Desconfinamento. Culpabilização não incentiva à adesão

Desconfinamento. Culpabilização não incentiva à adesão


Gabinete de Crise Covid-19 da Ordem dos Psicólogos pede ao Governo que se estudem fatores além da mobilidade e das taxas de incidência. 


Com os dias de sol a aparecerem com cada vez mais frequência muitos relatam que veem cada vez mais pessoas na rua. Será devido à baixa perceção de risco, à fadiga pandémica, a uma má transmissão da informação ou a falta dela?
Contactado pelo i, o responsável pelo Gabinete de Crise Covid-19 da Ordem dos Psicólogos Portugueses (OPP) explica que é uma mistura de vários fatores que não estão a ser estudados pelo Governo da forma como deviam e “que seriam importantes para percebermos mais concretamente o comportamento das pessoas”.

O fator “mobilidade”, relacionado com o confinamento e o facto de a população circular ou não, é apenas um dos que deveriam merecer atenção, defende Tiago Pereira. De acordo com o psicólogo é importante ter em atenção que a mobilidade pode ser feita com segurança. Apesar de existirem “mais pessoas a movimentar-se agora do que no primeiro confinamento”, a verdade é que o “número de infeção e internamentos” também desceu muito mais rapidamente do que aquilo que podemos observar no ano passado. Porquê? “Porque hoje há mais condições para essa mobilidade”, explica Tiago Pereira. Ao contrário do que aconteceu no início da pandemia, “há hoje mais condições para a mobilidade”, como o conhecimento acerca do vírus e das normas a cumprir para travar a transmissão.

Outro fator importante a analisar, de acordo com o psicólogo, é a perceção: “Quando achas que vais ter um mau dia e te focas nisso, acabas por ter um mau dia”, exemplifica Tiago Pereira. Ou seja, o facto de acreditarmos que muitas medidas estão a ser transpostas vai fazer com que procuremos por exemplos que nos confirmem as nossas suspeitas. Aqui, o responsável pelo Gabinete de Crise assume que, mesmo que exista por vezes comunicação que procure dar visibilidade aos maus exemplos, “não há nenhum estudo que diga que uma comunicação negativa e culpabilizante incentiva  a adesão às recomendações”. O próprio afirma ainda que, enquanto psicólogo, não achou correto o momento em que o primeiro ministro disse que “era ilegítimo que as pessoas se sentissem cansadas, visto que a fadiga pandémica é legítima e é normal que as pessoas, em especial certos grupos, estejam cansadas”. Acrescentando ainda que “quando estamos cansados tendemos a cometer erros”.

Tiago Pereira fala ainda dos fatores “controlo” e “propósito” como métodos importantes para fazer a população cumprir as regras. Por um lado, é importante que se possa garantir uma certa previsibilidade nos planos que se apresentam sem se regressar atrás nem falhar. Por outro, a população tem de perceber que está a fazer isto por uma razão”, explica o especialista, afirmando ainda que é importante que se confie “que o que está a ser feito vai ter um certo resultado”. Neste segundo dever de recolher obrigatório, contrariamente ao primeiro, é possível assistir a uma “fragmentação de opiniões”, sendo que nem todos os membros do Governo e especialistas estão de acordo em determinadas matérias, o que diminui a confiança dos portugueses nas normas que são apresentadas, alerta. Com o número de casos a baixar e cada vez mais pessoas a serem vacinadas, começa-se a ver uma luz ao fundo do túnel mas Tiago Pereira pede ao Governo que se estude a previsibilidade de comportamento da população porque é dessa forma que é possível obter uma maior certeza em relação às medidas que se estão a tomar.