A balcanização das magistraturas: uma estratégia irresponsável e perigosa para a democracia


A justiça e as magistraturas tornaram-se, indesejavelmente, a mais recente reserva de caça para a intriga política menor


As leituras de verão são, habitualmente, mais demoradas e atentas. Se, porventura, não levamos para a praia um bom livro – o que acontece quando temos filhos pequenos ou já netos de que cuidar – contentamo-nos com os habitais jornais diários ou semanários.

Mas, mesmos esses, apesar das vicissitudes da atenção partilhada com a criançada, conseguimos ler de outra maneira: de uma maneira mais atenta e crítica.

Por isso, quando deparamos com notícias e sobretudo comentários que apenas esgravatam a espuma escandalosa dos acontecimentos e deles querem retirar, no essencial, proveitos político-mediáticos fáceis, constatamos, mais clarividentemente, a mesquinhez de tais textos e, no fundo, o seu total desinteresse para a compreensão dos problemas que neles são versados.

Para muitos dos criadores dos textos de tais notícias e comentários – e, principalmente, para muitos daqueles que estão ostensivamente ligados à competição político-partidária – pouco interessa, na realidade, a substância dos factos que noticiam mal e analisam irresponsavelmente.

O que, verdadeiramente, os motiva é levantar a caça, explorando a aparência dos factos, mesmo que para isso tenham de produzir suspeitas – que muitos deles, pela posição institucional que ocupam, sabem improcedentes – e prejudicar terceiros que, verdadeiramente, pouco lhes importam e que, por isso, imolam leviana e cruelmente no altar das pequeninas e exasperantes intrigas palacianas em que se viciaram.

Tal adição sacrifica, as mais das vezes, a própria e reconhecida capacidade política e intelectual de alguns deles, irmanando-os, lamentavelmente, na pequenez dos textos que produzem, aos mais impenitentes e lamentáveis populistas.

Tais práticas e tiques dissolventes costumavam, infelizmente, desenvolver-se e abranger sobretudo quem intervinha no âmbito da ação política partidária: e já não era bonito de se ver.

Mais recentemente, porém, talvez devido à desorientação geral provocada pela pandemia, os autores de alguns de tais textos viraram-se, insidiosa, irrefletida e desagregadoramente, para a área da justiça.

A justiça e as magistraturas tornaram-se, por isso, a mais recente reserva de caça para a intriga política menor e institucionalmente irresponsável.

 Nuns casos, procura-se construir ídolos, que se quer capturar, para exibir, depois, como troféus de luta política.

Noutros, sacrificam-se, indiferentemente, magistrados distintos, com currículos impolutos e acima de qualquer suspeita, se isso for necessário para atacar politicamente o funcionamento das instituições e as opções legítimas e regulares dos seus dirigentes.

A pessoa e a carreira de tais magistrados – de uns e de outros – pouco lhes importa: na verdade não lhes importa nada.

Com a mesma displicência e irresponsabilidade institucional, hoje elogiam uns, amanhã derrotam outros.

Como não ilustram, nem esclarecem, a substância dos factos que embrulham no papel amarrotado em que lhes serviram os recados interesseiros, também não lhes interessa o proveito que, para a justiça, possam ter a experiência e real qualidade científica e técnica dos seus alvos momentâneos e acessórios.

Que alguns desses magistrados – mesmo que muito competentes e, nalguns casos, os mais prestigiados nacional e internacionalmente – possam ficar com a sua autoridade beliscada, ante os cidadãos de cujos processos têm de tratar, não lhes interessa.

Que outros, os heróis de momento, venham a ficar capturados e etiquetados por muito tempo, permanecendo assim, eles também, diminuídos publicamente nos seus atributos de objetividade e independência, também não lhes importa: eles são apenas, como os primeiros, um instrumento transitório e descartável.

Que, deste modo, as magistraturas fiquem perigosamente balcanizadas, expostas à suspeita pública e com a imagem manchada, também não os afeta.

Desconfio, até, que julgam poder-lhes ser vantajoso.

Importante é, por isso, que os próprios magistrados, não caiam na tentação de incentivar e, porventura, aproveitar, circunstancial e incautamente, esse jogo perigoso.

É, pois, fundamental que todos tomem conhecimento da instrumentalização de que alguns estão a ser alvo e dos seus propósitos.

Se disso não tomarem consciência e, como certos deles, continuarem a incitar e pactuar com quem assim procede, não só se fragilizam profissionalmente, como, antes do mais, contribuem para o desprestígio do estado de direito e da democracia, abrindo caminho aos populistas que existem em todos os lados e contextos.

E aí, sim, a instrumentalização da justiça e das magistraturas será descarada, porque politicamente assumida e desejada.    

