Governo foi inteiramente fechada nos gabinetes. O registo do silêncio para os primeiros passos do novo Governo foi uma regra cumprida à risca, de tal forma que a própria comunicação social desistiu de ir avançando nomes, como é tradicional sempre que há governos em formação.
A lista de secretários de Estado foi esta quinta-feira entregue ao Presidente da República e tal como tinha acontecido com a lista de ministros, Marcelo foi o primeiro a conhecer os nomes dos novos membros do Governo. É certo que o silêncio não corresponde só a uma estratégia do Governo, mas também à dificuldade que está a enfrentar para encontrar nomes adequados que aceitem integrar o Governo e os gabinetes. A incerteza quanto à durabilidade do Executivo de Montenegro, tem afastado alguns nomes, o que duplica o esforço para encontrar as pessoas certas. Para além das escolhas, o calendário de Montenegro para começar a apresentar serviço é apertado e, ainda sem as equipas completas, não se pode descurar a primeira tarefa governativa que é a entrega do programa de Governo na Assembleia da República, no dia 10 de abril, já na próxima quarta-feira. Esse é um trabalho que está já a ser feito no núcleo duro do Governo, com adaptações das linhas gerais do programa eleitoral da AD.
Corrupção uma tentativa de voltar ao diálogo com o Chega
A ação governativa não pode esperar pelo processo de formação dos gabinetes e tem de ser colocada no terreno rapidamente.
No dia 2 de junho é preciso ter um plano de emergência para a Saúde com medidas concretas.
Nos próximos 100 dias a nova ministra da Justiça já tem de ter reunido com forças políticas e entidades da sociedade civil, para reunir ideias para um pacote contra a corrupção. Uma medida nova anunciada pelo próprio Luís Montenegro no discurso da tomada de posse, numa iniciativa que foi lida como uma forma de criar consensos em torno de um problema que até aqui tem sido um exclusivo do discurso de André Ventura. Depois do tropeção no processo de eleição de Aguiar Branco, a negociação deste pacote é vista como uma oportunidade de a AD recomeçar um caminho negocial com o Chega. No Governo e nas respetivas bancadas eleitorais há a expectativa de que os partidos à esquerda não queiram entrar no processo e que o resultado prático deste trabalho seja um entendimento com André Ventura, adotando algumas medidas do Chega, numa matéria que lhe é cara. Normalizar a relação parlamentar com o Chega é o grande objetivo desta iniciativa.
Outro tema que está já em cima da mesa de Montenegro e de Joaquim Miranda Sarmento é a decisão sobre se e quando haverá um orçamento retificativo. No discurso da tomada de posse, o novo primeiro-ministro fez questão de frisar que a tese dos cofres cheios é «perigosa». Às várias medidas de aumento de despesa ou diminuição de receita, Montenegro preferiu chamar, «medidas de política económica e justiça social», indicando que não conta com o excedente orçamental para as colocar em prática. A decisão sobre o orçamento retificativo é uma das que estão mais bem guardadas, até porque o Governo já percebeu que este vai ser um tema de combate político, com os líderes do PS e do Chega a anteciparem-se na disponibilidade para aprovarem o documento e exigindo mesmo que as medidas mais simpáticas para o eleitorado constem no diploma a levar à Assembleia da República. Esta é a razão pela qual a oportunidade de apresentar o retificativo está a ser muito bem avaliada politicamente. Se por um lado não é razoável que o Governo da AD comece a governar com um orçamento que não é o seu e contra o qual votou, por outro, antecipar a discussão orçamental pode retirar margem de manobra a Montenegro.
Uma coisa é certa, a estratégia definida é apresentar rapidamente medidas que as pessoas possam percecionar como positivas para a melhoria das suas condições de vida e, de alguma forma, associá-las ao documento a apresentar em outubro, tentando assim condicionar as posições de Pedro Nuno Santos e André Ventura na decisão sobre como votar o orçamento para 2025.
O sinal da mudança do logótipo
Foi o primeiro sinal de mudança política que Montenegro quis dar ao país, e não foi por acaso, o primeiro-ministro sabe que nos próximos meses vai ter que conquistar muito eleitorado à direita que em março não apostou na AD.
O regresso ao logótipo deixado por Passos Coelho que identifica o Governo e a administração direta e indireta do Estado, foi o primeiro ato oficial de Montenegro enquanto primeiro-ministro. O discurso da tomada de posse distribuído à comunicação social e divulgado digitalmente, já surgia com o símbolo da bandeira nacional, com a esfera armilar, escudo, quinas e castelos. A imediatez da decisão de mudança corresponde a uma intenção de mostrar a uma vasta franja do eleitorado que contestou o logótipo estilizado adotado por António Costa, por considerar que a nova simbologia apagava símbolos importantes da identidade nacional. Montenegro foi um dos críticos e no seu primeiro ato oficial quis dar um sinal disso mesmo, antecipando uma decisão que sairia no dia seguinte do primeiro Conselho de Ministros do novo Governo.
O problema das decisões rápidas é a sua eficácia, e no caso da mudança de logótipo a mudança causou algumas dissonâncias. O comunicado que o Hospital de Santa Maria fez sair esta quinta-feira na sequência da divulgação dos resultados da inspeção da IGAS ao caso das gémeas surgia ainda com o logótipo antigo associado à designação República Portuguesa, que o Governo manteve.