Depois dos supermercados com prateleiras vazias, o Reino Unido vê-se agora a braços com outro problema: postos de combustíveis vazios. O pânico é de tal ordem elevado que dois terços dos 5500 postos estavam prestes a esgotar e levaram o primeiro-ministro britânico a não ter outra hipótese se não pedir ajuda ao Exército. O cenário nos postos de abastecimento do país têm-se repetido ao longo dos últimos dias: filas e mais filas. Tudo porque, com a escassez do combustível, muitos postos ameaçaram até com o seu encerramento temporário. O Governo garante que o problema não é a falta de combustível mas sim a falta de motoristas. No entanto, este “pânico” deverá passar em breve.
“A escassez de combustíveis no Reino Unido tem sido resultado da falta de motoristas no país. O primeiro-ministro britânico já tinha colocado a possibilidade de destacar alguns militares para combater a atual falta de motoristas e esta parece-me ser das melhores opções a serem tomadas”, começa por dizer ao i Henrique Tomé, analista da XTB.
A falta de motoristas de pesados é, aliás, um problema que tem sido muito notado no país nos últimos tempos. Mas a que se deve este problema? O analista diz que “é resultado do último ano e meio de pandemia em conjunto com o Brexit”. E explica ainda: “Há poucos meses é que a atividade economia tem estado a recuperar e não nos podemos esquecer de que esteve praticamente parada, em alguns setores, durante vários meses no ano passado e no início deste ano. A situação agravou-se ainda mais com o Brexit, uma vez que muitos migrantes acabaram por retomar aos países de origem e criaram algumas lacunas no tecido laboral do país”.
Questionado pelo i, Henrique Tomé não tem dúvidas de que esta falta de mão de obra “poderá ser sentida nos trabalhos mais precários, uma vez que estes eram ocupados, sobretudo, por estrangeiros”.
Reagindo à situação que o país enfrenta já várias empresas do setor petrolífero como a Shell, ExxonMobil e Greenergy, vincaram que as dificuldades no abastecimento estão a ser causadas por “picos temporários na procura do cliente – não uma escassez nacional de combustível”.
Outras empresas como BP e Esso garantiram existir “bastante combustível nas refinarias e terminais do Reino Unido”, prometendo estar “a trabalhar em estreita colaboração com o Governo para ajudar a garantir que o combustível esteja disponível para entrega aos postos em todo o país”.
Henrique Tomé diz também que não se trata de uma escassez de combustível. “De facto, não podemos considerar que o Reino Unido está a passar por uma escassez nacional de combustíveis”, defende Henrique Tomé. Então o que tem acontecido? “O que tem estado a acontecer é resultado do excesso de procura por parte dos consumidores britânicos em dados momentos e, como consequência, a falta de motoristas faz com que o abastecimento dos postos de combustível demorem mais tempo”.
E não tem dúvidas que as notícias divulgadas pela comunicação social “acabam por alimentar também o medo dos britânicos sobre uma eventual escassez de combustível no país que faz com que consumam mais do que realmente necessitam”.
E é exatamente ao pânico que o presidente da Associação de Postos de Gasolina (PRA) britânica atribui a escassez de combustível.
“Um dos nossos membros recebeu um tanque de combustível ao meio-dia e ao final da tarde tinha totalmente desaparecido nos carros das pessoas”, disse Brian Madderson à BBC, acrescentando que as bombas mais afetadas estavam nas áreas urbanas e que cerca de dois terços dos 5500 postos de venda filiados à Associação ficaram “parcialmente secos ou prestes a esgotar”.
A justificação é simples: “pânico puro e simples” dos condutores. Mas confessou que embora os postos estejam a ser “abastecidos, o número de tanques que estão a receber está abaixo da quantidade necessária”.
A ajuda do Exército
O pânico instalou-se de tal forma no Reino Unido que o Governo viu-se obrigado a pedir a ajuda do Exército. “Um número limitado de motoristas de tanques militares deve estar preparado para intervir e mobilizado, se necessário, para estabilizar o fornecimento de combustível”, disse esta terça-feira o Ministério dos Negócios e da Energia britânico, em comunicado. E acrescentou que perto de 150 militares vão receber treino de emergência para fazer o transporte de gasolina até aos postos “onde é mais necessária e para dar mais garantias de que o abastecimento de combustível continue a ser abundante”.
A falta de mão de obra
A escassez de trabalhadores no Reino Unido é justificada mais pelo Brexit do que pela pandemia. Isto porque os emigrantes eram muito importantes neste aspeto. “O Reino Unido é conhecido por, durante muitos anos, acolher imigrantes de várias partes do globo. No entanto, neste momento, a entrada a novos emigrantes acaba por ser limitada e bastante burocrática”, tinha explicado, no mês passado ao i, Henrique Tomé. No entanto não tem dúvidas que a pandemia também é responsável pela situação atual.
Já Paulo Rosa, economista sénior do Banco Carregosa, defendia que “no que concerne aos fluxos migratórios, a atual escassez de mão de obra no Reino Unido resulta de uma mistura de Covid e Brexit”, lembrando que “a escassez de mão de obra não será apenas um efeito Brexit, mas é um facto que a saída do Reino Unido do mercado único europeu contribuiu, também, para essa mesma escassez”.
E deixou o alerta: “Alguns setores precisam perceber que os dias em que tinham mais disponibilidade de mão de obra podem ter acabado e os empregadores terão de pagar mais para garantir pessoal disponível. Salários mais elevados poderão redundar num acréscimo de inflação indesejável”. Para o economista, é claro que “o Brexit causou problemas em áreas como transporte, hotelaria e construção e os empregadores britânicos lutam contra a pior escassez de pessoal dos últimos 25 anos”.
‘Pânico’ pode chegar a Portugal
O ‘pânico’ existente no Reino Unido pode chegar vários países europeus, incluindo a Portugal. A garantia foi dada pelo presidente da Associação Nacional de Transportadores Públicos Rodoviários de Mercadorias (ANTRAM) que diz não ter “grandes dúvidas de que aquilo que está a acontecer neste momento em Inglaterra foi acelerado pelo processo do Brexit, que, de facto, levou a que haja menos frota europeia a fazer transportes internos dentro de Inglaterra”.
E, portanto, “a manterem-se as coisas assim e a continuarmos a não ter a atenção política que este assunto merece, acredito que aquilo que hoje está a acontecer em Inglaterra, daqui a muito poucos anos, irá acontecer também na Europa, e, daqui a menos anos ainda, nos Estados Unidos. Em Portugal, também”, disse à TSF.