Nas hostes sociais-democratas não há pressa para derrubar o Governo. «Não é tempo de abrir uma crise política», afirmou Luís Montenegro, a propósito dos mais recentes casos que abalaram o Governo, na primeira declaração que fez após regressar antecipadamente de férias. Para a direção do PSD, este é o momento de o Executivo socialista assumir responsabilidades e de lidar com as consequências das decisões que tomou. «O Governo tem que governar, está a governar há nove meses, que governe, que responda às pessoas. Se não for capaz que o diga», atira o secretário-geral do partido, em declarações ao Nascer do SOL.
Nesta fase, interessa mais aos sociais-democratas criar a perceção de que a instabilidade governativa é responsabilidade dos socialistas, do que ensaiarem um assalto ao poder. A estratégia é deixar António Costa a cozinhar em lume brando e ver cair, uma a uma, as maçãs podres até que a situação se torne insustentável.
O Presidente da República também concorda que este não é o tempo. Mas por razões diferentes. «Não é claro que surgisse uma alternativa evidente e forte imediata ao que existe» se o Parlamento fosse dissolvido e fossem convocadas eleições antecipadas, disparou Marcelo Rebelo de Sousa, na direção da oposição, projetando a possibilidade de o PS voltar a ganhar mais umas legislativas antecipadas confirmando o partido no Governo com uma maioria absoluta ou relativa.
A direção do PSD não entra em confronto com o chefe de Estado e rejeita que Marcelo tenha dado a entender que ainda não vê no PSD de Luís Montenegro, ou à direita, uma alternativa clara de poder.
«O Presidente da República disse aquilo com que eu publicamente concordei. Ou seja, que não era claro que havendo eleições o resultado da composição parlamentar pudesse ser diferente ou outro do que há agora. Eu concordo. Ninguém sabe», esclarece Hugo Soares.
Questionado sobre qual será a estratégia dos sociais-democratas se se verificar daqui em diante uma degradação política fruto da acumulação de casos no Executivo de António Costa, o secretário-geral do PSD diz que o partido «terá sempre a mesma posição de escrutínio rigoroso, intransigente, relativamente aos membros do Governo e ao cumprimento das políticas».
«A escolha dos membros do Governo cabe ao primeiro-ministro, ele que as assuma», desafia, acrescentando que se isso não acontecer a avaliação deve partir do Presidente da República.
Bancada desalinhada da direção
A forma como o presidente do PSD excluiu a possibilidade de eleições antecipadas e entendeu que o partido deveria abster-se na moção de censura da Iniciativa Liberal ao Governo não agradou a maioria da bancada social-democrata que esperava poder votar favoravelmente.
Esta narrativa também é negada a pés juntos pela direção do partido. «Tivemos uma reunião do grupo parlamentar com a direção, representada pelo presidente do partido, para discutir a moção de censura e dar orientação de voto. E todos os deputados que estiveram na reunião concordaram com a estratégia que a direção nacional do partido tomou. Não houve um que se manifestasse contra», garante Hugo Soares ao Nascer do SOL.
O braço direito de Luís Montenegro justifica que o PSD não apoiou esta moção de censura porque «não quer efetivamente eleições». «Mas não quer eleições não é por não estar preparado ou por ter receio de as disputar. É porque o país não pode andar de eleições em eleições. Os portugueses não aguentam uma crise política quando estão preocupados com o custo de vida, a prestação da casa, a renda da casa no final do mês, a subida dos impostos e os serviços públicos miseráveis», sustenta.
Apesar de o dirigente do PSD dar garantias que o partido está preparado «como sempre esteve» para ser uma alternativa ao Governo do PS no momento em que houver eleições, «o ambiente não anda muito famoso» dentro do grupo parlamentar, como atesta um deputado social-democrata ao Nascer do SOL.
Antes da reunião com a direção em que foi definida a orientação de voto do partido sobre esta moção de censura, uma maioria dos 77 deputados sociais-democratas alimentava a expectativa – contrariamente àquilo que ia sendo seguido por Rui Rio, que era sempre a abstenção, – de que desta vez o PSD podia aparecer com outra posição.
«Mais uma vez fomos arrastados pela movimentação política. Fomos a reboque de outros partidos, cada um dos partidos teve o seu posicionamento», lamenta o parlamentar do PSD.
Desta vez, foi a Iniciativa Liberal que tomou a dianteira e apresentou a moção de censura, para desfeita da maioria dos deputados que achava que o PSD iria mudar a sua tática política e ia assumir o controlo da oposição até porque, segundo alegam, o texto «era muito abrangente», abarcando todos aqueles que não se reveem no atual Governo e que veem necessidade de se mudar, incluindo o Chega que apesar das divergências com os liberais votou a favor. «Não o fazendo deu de mão beijada aos partidos à sua direita o combate político», traça a mesma fonte social-democrata.
Há quem já estabeleça comparações entre o atual presidente do PSD e o anterior líder social-democrata. «O modus operandi de Luís Montenegro na prática acaba por ser igual ao de Rui Rio. Apregoa aos sete ventos que o Governo está mal, que tem de ser mudado, mas na prática abstém-se na votação. Isso faz com que os deputados sintam que basicamente não houve alteração na liderança, que o partido continua com a mesma jogada tática. Parece que tem medo e não está preparado para assumir funções governativas», desabafa outro deputado social-democrata, que vê ainda nas palavras do Presidente da República «uma grande machadada no PSD e no líder da oposição».
Mais: aos olhos dos deputados, com esta estratégia, o atual líder social-democrata corre sério risco de se queimar. «As pessoas já começam a perceber que esta estratégia não vai levar o partido de novo ao poder em Portugal. Quando isto acontece, começa a haver no PSD aquela imagem de triturar líderes, como no passado aconteceu várias vezes porque as pessoas entendem que não há preparação para assumir funções governativas portanto o melhor é começar a pensar numa alternativa que faça com que o PSD vá para o Governo».
A demarcação dos sociais-democratas da restante direita também não passou ao lado do primeiro-ministro, que, no debate da moção de censura ao seu Executivo – que acabou rejeitada com os votos contra do PS, PCP e Livre e a abstenção do PSD, BE e PAN –, constatou não existir uma alternativa no país. «Há uma alternativa mais estável? A resposta está previamente anunciada porque nem sequer na censura ao Governo a direita se consegue entender», atirou.