ANA não gostou de ficar responsável pelos testes nos aeroportos e lei tarda a ser cumprida

ANA não gostou de ficar responsável pelos testes nos aeroportos e lei tarda a ser cumprida


A empresa que gere os aeroportos considera “inconcebível” ser obrigada a prestar serviços de saúde pública e pagar despesas com os testes. Contratação de laboratório não foi feita e INEM continua no terreno.


A evolução da pandemia levou o Governo a aumentar o controlo e as restrições nos aeroportos geridos pela ANA – como Lisboa, Porto e Faro –, mas o despacho que definiu as novas regras para os passageiros sem residência no país e oriundos de Brasil, Estados Unidos e países africanos de língua oficial portuguesa (PALOP) está a gerar controvérsia: o facto de ter sido atribuída à ANA a responsabilidade de realizar os testes provocou surpresa e insatisfação no seio da empresa – concessionada ao grupo francês Vinci em 2012, por um período de 50 anos –, dificultando a aplicação da lei.

Estes passageiros não podem entrar em Portugal sem que antes comprovem não estarem infetados com a covid-19, através de um teste negativo realizado nas últimas 72 horas. Quem não cumprir este requisito (ou apresentar sintomas de febre) fica obrigado a realizar um teste molecular RT-PCR – vulgo teste com zaragatoa – no aeroporto, antes de poder pisar território nacional. O passageiro fica responsável por pagá-lo. 

A ANA considera, porém, não estar vocacionada para prestar serviços de saúde pública nem ser justo ficar com os encargos logísticos e financeiros de subcontratar um laboratório privado para cumprir esta tarefa. Fonte ligada à empresa disse ao i que “é inconcebível que a ANA seja obrigada a pagar todas as despesas com os testes” e critica “a falta de aviso prévio e de tempo dado pelo Governo para que se aplicassem as medidas” em apenas quatro dias (até quarta-feira, dia 8). Ao i, a fonte alerta ainda para desigualdades, pois as novas regras não incluem os aeródromos portugueses: “Como se sabe, muitos magnatas escolhem os aeródromos para chegar a Portugal, para fugirem a estas restrições”, refere.

A verdade é que, passada uma semana após a publicação em Diário da República (na segunda-feira, dia 6), o despacho continua por cumprir. A ANA ainda não subcontratou nenhum laboratório privado e é o Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM) que permanece no terreno, assegurando que os testes não ficam por fazer, mas às expensas do Estado português e não dos passageiros, como está previsto na lei. 

Ao i, a ANA confirma oficialmente que “está a tratar do processo de contratação de equipas médicas, o que, naturalmente, tratando-se de prestação de saúde pública, exige por parte de um gestor de infraestruturas alguma preparação. Prevê-se que o INEM possa retirar-se em breve e que essas equipas passem a prestar esse serviço”. “O procedimento de contratação de equipas médicas está a ser realizado, prevendo-se estar concluído em breve”, acrescenta.

Questionada sobre o facto de os passageiros não estarem, para já, a pagar os testes, tal como está previsto no despacho, a entidade refere apenas que “conforme despacho governamental, o passageiro custeará o teste” no momento em que o laboratório médico subcontratado substituir o INEM nesta função. Contactada pelo i, a DGS não respondeu a quaisquer questões sobre este assunto.

Multas às companhias pagam
À ana Embora este processo represente custos para a ANA, o Governo definiu um expediente que procura compensar a empresa através das coimas aplicadas às companhias aéreas que permitam o embarque de passageiros sem teste negativo para a covid-19.

O despacho indica que “as companhias que violarem a proibição de não embarcarem passageiros que não sejam portugueses ou residentes em Portugal sem testes com resultados negativos serão objeto de coima (…) no valor de mil euros por passageiro”. “O produto das multas será consignado ao ressarcimento dos custos em que a ANA vier a incorrer com a realização dos testes à chegada e do controlo de temperatura”. Para receber esta verba, a ANA tem de apresentar mensalmente os respetivos custos à Autoridade Nacional da Aviação Civil (ANAC), que efetuará o pagamento no prazo de 15 dias, com base nas multas aplicadas.

Outra questão que tem levantado dúvidas diz respeito ao controlo dos passageiros depois de realizados os testes nos aeroportos. O despacho indica que “podem sair do aeroporto depois de disponibilizarem os dados de contacto e permanecerão confinados nos seus destinos de residência até receberem os resultados negativos do teste”, mas não esclarece quais as medidas adicionais e de controlo que permitem assegurar que estes passageiros não contactam com pessoas ou permanecem em locais públicos – seja nos transportes ou hotéis, por exemplo – a partir do momento em que entram em Portugal.

Também não se esclarece que medidas serão tomadas na identificação dos restantes passageiros e tripulação dos voos perante um caso positivo. A DGS não respondeu a estas questões colocadas pelo i.

Cascais assegura testes
Apesar de fonte da ANA alertar para a entrada no país de voos provenientes de Brasil, Estados Unidos e PALOP pelos aeródromos nacionais, o Aeródromo Municipal de Cascais (também conhecido como Aeroporto de Cascais), que recebe os voos não regulares privados internacionais em Portugal, tem aplicado as mesmas regras impostas pelo Governo aos aeroportos da ANA, por decisão da Câmara de Cascais e da Cascais Dinâmica, empresa municipal que gere o equipamento.

Contactado pelo i, o Aeródromo Municipal de Cascais indica que na última semana “houve apenas dois voos desta categoria”. E confirma que no caso de os passageiros não terem testes válidos à chegada “terão de permanecer na aeronave até que chegue uma entidade certificada para o efeito que faça o teste, e só após confirmado o resultado oficial poderão abandonar a aeronave e prosseguir o trajeto normal”. “O Aeroporto de Cascais tem um protocolo com um laboratório por forma a agilizar esta situação, que no caso da aviação executiva, e de acordo com o procedimento que temos, não se espera acontecer, pois o voo é autorizado após o envio de comprovativo de testes dos passageiros”, explica.

Localizado em Tires, o aeroporto de Cascais é o quarto do país com maior movimento (depois de Lisboa, Porto e Faro), segundo dados do município. O seu plano de contingência respeita as recomendações da DGS para colaboradores, tripulantes e passageiros, com a medição da temperatura a ser assegurada pelas forças de segurança no local (Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, PSP e GNR). Os casos suspeitos são isolados – existem no aeródromo duas zonas de isolamento definidas para esse efeito – e os agentes informam o serviço de operações aeroportuárias (SOA) que, por sua vez, contacta o Serviço Nacional de Saúde. É chamada ao local uma equipa médica que, a partir desse momento, fica responsável pela condição física dos passageiros.

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