Neemias Queta. O miúdo do Barreiro que quer fazer história

Neemias Queta. O miúdo do Barreiro que quer fazer história


Depois de uma época onde bateu recordes e superou todas as expectativas, Neemias Queta anunciou que vai candidatar-se ao draft da NBA. Quer tornar-se o primeiro português a atuar no ‘Olimpo’ do basquetebol.


Não é qualquer um que faz história, mas Neemias Queta pode estar muito perto de o conseguir. Aos 21 anos quer tornar-se o primeiro português a ingressar na principal liga de basquetebol profissional da América do Norte, a NBA.

Natural do Barreiro, em Setúbal, Queta chegou a jogar pelo plantel principal do Benfica, mas abandonou Portugal, em 2018, para procurar ambições maiores.

Desde então o atleta tem jogado pela equipa universitária Utah State Aggies, onde, apesar da expectativa de tentar a sua sorte no draft, preferiu continuar a aprimorar as suas capacidades antes de declarar-se elegível para este evento, que irá realizar-se a 29 de julho.

Agora, Neemias abdica do seu último ano como atleta universitário para dar o salto para a maior liga de basquetebol do mundo.

“Após conversa com a minha família e membros da equipa técnica da universidade, decidi prosseguir o meu sonho de jogar na NBA e vou declarar-me elegível para o draft 2021”, pode ler-se no Instagram do poste de 2,13 metros de altura e 111 kg.

“Acredito que existem algumas probabilidades do Neemias ser escolhido no draft”, diz ao i o comentador de basquetebol da Sport TV, Ricardo Brito Reis. “Vem de um ano espetacular em Utah State, em que liderou a equipa e surgiu no top-5 a nível nacional em vários itens estatísticos”.

O português teve uma época repleta de destaques, acabando a temporada de basquetebol universitário com médias de 14,9 pontos, 10,1 ressaltos, 2,7 assistências, 1,1 roubos de bola e 3,3 desarmes de lançamento, com eficácias de 55,9% nos lançamentos de campo e 70,7% nos lances livres, tornando-se assim o primeiro jogador universitário desde Anthony Davis, astro dos Los Angeles Lakers, a conseguir médias de pelo menos 9,5 ressaltos, 2,9 desarmes e um roubo de bola por jogo.

Queta foi ainda recordista de mais desarmes realizados durante toda a temporada (97) e durante um único jogo (9).

Todas estas distinções valeram ao atleta português os prémios de melhor defesa do ano na Conferência Mountain West e, para a Bleacher Report, Queta foi mesmo o melhor jogador defensivo entre todos os atletas universitários.

 

Que tipo de jogador é Neemias?

A NBA mudou muito ao longo dos anos: o jogo tornou-se menos físico, mais rápido e com primazia para o lançamento de três pontos, algo que pode deixar um poste como o gigante Neemias numa posição sensível caso não se consiga adaptar a esta nova realidade.

“[Neemias Queta] é intrigante para as equipas na NBA pela sua combinação de tamanho, largura e QI basquetebolístico”, escreve a ESPN. “Ele melhorou significativamente a sua capacidade de passar a bola e a compreensão do jogo nos três anos que passou em Utah”, descreve o site de referência desportivo, que entrevistou o português e acabou por lhe perguntar o que acha que pode acrescentar à sua possível futura equipa. “Quero mostrar que sou um jogador versátil e que sou muito mais do que um atleta que joga debaixo do cesto e quero provar todo o potencial que tenho”, confessou o português.

O que poderá então oferecer o português à NBA? “O Neemias desenvolveu uma capacidade invulgar de passar a bola, para um poste. Ele não é só um defensor e um ressaltador de elite”, esclarece Ricardo Brito Reis. “Apesar de ter o rótulo de “poste tradicional”, o seu reportório de movimentos perto do cesto aumentou muito, este ano, por ser a principal referência de Utah State, nos dois lados do campo”.

Apesar de não ser um lançador exímio, a versatilidade e instintos defensivos do português podem torná-lo um jogador precioso para qualquer equipa. “Se olharmos para os postes da NBA que são especialistas defensivos, há muitos que não lançam de três pontos, como o Rudy Gobert, o Clint Capela, o Bam Adebayo e o Robert Williams. Ainda há mercado na NBA para jogadores como o Neemias”, explica o comentador, que acrescenta que os jogadores atuais mais parecidos com Queta são Jarrett Allen e Mitchell Robinson, “no que se refere à intimidação e capacidade defensiva de proteger o cesto e, no ataque, enquanto ameaça em situações de bloqueio direto”.

 

Destino: Canadá?

A evolução do jogo de “Quetão”, como é carinhosamente apelidado pelos seus fãs, foi notória e serviu para este subir nas tabelas que preveem em que posição os jogadores vão ser selecionados no draft. Entre os 60 atletas selecionados, 30 em cada ronda, o português foi colocado em 52º lugar pelo The Athletic e a ESPN coloca-o na 76ª posição, o que significaria que este não seria escolhido por este método. Mesmo assim pode ser contratado “por outras vias, como a G-League (liga de desenvolvimento da NBA) ou até como ‘undrafted’”, esclarece o comentador.

Queta está pronto para se tornar o primeiro português a ingressar na NBA, seguindo assim o caminho de Ticha Penicheiro, lenda da WNBA que entrou no Hall of Fame da principal liga de basquetebol feminino norte-americano em 2019, ou Mery Andrade, e prontos para adotar os seus serviços poderão estar os Toronto Raptors, equipa que observou diversos jogos do atleta e que demonstrou interesse em contratá-lo.

“Tantas viagens para o observar in loco são, na minha opinião, um sinal de um interesse concreto, até porque os canadianos têm tido muitos problemas na posição de poste”, explica Ricardo Brito Reis, que considera que este seria um bom destino para Queta.

“Os Raptors seriam, para mim, uma das melhores equipas para o Neemias. Têm uma estrutura que aposta bastante em atletas internacionais, o presidente de operações Masai Ujiri tem origem nigeriana, o treinador Nick Nurse tem experiência fora dos Estados Unidos (Bélgica e Inglaterra) e seu adjunto é o atual selecionador espanhol e campeão do mundo Sergio Scariolo”, afirma, acrescentando que a equipa canadiana tem “um dos melhores programas de desenvolvimento de jovens na NBA e uma equipa da G-League, os Raptors 905, que têm trabalhado muito bem nos anos mais recentes”.

Claro que, apesar de chegar à NBA seria “uma etapa que encheria [todos os portugueses] de orgulho”, confessa o comentador, que ressalva que Neemias “não pode ficar por aí”. “É preciso perceber que o Neemias ainda tem que continuar a evoluir para poder fixar-se na NBA”, explica. “Cada vez mais, as equipas da liga apostam em postes versáteis e que sejam capazes de lançar triplos e defender jogadores exteriores, portanto chegar à NBA é só mais uma etapa”.

Para já, isto não passam de suposições, só no final de julho saberemos se Neemias fará história, ou não, ao tornar-se o primeiro português a entrar na NBA. Mas o que é isto significaria para o nosso país?

“Ter um jogador na NBA seria uma oportunidade de ouro para potenciar ainda mais a modalidade”, explica Ricardo Brito Reis. “Os miúdos teriam uma grande referência no masculino – no feminino já temos a Ticha Penicheiro e a Mery Andrade, que estiveram na WNBA – e não voltaríamos a ouvir dizer que é impossível chegar à elite da NBA”.