A extrema-esquerda saiu à rua


O facto de não surgir nos meios de comunicação a qualificação destes atos como sendo da responsabilidade de movimentos da extrema-esquerda não é esquecimento ou omissão. É intencional e revela parcialidade.


“Manifestantes de extrema-direita cercaram o local onde está guardada a estátua de Winston Churchill, em Londres. A sua intenção é reagir contra as manifestações antirracismo. Os manifestantes de extrema-direita exigem que as estátuas e os monumentos de figuras históricas inglesas sejam preservados e defendidos das investidas de manifestantes antirracismo”. Para além destas palavras, outras, em tom semelhante e com a mesma qualificação e adjetivação, saíram da boca do pivô de um serviço noticioso de um dos três principais canais de televisão do nosso país, no passado fim de semana.

Poderão interrogar-se onde está a novidade nesta notícia/informação. Não há novidade nenhuma. Todavia, o seu conteúdo é enviesado ao fazer referência a manifestações antirracismo e a manifestações de extrema-direita – subtil mas eficaz, para induzir o telespetador a identificar-se com as manifestações espontâneas e transversais na sua composição e a distanciar-se dos manifestantes de extrema-direita, que se terão organizado partidariamente.

Em bom rigor e com a imparcialidade que esta análise impõe, isenta de ideologia, não devemos deixar de sinalizar o “politicamente correto” da informação política nacional, mas também das agências noticiosas europeias e, diria mais, dos agentes noticiosos ocidentais.

Qualificar, sim, o que são os movimentos de extrema-direita, não “poupando” a adjetivação nos movimentos de extrema-esquerda, revestindo estes últimos de uma isenção ideológica que não se verifica. Ou será que destruir, sujar e agredir estátuas de figuras que fazem parte do património histórico e cultural das nações e até da humanidade, de forma grotesca, terrorista, anárquica, pejada de ignorância histórica, não são atos extremistas – neste caso, em particular – de esquerda?

Por que razão o nosso jornalismo continua tão parcimonioso na qualificação e no pensamento ideológico somente num sentido, dando largas à crítica e censura social no sentido inverso?

Sendo eu, acima de tudo, humanista, com formação católica, só me ocorre condenar e repudiar veementemente todos os atos extremistas, tenham eles a origem que tiverem, sejam de esquerda ou de direita. Não concebo qualquer tipo de discriminação, seja de género, étnica, etária, racial, de orientação sexual, por incapacidade física ou mesmo de aparência. Nem os tolos me merecem discriminação…

O facto de não surgir nos meios de comunicação a qualificação destes atos como sendo da responsabilidade de movimentos da extrema-esquerda não é esquecimento ou omissão. É mais grave, porque é deliberado, intencional e revela uma parcialidade por parte dos jornalistas que veiculam a notícia. Sempre que a extrema-direita se envolve, a extrema-esquerda também está lá. Não haja dúvidas quanto a isso!

O que se passou com a memória edificada de Churchill, o grande responsável pela derrota do nacional-socialismo e do nazismo, e com Padre António Vieira, um clérigo progressista que assentava a evangelização nos ideais humanistas, durante o período colonial português, foram atos de terrorismo e desumanos. Querer preservar a memória de tão ilustres personagens é um direito de todos nós e que foi sufragado nos órgãos municipais, em plena democracia.

Lamentavelmente, constatamos que o racionalismo, induzido pela emoção fácil, destes atos responde com muitas limitações e enviesamentos. Ao analisarem Churchill e o Padre António Vieira, os perpetradores decompuseram a atuação dos indivíduos-alvo em pequenas partes e desvalorizaram o contexto das suas ações, bem como o impacto que tiveram até aos dias de hoje, numa linha de continuidade. Fazer um zoom sobre alguém ou algo pode oferecer uma narrativa desadequada e injusta, como é aqui o caso, fundamentando à superfície o que não tem razão de ser quando observado com profundidade.

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