Muitas vezes, diz-se que as crianças e os jovens não gostam de ler e/ou de escrever. Por exemplo, em 2023, soube-se que o estudo internacional PIRLS 2021 sobre literacia em leitura revelou que crianças portuguesas do 4.º ano que afirmaram não gostar de ler tiveram melhores resultados nos testes do que aquelas que disseram gostar de o fazer. A conclusão levantou preocupações sobre o modelo de ensino de Português e a forma como os alunos são avaliados. Ter muitos livros em casa tem um efeito positivo nos resultados, mas muitos alunos têm acesso limitado. O estudo também destacou a importância de passar mais tempo a ler, sendo que as crianças que leem entre uma a duas horas por dia obtêm melhores resultados. Outros fatores, como frequentar um colégio privado, ter um quarto próprio e acesso à internet, também influenciaram os resultados. Além disso, os resultados médios dos alunos portugueses no PIRLS 2021 melhoraram em comparação com 2016, mas houve uma queda nos resultados das provas digitais.
No entanto, existem instituições de ensino que desafiam as ideias que podem estar consolidadas, como é o caso da Escola Básica José Manuel Durão Barroso, em Armamar, no distrito de Viseu. Em fevereiro, foi anunciado que o conto infantil ilustrado intitulado de Vitória, vitória…, criado pelos alunos do 4º A desta escola, foi o vencedor do Prémio Literário Luís Sepúlveda. Este prémio é destinado a reconhecer e premiar contos infantis ilustrados elaborados por alunos do 1.º Ciclo. No ano passado, a mesma escola venceu o Prémio Literário Porto Editora – Conto Infantil com O Baloiço. Em 2018, no âmbito do Prémio Conto Infantil Ilustrado Correntes d’Escritas Porto Editora, a escola conseguiu o segundo e terceiro prémios com A Mochila Esquecida, do 4.ºA, e Onde a luz se esconde, do 3.ºB e 4.º ano. Em 2017, a escola já havia conquistado o 1.º e o 3.º lugares com os contos Uma limpeza necessária e A história que o Miki contou. No ano anterior, A magia de Ahmed ganhou o galardão. E quais foram os vencedores? Os estudantes do 4.º A da Escola Básica José Manuel Durão Barroso, no âmbito do prémio literário Conto Infantil Ilustrado, atribuído no Correntes d’Escritas – Encontro de Escritores de Expressão Ibérica, na Póvoa de Varzim.
É, de facto, surpreendente, não só pelos dados indicados no início do artigo, mas também devido a outro fenómeno. Como o i aprofundou em 2022, a influência do português do Brasil está a tornar-se mais forte entre as crianças e jovens portugueses devido aos conteúdos consumidos nas plataformas digitais, como o YouTube e o TikTok. Os vídeos brasileiros parecem mais apelativos e fáceis de entender do que os produzidos em Portugal. Ou seja, este facto pode levar a uma mistura de vocabulário e a dificuldades de compreensão do português de Portugal. Além disso, os pais muitas vezes reproduzem esses conteúdos para manter a atenção dos filhos, o que pode levar a uma absorção maior do português do Brasil. No entanto, especialistas alertaram para a necessidade de os pais acompanharem e explicarem as diferenças linguísticas para evitar confusões. Houve também críticas aos conteúdos educativos e recreativos em português de Portugal, com falta de diversidade e de qualidade. Entendeu-se que, enquanto a influência do português do Brasil cresce, é importante promover uma compreensão adequada da língua e garantir uma oferta variada de conteúdos em português de Portugal.
Mas, apesar de tudo… Será que as crianças gostam de escrever? O Nascer do SOL conversou com um professor do 1.º ciclo do Ensino Básico e uma professora de Português do Ensino Secundário para compreender esta realidade. «Algumas crianças têm uma afinidade natural pela escrita e gostam de expressar as suas ideias, sentimentos e histórias através das palavras. Esse interesse pode ser estimulado por experiências positivas com a leitura, a escrita e a narrativa desde cedo», garante José António, continuando: «Experiências como atividades de escrita criativa na escola, contar histórias em casa, ou manter diários ou blogs pessoais, podem influenciar o gosto das crianças pela escrita», sublinha, finalizando: «As crianças que se sentem confiantes nas suas habilidades de escrita e que recebem apoio positivo e feedback construtivo têm mais probabilidade de gostar de escrever. Os encarregados de educação e professores são essenciais neste aspecto».
«O ambiente em que uma criança cresce e aprende também pode influenciar o seu interesse pela escrita. Um ambiente que valoriza a expressão criativa, oferece materiais de escrita interessantes e encoraja a comunicação por escrito pode motivar as crianças a envolverem-se na escrita», diz Maria do Carmo, indo ao encontro da perspetiva de José António. «Algumas crianças simplesmente têm uma motivação intrínseca para escrever, encontrando prazer na atividade em si, independentemente de outros fatores externos. No entanto, é importante dizer que nem todas as crianças gostam de escrever de imediato ou da mesma maneira. Algumas podem precisar de mais tempo e incentivo para desenvolver um interesse pela escrita, enquanto outras podem preferir outras formas de expressão criativa como o desenho», explica a docente. «O importante é proporcionar oportunidades para que as crianças experimentem e descubram o que funciona melhor para elas, sempre encorajando e apoiando o seu desenvolvimento em todas as áreas».
E o que acontecerá nos anos seguintes? Será que este interesse pode manter-se? «A adolescência é um período de descoberta e autoexpressão e muitos adolescentes encontram na escrita uma maneira de expressar os seus pensamentos, emoções e identidade de forma criativa e pessoal», diz José António, enquanto Maria do Carmo, que tem mais experiência com esta faixa etária, nota que «alguns adolescentes podem associar a escrita principalmente a tarefas escolares e académicas, como acontece com a leitura, o que pode diminuir o seu interesse pela atividade, especialmente se sentirem que a escrita é uma obrigação em vez de uma escolha». «É fácil entender esta questão: tenho estudantes que não leem os livros que constam no Plano Nacional de Leitura, como ‘Os Maias’, enquanto estão no período de aulas, mas fazem-no nas férias ou até quando acabam o 12.º ano», aponta.
«O uso crescente de tecnologia e redes sociais pode influenciar a preferência dos adolescentes por formas de comunicação mais curtas e informais, como mensagens de texto e publicações em redes sociais, em detrimento da escrita longa e formal», indica igualmente a professora. «Tal como as crianças, os adolescentes que recebem incentivo, feedback positivo e apoio emocional em relação à sua escrita são mais propensos a desenvolver um gosto pela atividade e a continuar a praticá-la».
Importa referir que, no ano passado, em comparação com os resultados do ano anterior, a disciplina de Português apresentou uma melhoria significativa. Dos 35.065 alunos que fizeram exame, a média obtida foi de 12,5 valores, em contraste com os 10,9 valores registados no ano letivo de 2021/2022. Os resultados das provas nacionais de Português do 9º ano demonstraram uma melhoria significativa em comparação com o ano anterior. Na 1ª fase das provas finais de ciclo, a média das classificações foi de 61%, em contraste com os 55% do ano anterior, conforme divulgado pelo Júri Nacional de Exames. Cerca de 78,2% dos alunos conseguiram obter uma nota positiva na prova de Português.