Tive oportunidade de visitar no dia 26 de abril o Miradouro do Zebro, no Município de Oleiros, com o magnifico observatório desenhado pelo sempre genial Arquiteto Siza Vieira.
Foi inevitável que esta visita me fizesse refletir sobre as relações do turismo com a acessibilidade e com a segurança, atributos fundamentais para manter a nossa oferta de turismo em padrões de qualidade internacionais, capazes de competir com outros locais do mundo.
Alguns dirão, mas o turismo de aventura existe e atrai muitas pessoas em todo o mundo. É certo que sim, em alguns casos proporcionando experiências extraordinárias cumprindo todos os requisitos de segurança, em outros num exercício de plena inconsciência ignorando por completo regras de segurança e riscos associados. Neste mundo há de tudo, o que até é bom! Mas o melhor mesmo é sermos capazes de seguir as boas práticas e registar os maus exemplos para não os repetir
O Miradouro do Zebro foi inaugurado no dia 25 de Abril, com bastante publicidade, em várias línguas, como convém quando se pretende atrair visitantes. Há inúmeras fotos na internet para quem não tenha tido oportunidade de ver.
O Miradouro é constituído por uma plataforma circular, que está fixada na rocha, e oferece uma vista panorâmicas, desde o fundo do vale. Através de duas grandes janelas de vidro, colocadas no chão permite-se ainda espreitar os rochedos que continuam até ao fundo do vale. Uma obra verdadeiramente arrojada!
Não vou discutir nem o seu custo nem a oportunidade turística que este Miradouro encerra, e que virá certamente a ser objeto de alguns prémios de arquitetura. Também não se contesta o desejo que o Município de Oleiros terá tido de lançar uma obra icónica com grande impacto para esta região.
O que é extraordinário é que este Miradouro tenha sido construído e inaugurado sem considerar as acessibilidades ao local e a circulação pedonal, quer no acesso, quer no próprio Miradouro.
O acesso é feito diretamente pela estrada, exatamente numa curva onde, poucos metros à frente, existe uma pequena e estreita baia que permite o parqueamento em zebra de apenas quatro veículos ligeiros, ou um autocarro. O resultado é termos várias pessoas a atravessarem a estrada em cima de uma curva, e carros estacionados de forma indisciplinada, junto da entrada do Miradouro, pois a estrada é adversa a percursos pedonais em caso de estacionamentos mais longínquos.
Obviamente que não basta construir o Miradouro, é necessário assegurar que há condições de acessibilidade adequadas à procura que se estima, considerando que virão excursões em autocarro, e vários carros ligeiros. Nada disto foi acautelado.
Vamos então entrar para o Miradouro. Surpreendentemente a entrada é feita pelas escarpas. Nas fotos mostra-se uma rampa acimentada, mas essa não é a entrada, é apenas a rampa de acesso à plataforma circular. Para chegar a esta plataforma é necessário caminhar vários metros por cima de escarpas, tendo apenas um frágil apoio de mão, do lado esquerdo de quem entra, deixando buracos naturais da escarpa no caminho, por onde facilmente um adulto escorrega, e uma criança ou adolescente ainda mais. Como se esta primeira parte não fosse ainda perigo suficiente, de seguida passamos a outra etapa, a falésia não tem qualquer proteção, apenas um cartaz a alertar para que os visitantes tenham cuidado. É a situação ideal para uma criança escapar de ao pé dos pais e escorregar ou mesmo cair pela escarpa. Idêntico risco para os idosos ou para qualquer pessoa com restrições de mobilidade. Todo este descuido se configura numa enorme irresponsabilidade pela falta de segurança, e de acessibilidade ao Miradouro.
Na verdade, apenas o Miradouro propriamente dito foi concebido com o cuidado de ter uma rampa de cimento com proteção, e a plataforma circular também protegida. Quem certificou a abertura do Miradouro nestas condições? Se nada for rapidamente feito corremos o risco de esta obra ficar tristemente famosa!
Professora e investigadora em transportes, Departamento de Engenharia Civil, Arquitetura e Georrecursos do Instituto Superior Técnico