Vagina Museum. Sem vergonha nem ofensa

Vagina Museum. Sem vergonha nem ofensa


Depois de ter reunido 50 mil libras numa campanha de crowdfunding, Florence Schetcher abriu em Londres o primeiro museu do mundo dedicado à vagina, “uma parte do corpo que deve ser celebrada”.


Vagina: do latim vagina, -ae, que significava “bainha, invólucro”, substantivo feminino que designa o “canal que conduz ao colo do útero e que se abre na vulva”. Vulva: também do latim vulva, -ae, designação para o “conjunto das partes genitais externas da mulher e das fêmeas de alguns outros animais”. Segundo dados recolhidos pela associação britânica Eve Appeal, “65% das mulheres entre os 16 e os 25 anos dizem ter um problema com a utilização das palavras vagina ou vulva”. Os números são recuperados pela vereadora de Camden Georgia Gould a propósito da abertura do mais recente museu do bairro londrino: o Vagina Museum, inaugurado no sábado com uma primeira exposição de entrada livre: Muff Busters: Vagina Myths and How To Fight Them (os mitos da vagina e como combatê-los).

A ideia deste novo museu começou a germinar na cabeça de Florence Schechter, diretora do Vagina Museum, quando descobriu que, apesar de na Islândia existir um museu dedicado ao órgão reprodutor masculino, não havia um equivalente para a vagina em nenhuma parte do mundo. Assim deu início, já em março de 2017, a um projeto pop-up que, em colaboração com várias instituições, foi o responsável pelas exposições Exhibitionist (2017), Is Your Vagina Normal? (2018) e Museum of Mankind (2019). Agora, e depois de uma campanha de crowdfunding que reuniu 50 mil libras (58 mil euros) para a abertura de um espaço de museu para o projeto, o Vagina Museum abriu finalmente portas no Camden Market, em Londres.

A localização daquele que, exceção para um museu online austríaco fundado em 2014 (também chamado Vagina Museum), é afinal o primeiro museu do mundo dedicado aos órgãos genitais e reprodutores femininos, não é irrelevante. “Camden tem uma história de orgulho e radical no desafiar de preconceitos e a ortodoxia”, nota a vereadora Georgia Gould, que acredita que este novo museu funcionará como “um centro inclusivo e interseccional para o conhecimento, a criatividade, o ativismo e um trabalho de divulgação que acrescentará imenso ao entendimento coletivo” do corpo da mulher.

Esse mesmo sinal vem dar a inaugural Muff Busters: Vagina Myths and How To Fight Them. “Metade da população mundial tem uma, mas os mitos e o secretismo continuam a rodear a vagina, pelo que a diretora Florence Schechter decidiu fazer algo em relação a isso”. A exposição promete desvendar “os verdadeiros factos que as aulas de biologia não têm sido capazes de ensinar” relacionados com a anatomia ginecológica, a contraceção ou mesmo questões de higiene pessoal.

“O museu é uma forma fantástica de espalhar a mensagem de que não há nada de vergonhoso ou ofensivo com as vaginas e as vulvas”, diz Florence Schechter no comunicado à imprensa com que apresenta o Vagina Museum. “Esta é uma parte do corpo que deve ser celebrada”. Orientando-se a partir de quatro palavras de ordem – “respeito, integridade, empoderamento, inclusão”–, o Vagina Museum propõe-se contribuir para o quebrar do estigma em torno da vagina – qualquer vagina.

“Como pessoa trans, sei como o mundo é obcecado pela minha neovagina, mas também quão pouco o mundo sabe sobre a minha neovagina, o que significa uma intrusão sem segurança ou prazer empoderado”, afirma a escritora e ativista trans Juno Roche num pequeno texto a propósito da criação do novo museu. “Quando mais celebrarmos todas as vaginas, mais sexo e positividade em relação ao corpo e segurança estamos a criar. Apoio o Museu da Vagina porque qual é a vagina ou neovagina que não merece um pedestal?”

Para o caminho da diversidade e da inclusão aponta também a ilustração com que Charlotte Willcox representa 14 vulvas, escolhida para anunciar na página do museu uma exposição que conta com tampões gigantes ou reproduções em grande escala do órgão que continua a ser tabu. Para lá desta e das exposições que vier a acolher no futuro, o Vagina Museum conta com uma programação de eventos que inclui festas, conversas, quizzes, workshops, leituras mensais de poesia e ensaios feministas (Cliterature: the Vagina Museum Book Club) e espetáculos. Dia 30, por exemplo, são apresentados, em double bill, Hole e Fat Sex, dois espetáculos a solo unidos pelo tema da aceitação do corpo.

A isto acresce uma loja (também disponível online) onde, a postais e marcadores de livros com ilustrações como esta de Charlotte Willcox, imagens de protestos ou statements pró-vagina, se soma também uma seleção de livros como Period Power, de Maisie Hill, ou I Know Why the Caged Bird Sings, de Maya Angelou, ambos esgotados. Como, de resto, os “pussy pendants” para carregar ao pescoço, da autoria da artista Denise Rosenboom. Enquanto o stock não é reposto, sobram os padrões para a reprodução de clitóris em croché. Mas de um clitóris inteiro, com direito a explicação: “Sabia que o clitóris é muito maior do que a glande? É a ponta do icebergue que se estende internamente e pode ser muito grande”.