Da velha estante: O Juramento dos Vikings

Da velha estante: O Juramento dos Vikings


Há uma tira de Hagar o Horrível em que o víquingue criado por Dick Brown, chegado a França para a pilhagem, vê um burguês gritando aos quatro ventos “Cachez vos belles!”, receoso do estupro a que as mulheres estariam sujeitas; quando Hagar vislumbra um estafermo à janela, é o próprio que grita desalmadamente: “Cachez vos…


Há uma tira de Hagar o Horrível em que o víquingue criado por Dick Brown, chegado a França para a pilhagem, vê um burguês gritando aos quatro ventos “Cachez vos belles!”, receoso do estupro a que as mulheres estariam sujeitas; quando Hagar vislumbra um estafermo à janela, é o próprio que grita desalmadamente: “Cachez vos belles!” Ah, os víquingues!… Historicamente, levaram tudo à frente, da Europa oriental ao norte de África. Pagãos relapsos por muito tempo, tanto se lhes dava arriar em cristãos como em muçulmanos. Ao rei de França impuseram um extenso domínio, a terra dos homens do Norte, os normandos – essa Normandia que viria a estar na origem da Guerra dos Cem Anos… Para deles se proteger, Mumadona Dias, condessa de Portucale (c. 943-950), mandou erigir uma larga torre que deu origem ao castelo de Guimarães; Mediterrâneo adentro, atiraram os árabes ao mar, criando o reino normando da Sicília…

Hoje voltamos a Peyo (Pierre Culliford, 1928-1992), depois de Kim Kebranoz, e também ao mar, depois de Raven, na semana passada. E a própria pirataria não está de todo ausente, uma vez que o autor, belga de pai inglês, é descendente de um flibusteiro do séc. xvii, Robert Culliford, parceiro e depois inimigo do célebre Capitão Kidd (1645-1701), corsário escocês. Les Aventures de Johan aparecem no jornal belga La Dernière Heure, em 1946. Trata-se de um escudeiro com traços de Príncipe Valente disneyficado, habitando numa Idade Média de transição, por volta do séc. x, e que ao terceiro álbum, já na revista Spirou, ganhará em Pirlouit – um anão truculento que tem uma cabra por montada – um digno Sancho Pança, ou um Haddock, um Fantásio, um Obélix… Em Portugal tomaram o nome de João e Pirolito.

O Juramento dos Vikings, álbum original de 1958, sem a panóplia de feiticeiros, ogres, gigantes, pequenos seres azuis (os Schtroumpfs apareceram aqui) que caracterizam a série, é um episódio bastante linear: de regresso de uma missão que lhes fora confiada pelo rei, e após uma trapalhada de Pirolito, caído ao mar vestido, os dois amigos são acolhidos por uma família de pescadores. Um dos quatro filhos, pela idade e porte, destoa do resto da família. Não tardaremos a perceber que se trata de um jovem rei destronado pelo regente, que em segredo fora escondido naquele recanto isolado. Há guerra civil no reino da Snoelândia, e sem noção do que está em causa, julgando ser o rapaz o filho mais velho do pescador, João e Pirolito veem-se envolvidos numa disputa entre dois grupos – os que querem matar o jovem e os que querem resgatá-lo para que se sente no trono.

A partir daqui há um corrupio por entre mares e ilhas, enseadas e castelos, espadeirada de meia-noite, em vinhetas que compõem pranchas com um ótimo dinamismo visual.

João e Pirolito – O Juramento dos Vikings

Texto e Desenho Peyo

Editora União Gráfica, Lisboa, 1967

 

BDTECA

Marzi. Spirou – 1 Guerra Fria: o Conde de Champignac foi raptado pelo KGB. Os soviéticos precisam da colaboração do excêntrico sábio na conceção dum vírus do comunismo, a disseminar pelo mundo inteiro. Uma piscadela de olho a Tintim?… Spirou chez les Soviets, por Fabrice Tarrin e Fred Neidhart, Dupuis 2020.

Spirou – 2 Intriga internacional no Pacific Palace, hotel onde se refugia um ditador fugido da Europa oriental, e com ele a jovem filha, a que Spirou também não ficará indiferente. Para tudo se tornar mais estranho nesta espécie de huis clos em extremo tensional, Fantásio é também groom e, como sempre, desastrado. Em curso de publicação no magnífico semanário de BD que leva o seu nome.

Spirou – 3 A dupla Vehlmann & Yoann, uma das boas que lhe assina as histórias, prossegue com o inofensivo Supergroom. 
Spirou – 4 Mas talvez a grande dupla que pegou neste ícone belga tenha sido Tome & Janry, criadores também da série divertidíssima do Pequeno Spirou. Com a morte recente do argumentista, Janry prossegue com os gags.
Spirou – 5 Entretanto, Émile Bravo desunha-se com a terceira parte da tetralogia L’Espoir Malgré Tout, que temos vindo a acompanhar. O álbum terá 112 páginas. 

… e o Marsupilami Mas o universo de Spirou é inesgotável. Antes de Champignac e Zorglub terem as suas próprias séries, o estranho animal criado por Franquin em 1952 é assegurado por Batem, entre outros. Mas ainda outra dupla, Zidrou e Frank Pé, propõem uma outra leitura, também em curso de publicação autónoma, brinde aos assinantes da revista.