 

  

 

    

A balcanização das magistraturas: uma estratégia irresponsável e perigosa para a democracia


A justiça e as magistraturas tornaram-se, indesejavelmente, a mais recente reserva de caça para a intriga política menor


As leituras de verão são, habitualmente, mais demoradas e atentas. Se, porventura, não levamos para a praia um bom livro – o que acontece quando temos filhos pequenos ou já netos de que cuidar – contentamo-nos com os habitais jornais diários ou semanários.

Mas, mesmos esses, apesar das vicissitudes da atenção partilhada com a criançada, conseguimos ler de outra maneira: de uma maneira mais atenta e crítica.

Por isso, quando deparamos com notícias e sobretudo comentários que apenas esgravatam a espuma escandalosa dos acontecimentos e deles querem retirar, no essencial, proveitos político-mediáticos fáceis, constatamos, mais clarividentemente, a mesquinhez de tais textos e, no fundo, o seu total desinteresse para a compreensão dos problemas que neles são versados.

Para muitos dos criadores dos textos de tais notícias e comentários – e, principalmente, para muitos daqueles que estão ostensivamente ligados à competição político-partidária – pouco interessa, na realidade, a substância dos factos que noticiam mal e analisam irresponsavelmente.

O que, verdadeiramente, os motiva é levantar a caça, explorando a aparência dos factos, mesmo que para isso tenham de produzir suspeitas – que muitos deles, pela posição institucional que ocupam, sabem improcedentes – e prejudicar terceiros que, verdadeiramente, pouco lhes importam e que, por isso, imolam leviana e cruelmente no altar das pequeninas e exasperantes intrigas palacianas em que se viciaram.

Tal adição sacrifica, as mais das vezes, a própria e reconhecida capacidade política e intelectual de alguns deles, irmanando-os, lamentavelmente, na pequenez dos textos que produzem, aos mais impenitentes e lamentáveis populistas.

Tais práticas e tiques dissolventes costumavam, infelizmente, desenvolver-se e abranger sobretudo quem intervinha no âmbito da ação política partidária: e já não era bonito de se ver.

Mais recentemente, porém, talvez devido à desorientação geral provocada pela pandemia, os autores de alguns de tais textos viraram-se, insidiosa, irrefletida e desagregadoramente, para a área da justiça.

A justiça e as magistraturas tornaram-se, por isso, a mais recente reserva de caça para a intriga política menor e institucionalmente irresponsável.

 Nuns casos, procura-se construir ídolos, que se quer capturar, para exibir, depois, como troféus de luta política.

Noutros, sacrificam-se, indiferentemente, magistrados distintos, com currículos impolutos e acima de qualquer suspeita, se isso for necessário para atacar politicamente o funcionamento das instituições e as opções legítimas e regulares dos seus dirigentes.

A pessoa e a carreira de tais magistrados – de uns e de outros – pouco lhes importa: na verdade não lhes importa nada.

Com a mesma displicência e irresponsabilidade institucional, hoje elogiam uns, amanhã derrotam outros.

Como não ilustram, nem esclarecem, a substância dos factos que embrulham no papel amarrotado em que lhes serviram os recados interesseiros, também não lhes interessa o proveito que, para a justiça, possam ter a experiência e real qualidade científica e técnica dos seus alvos momentâneos e acessórios.

Que alguns desses magistrados – mesmo que muito competentes e, nalguns casos, os mais prestigiados nacional e internacionalmente – possam ficar com a sua autoridade beliscada, ante os cidadãos de cujos processos têm de tratar, não lhes interessa.

Que outros, os heróis de momento, venham a ficar capturados e etiquetados por muito tempo, permanecendo assim, eles também, diminuídos publicamente nos seus atributos de objetividade e independência, também não lhes importa: eles são apenas, como os primeiros, um instrumento transitório e descartável.

Que, deste modo, as magistraturas fiquem perigosamente balcanizadas, expostas à suspeita pública e com a imagem manchada, também não os afeta.

Desconfio, até, que julgam poder-lhes ser vantajoso.

Importante é, por isso, que os próprios magistrados, não caiam na tentação de incentivar e, porventura, aproveitar, circunstancial e incautamente, esse jogo perigoso.

É, pois, fundamental que todos tomem conhecimento da instrumentalização de que alguns estão a ser alvo e dos seus propósitos.

Se disso não tomarem consciência e, como certos deles, continuarem a incitar e pactuar com quem assim procede, não só se fragilizam profissionalmente, como, antes do mais, contribuem para o desprestígio do estado de direito e da democracia, abrindo caminho aos populistas que existem em todos os lados e contextos.

E aí, sim, a instrumentalização da justiça e das magistraturas será descarada, porque politicamente assumida e desejada.