As mudanças estruturais da economia portuguesa estão a contribuir para a sustentabilidade ambiental?

As mudanças estruturais da economia portuguesa estão a contribuir para a sustentabilidade ambiental?


Podemos aprender bastante olhando para o quão sustentável tem sido a evolução da economia portuguesa desde 1995, identificando as principais tendências de crescimento económico e uso de recursos em diferentes períodos.


Atualmente, com o reconhecimento da emergência ambiental em que vivemos, uma economia em crescimento deixou de ser a única aspiração coletiva, pois queremos uma economia resiliente para lidar com eventos como crises económicas globais ou as alterações climáticas. Uma economia é um sistema complexo, caracterizado por interações entre fluxos monetários e de materiais. Uma decisão numa empresa tem efeitos não só no valor acrescentado que gera, mas também nos materiais que usa, assim como nos impactos ambientais associados a toda a cadeia de valor desses materiais. Podemos então alcançar um sistema resiliente que seja económica e ecologicamente sustentável?

Para responder a esta pergunta é necessário considerar as várias partes (setores económicos) deste complexo sistema, assim como a forma como estas se relacionam, e isso tem sido matéria da nossa investigação no Instituto Superior Técnico. Com esta informação podemos entender a forma como as mudanças num setor económico afetam o resto da economia e de que forma os fluxos monetários se relacionam com os fluxos de materiais e como evoluem ao longo do tempo. Criando um plano em que tudo isto é considerado, podemos, por um lado criar uma economia forte e resiliente e que por outro lado promove sustentabilidade ambiental.

Podemos aprender bastante olhando para o quão sustentável tem sido a evolução da economia portuguesa desde 1995, identificando as principais tendências de crescimento económico e uso de recursos em diferentes períodos. Entre 1995 e 2001 o produto interno bruto (PIB) encontrava-se em crescimento (21%) e o uso de materiais aumentava consideravelmente (39%), levando a que a produtividade dos recursos (valor acrescentado por cada unidade de material usado pela economia) tenha diminuído durante este período (-12%), o que configura um crescimento não sustentável do ponto de vista ambiental. Neste primeiro período, o crescimento económico foi sobretudo suportado pela indústria dos serviços, já o aumento da utilização de recursos foi uma consequência do crescimento do sector da construção. Em 2002 e 2003 a economia estagnou, o uso de recursos per capita diminuiu e a produtividade dos recursos aumentou 13%. A partir de 2003, apesar do baixo desenvolvimento económico (6% de aumento no PIB), o consumo de recursos aumentou significativamente mais uma vez (30%), com a economia portuguesa a atingir um mínimo na sua produtividade desde 1995 em 2008 (0.71€/kg). Durante este período, os recursos foram sobretudo usados para construir infraestruturas para serviços. Com a crise económica de 2007-2008, o valor acrescentado de quase todos os sectores diminui, assim como a sua utilização de recursos. No entanto, verificou-se uma mudança estrutural, que contribuiu para o aumento da produtividade da economia portuguesa que atingiu um máximo em 2013 (0.94€/kg). O que se verificou nos anos seguintes, durante a recuperação económica, foi algo que não tinha sido observado em nenhum dos outros anos: a economia cresceu, o PIB aumentou (17%) e ultrapassou os valores anteriores à crise, mas o aumento do uso de materiais não seguiu as tendências dos períodos de crescimento económico anteriores, consolidado o papel da mudança estrutural, com menor relevo para o setor da construção. Desde 2013 que o aumento do uso de recursos tem acompanhado o crescimento económico, levando a que a produtividade se mantenha relativamente constante e a níveis semelhantes aos de 1995.

Quando observamos as dinâmicas entre os sectores desde 1995, vemos que apesar do setor da construção ter uma baixa produtividade (0.06€/kg) e ser um dos principais responsáveis pela utilização de recursos na economia, este criou infraestruturas para o setor dos serviços. Por outro lado, o setor dos serviços é o setor com a mais alta produtividade (2.98€/kg), e foi o aumento do valor acrescentado deste sector o principal fator que levou aos aumentos de PIB. Assim, podemos concluir que nos anos de baixa produtividade da economia foram construídas as infraestruturas necessárias para que o setor dos serviços pudesse crescer. Após a crise económica a maioria dos setores recuperou e, por outro lado, setores menos produtivos e cuja procura diminuiu, encontraram novos paradigmas de operação.

Em conclusão, sim, a economia portuguesa pode evoluir e tornar-se mais sustentável. Para isso é importante que sejam reconhecidas e antecipadas as diferentes fases de crescimento da economia, para que as políticas implementadas possam promover e orientar a mudança no sentido de setores económicos com maior valor acrescentado e menos intensivos no consumo de materiais. Além disso, é necessário que existam os mecanismos para que a economia possa continuar numa trajetória de desacoplamento entre crescimento económico e consumo de recursos, evitando que seja necessária uma crise económica (por exemplo associada a preços crescentes de matérias-primas) para que a economia volte a encontrar novos modos de funcionamento mais sustentáveis.

 

Professor do Instituto Superior Técnico, Investigador do IN+

Investigadora do Instituto Superior Técnico e IN+