Covid-19. Lisboa com mais jovens infetados e RT de 1,10

Covid-19. Lisboa com mais jovens infetados e RT de 1,10


Região de Lisboa está com o RT mais elevado no continente. DGS confirma crescimento lento e sustentado na capital “superior ao resto do país”. Ainda não foram associados casos aos festejos do Sporting.


Com a maioria dos idosos vacinados e menos pressão sobre os hospitais a braços com a recuperação da resposta a doentes não covid-19, a monitorização da epidemia segue o seu curso com a preocupação de manter as cadeias de transmissão controladas e evitar que o país saia de corredores turísticos. O índice de transmissão (RT) voltou a estar acima de 1 e há um indicador que se vem destacando: ao contrário do que acontecia até aqui, os diagnósticos têm estado a aumentar em particular na região de Lisboa, que ultrapassou o Norte em novos casos.

Nos últimos sete dias, de acordo com os dados publicados pela DGS nos boletins, os diagnósticos em Lisboa aumentaram 39% em relação à semana passada, uma subida maior do que no resto do país – por exemplo o Algarve já parece ter conseguido controlar o aumento de infeções na semana passada em Albufeira, associadas a um surto numa empresa agrícola.

Questionada sobre o aumento dos casos em Lisboa, a DGS centra a questão na capital: “A incidência cumulativa a 14 dias por cem mil habitantes no concelho de Lisboa tem observado um crescimento lento e sustentado nas últimas duas semanas, sendo superior à da região de LVT e do país”, respondeu ao i a DGS. Não há para já uma associação aos festejos na semana passada: “Não existe reporte de surtos relacionados com os festejos do Sporting”, adiantou a DGS, ressalvando que quaisquer ajuntamentos sem cumprimento de regras são fator de risco e sem adiantar outras explicações ou contextos de subida de infeções.

 

Mais jovens infetados

Carlos Antunes, da equipa da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (FCUL) que acompanha a epidemia, considera ser cedo para associar o aumento a algum evento particular na semana passada, o que se poderá avaliar melhor nos próximos dias, dando nota de que houve um ligeiro sinal de mais diagnósticos no fim de semana, seis dias após os festejos, que podem ser reflexo disso ou não. O investigador salienta que o aumento foi sustentado desde 4 de maio e que, por isso, associam-no mais à quarta etapa do desconfinamento, que arrancou a 1 de maio.

Os cálculos do índice de transmissão (RT) feitos pela FCUL, que são menos desfasados temporalmente do que os dados oficiais do Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge – cuja última análise do RT nacional publicada ontem (1,02) se refere à média de cinco dias a 12 de maio – mostram que o índice de transmissão continuou a subir ao longo de toda a semana passada e atingiu a 18 de maio o valor de 1,06 a nível nacional, com sinal de estabilização. Mas a situação não é igual em todo o país: no cálculo para o período entre 14 e 18 de maio, o Norte está com um RT de 1,01 e Lisboa de 1,10, o que já não acontecia há várias semanas.

É no entanto na análise das infeções por faixa etária por região que a equipa de Carlos Antunes e Manuel Carmo Gomes encontra o indicador que consideram que deve ser seguido: na região de Lisboa têm vindo a ser detetadas mais infeções entre jovens na casa dos 20 e aos 29 anos, representando cerca de 30% dos novos casos na região quando no resto do país representam 19%. “É a faixa etária com mais casos mas há variações regionais que importava serem estudadas para se perceberem as causas”, defende ao i Carlos Antunes, que sublinha que em termos de hospitalizações, os mais idosos estão mais protegidos, mas estão documentadas sequelas também nestes grupos etários. Além disso, aumentar a transmissão pode potenciar a circulação das novas variantes. Em termos populacionais, a região Norte e Lisboa são as únicas comparáveis (com perto de 3,5 milhões de habitantes cada) e a diferença é notória: o Norte tem uma incidência de 72 casos por 100 mil habitantes nesta faixa etária dos 20 aos 29 e Lisboa 132.

 

Capital a caminho dos 120 casos por 100 mil habitantes

Os dados analisados pela equipa da FCUL confirmam também que, na região de Lisboa, o aumento de casos verifica-se de forma mais notória na capital. Isso escapa às avaliações de que é dada nota pública semanalmente no final do concelho de ministros: sendo o município mais populoso do país, Lisboa não está acima do patamar dos 120 casos por 100 mil habitantes que o Governo usa para sinalizar concelhos em risco, mas os dados da DGS que serviram de base à avaliação semana passada já mostravam um aumento de incidência significativo, com Lisboa a passar de 67 casos para 81 casos por 100 mil habitantes a 14 dias no espaço de uma semana, uma variação de 21% na incidência.

Fazendo as contas à população do concelho, significa que foram detetados mais 70 casos no período de 14 dias avaliado na semana passada do que no anterior (uma subida de 341 casos para 412). A título comparativo, Arganil, o município que na semana passada estava com maior incidência (826 casos por 100 mil habitantes), tem uma população de 11 mil pessoas e chega a este valor com 90 casos em 14 dias. Em Lisboa, com 4 vezes mais, não se está no patamar dos 120 casos por 100 mil habitantes. Já esta semana, Carlos Antunes adianta que com dados de terça-feira, que ainda não são públicos, o município está com uma incidência cumulativa a 14 dias de 97 casos por 100 mil habitantes e um RT de 1,10, o que significa que em pouco tempo, não havendo uma inversão da tendência, pode pisar a linha vermelha dos 120 casos por 100 mil habitantes. “A diferença é que num concelho maior, pode ser mais difícil controlar a incidência do que num concelho mais pequeno”, alerta.

Nos concelhos à volta de Lisboa, como Sintra, Loures ou Odivelas, mantinha-se até à semana passada, os últimos dados públicos, uma situação mais controlada, na casa dos 40 casos por 100 mil habitantes. “Os dados em termos epidemiológicos são sempre obtidos com mais atraso. Penso que poderá ter haver com a comunidade estudantil do ensino superior”, sugere o investigador. Uma outra constatação prende-se com não estarem a ser feitos mais testes, pelo menos até esta semana, e não ser isso que explica estarem a ser detetados mais casos. A testagem bateu recordes na semana em que reabriu o secundário e o superior mas desde então os testes diminuíram. Na semana passada, voltaram a baixar 18%. Esta segunda-feira houve um ligeiro aumento, mas a positividade, que até aqui tinha atingido o valor mínimo desde o início da pandemia (abaixo de 1%, sendo preciso 150 testes para apanhar um caso positivo) já voltou a subir, assinala Carlos Antunes. “Continua a estar num patamar confortável, na casa dos 1,4%, mas o que temos defendido é que a testagem massiva é essencial para manter a epidemia controlada e evitar cadeias de transmissão”, conclui.