Steve Bannon, o grande estratega da reformulação da extrema-direita enquanto movimento populista, com uma propaganda apoiada em teorias da conspiração e pura desinformação, foi preso e acusado de fraude. No dia seguinte, pagou parte da fiança no valor de 5 milhões de dólares e saiu da prisão ostentando um sorriso largo, com a pele bronzeada, e fez declarações à imprensa antes de desaparecer numa carrinha negra, afirmando que tudo aquilo não passava de um “fiasco”, mais outra conspiração com vista a “travar as pessoas que querem construir o muro”. Este muro é aquele que foi a grande bandeira da campanha eleitoral de Donald Trump, tendo sido Bannon o seu arquitecto, assumindo, depois, o papel de conselheiro do presidente norte-americano na Casa Branca. Ouvido em tribunal, o ideólogo da Alt-Right declarou-se inocente, tendo sido detido por suspeitas de ter embolsado fundos de uma campanha que ele e três dos seus colaboradores mais próximos engenhocaram com vista a recolher fundos de doadores que seriam usados para construir o tal muro – uma barreira física na fronteira com o México que travasse o fluxo de imigrantes que diariamente vai entrando ilegalmente nos EUA.
Este fundo privado, que nasceu de uma campanha lançada em 2018 na plataforma GoFundMe, recolheu cerca de 25 milhões de dólares, e sob o título “We Build The Wall” (Nós Construímos o Muro), o objectivo era garantir que a principal promessa eleitoral de Trump teria fundos para arrancar com esse projecto de construção que, de acordo com a campanha republicana, acabaria por ser assacada aos mexicanos. O que o presidente nunca soube explicar é como é que essa factura seria passada para os contribuintes do país vizinho.
De acordo com os procuradores federais de Nova Iorque, Bannon, em colaboração com um veterano da Força Aérea ferido em guerra e um investidor em capitais de risco da Florida, terão enganado centenas de doadores prometendo que o dinheiro recolhido iria sustentar a construção de novas secções do muro que permanece uma miragem. Dos 25 milhões doados, os procuradores garantem que Bannon usou quase um milhão para cobrir despesas pessoais.
Como refere o “The New York Times”, ainda que Bannon goste de projectar uma aura populista, nunca fez outra coisa senão garantir um estilo de vida cheio de todos os luxos, e até ostentoso, tendo sido detido pouco depois das sete da manhã num iate de 35 milhões de dólares que pertencia a um dos seus parceiros de negócios, o multi-milionário chinês Guo Wenguy, que está em fuga da justiça do seu país. Nas reacções a esta notícia, o nosso candidato presidencial André Ventura não teve qualquer pudor em vir defender o patrão da extrema-direita populista que está a fragilizar o Ocidente face à crescente influência do Oriente, e puxou da carta da paranoia para vir afirmar que a acusação de fraude não passa de mais um exemplo da forma como “o poder consegue instrumentalizar a justiça”. Quanto a Donald Trump, apesar de ter dito que estava “muito triste” com a notícia, não hesitou em virar costas ao seu antigo conselheiro, dizendo que há muitos anos que não mantêm qualquer relação. De resto, afirmou que quando ouviu falar da campanha não lhe pareceu que uma iniciativa privada se devesse meter naquilo que era o trabalho do governo.
Foram também detidos Timothy Shea, 49 anos, Andrew Badolato, 56 anos, e Brian Kolfage, um veterano da Guerra do Iraque de 38 que lançou a campanha online. Bannon, que também foi director executivo do site Breitbart News, o principal órgão de difusão de teorias da conspiração e que, a par da FoxNews, ajudou a galvanizar a extrema-direita norte-americana, está agora impedido de sair das áreas metropolitanas de Nova Iorque e Washington e não pode viajar em barcos ou aviões privados. Bannon é já o sexto conselheiro de Trump que, depois de deixar a Casa Branca, se vê envolvido em problemas com a justiça.