Verdade ou consequência


Se acreditarmos em tudo o que Carlos Costa afirmou, temos pelo menos de fazer mais uma pergunta: o que andou por lá a fazer este gestor?


“Quando se apanha um mentiroso, ele pode perguntar-nos: e o que é verdade? E o mais provável é termos de o deixar seguir’’.

Vergílio Ferreira

 

Quem não conhece este jogo, tão divertido quanto embaraçoso, em que cada um dos participantes tem de responder a perguntas inconvenientes, optando por um castigo imposto por outro participante, se decidir não responder?

Chama-se “Verdade ou Consequência” e devia ser aplicado com todas as regras na nossa vida quotidiana.

Quem não gostaria de o jogar com alguns políticos ou gestores bancários, por exemplo?

Na passada terça-feira, segui com atenção a entrevista que o jornalista José Gomes Ferreira fez, na SIC, ao governador do Banco de Portugal, Carlos Costa e concluí que, afinal, o gestor andou todos estes anos a passar pelos pingos da chuva, no que respeita a créditos desastrosos praticados por algumas das instituições bancárias por onde passou, sendo a Caixa Geral de Depósitos o exemplo mais chocante.

Se acreditarmos em tudo o que Carlos Costa afirmou, temos pelo menos de fazer mais uma pergunta: o que andou por lá a fazer este gestor?

Certamente previu sempre onde podiam estar os problemas e conseguiu escapar a todas as reuniões – 25 no total – onde se aprovaram créditos que se revelaram ruinosos para a instituição bancária pública. Na prática, “fez-se de morto”.

Aliás, uma receita que vem dos tempos da “outra senhora” e que continua a fazer escola.

Lembrei-me, a propósito, de uma passagem do livro “Estação das chuvas”, de José Eduardo Agualusa, em que uma avó explica ao seu neto a razão da sua sobrevivência numa cidade em guerra:

– “Eu sou como o capim, não dou fruto, nem faço sombra. E nesta terra isso é uma coisa boa. Ninguém repara em nós!”.

O problema, regressando à nossa atualidade, é quando estes “mortos” ressuscitam.

Quando saem de uma espécie de hibernação e assumem cargos onde já não é possível esconderem-se.

No caso de Carlos Costa, no cargo de governador do Banco de Portugal, compete agora às entidades competentes ditarem a “consequência”, caso não aceitem a sua verdade ou ele próprio opte por não a revelar.

Como escreveu Galileu, “todas as verdades são fáceis de perceber depois de terem sido descobertas. O problema é descobri-las”.

 

Jornalista