SNS. Pagamentos  em atraso aumentaram  100 milhões  em dois meses

SNS. Pagamentos em atraso aumentaram 100 milhões em dois meses


Governo diz que dívidas estão perto dos mínimos e garante verbas para pagamentos extraordinários. Economista vê semelhanças com 2015.


Os hospitais continuam a fugir à regra da diminuição dos pagamentos em atraso no Estado, indicador que diz respeito às faturas por liquidar há mais de 90 dias. Se nos primeiros meses do ano houve uma diminuição destas dívidas vencidas nos hospitais, em abril e maio tornaram a aumentar.

Segundo os dados divulgados na última síntese de execução orçamental, publicada na sexta-feira, em maio os hospitais do SNS registavam pagamentos em atraso no valor de 626,5 milhões de euros. Trata-se de um aumento na casa dos 100 milhões de euros face a março, quando os pagamentos em atraso somavam 519 milhões de euros. O aumento foi de 69 milhões de março para abril e de 39 milhões de euros de abril para maio.

Num comunicado emitido na sexta-feira, o Governo sublinhou as medidas de reforço financeiro que estão em curso no SNS para liquidação de dívidas. O comunicado, dos ministérios da Saúde e Finanças, informa que o Governo injetou, de forma extraordinária, 152 milhões de euros nos hospitais no âmbito do reforço global de 445 milhões de euros previsto para este ano. “Este reforço melhora as condições financeiras do SNS, com o objetivo de cumprir a sua missão e contribui para uma redução adicional dos pagamentos em atraso (que se encontram já próximo dos mínimos históricos)”, lê-se no comunicado.

O Governo informou também que concluiu o plano de liquidação de pagamentos em atraso que permite que, a partir de agora, 855 milhões de dívida relativa a 2018 deixem de onerar o orçamento de 2019 do SNS. Em causa está o despacho publicado no fim de maio que aprovou os planos de liquidação dívidas por parte dos hospitais, planeando pagamentos até 2020. É do bolo de 538 milhões de euros em dívida a fornecedores externos no final de 2018 que serão pagos 445 milhões este ano, clarificou uma nota divulgada há um mês pela tutela.

 

Trajetória de ano eleitoral

Que leitura fazer da evolução dos últimos meses? O economista da saúde Pedro Pita Barros, que monitoriza mensalmente as dívidas hospitalares, diz que a análise dos últimos seis meses, no seu conjunto, revela sinais de abrandamento na acumulação de dívidas, mas vê alguns riscos a prazo. E ajuda também a pôr em perspetiva a questão dos mínimos históricos. “É uma boa notícia, sobretudo quando se compara com os ritmos de crescimento [dos pagamentos em atraso] entre janeiro de 2017 e fevereiro de 2018. De setembro de 2015 a novembro de 2016, o ritmo de crescimento nesse período foi essencialmente similar ao registado desde dezembro de 2018 até maio de 2019. Ou seja, a melhoria é por confronto com o passado recente, mas não é um valor anormalmente baixo. O principal risco, neste momento, é que, tal como em 2015, o aproximar das eleições se traduza numa menor capacidade/interesse em manter sob controle o crescimento dos pagamentos em atraso”, diz o economista da Universidade Nova de Lisboa.

Pita Barros explica que o valor mais baixo de pagamentos em atraso nos hospitais se verificou em setembro de 2015, quando rondaram 436 milhões de euros. O “pior período” verificou-se entre o final de 2017 e o início de 2018, em que os pagamentos em atraso cresceram em média 93 milhões de euros por mês.

O ciclo persiste: a acumulação de pagamentos em atraso seguida de injeção extraordinárias de verbas para liquidar dívidas, o que o economista admite que pode não contribuir para uma maior eficiência da gestão.

A regularização de pagamentos em atraso foi uma das exigências da troika: em 2011, quando começou o programa de ajustamento, a dívida dos hospitais públicos ultrapassava os 3 mil milhões de euros (um terço do orçamento anual da Saúde) dos quais 1,8 mil milhões eram pagamentos em atraso. A lei dos compromissos, que implicava não fazer despesa que não tivesse base orçamental, acabou por nunca ser cumprida em pleno na Saúde. Ao longo da legislatura seriam adjudicados aos hospitais cerca de 2 mil milhões de euros para a liquidação de dívidas. No ano passado, o Governo anunciou 500 milhões para a liquidação de pagamentos em atraso, a que se seguiu este último plano.

Estas injeções de verbas são uma boa medida para calcular o subfinanciamento do SNS? Pita Barros admite que a componente de subfinanciamento deve ser hoje “importante”, mas não se arrisca nos cálculos – as ordens já defenderam que existe um défice anual de 1,2 mil milhões de euros nas transferências do OE para a saúde. “Em rigor deveria ser calculado o financiamento adequado (eficiente) ao que é pedido em termos assistenciais aos hospitais e ver a diferença face ao orçamento realmente atribuído. Como é provável que o próprio subfinanciamento gere ineficiência nas decisões de gestão, ter-se-ia que encontrar uma metodologia que procedesse à separação das duas componentes, subfinanciamento e ineficiência”, diz.