Lisboa. Prédios devolutos de Picoas deverão ser um hotel assinado por Souto Moura

Lisboa. Prédios devolutos de Picoas deverão ser um hotel assinado por Souto Moura


Documentos mostram que edifício será um novo hotel do grupo SANA. Gabinete de Souto Moura confirma autoria do projeto. Já a autarquia não se pronunciou


Os famosos edifícios devolutos da Avenida Fontes Pereira de Melo, em Lisboa, adornados por uma intervenção dos street artists Os Gêmeos, Blu & Sam3, vão ser ocupados por um hotel do grupo SANA. O i consultou o registo predial para perceber a quem pertencem os três os edifícios – à Azipalace – Investimentos Turísticos, S. A. – e teve conhecimento de um despacho da Secretária de Estado do Turismo, Ana Mendes Godinho, emitido a 15 de dezembro de 2017, que atribuiu uma licença prévia de utilidade turística a um hotel denominado SANA Palace, requerida pela mesma sociedade.

Segundo o despacho, o hotel tem “categoria projetada de 5 estrelas”, mas o diploma não menciona a localização do projeto, dando apenas conta de que irá ser instalado “no concelho de Lisboa”. Questionado pelo i, o gabinete da Secretária de Estado do Turismo confirmou que o despacho diz respeito ao hotel a instalar nos três edifícios devolutos em Picoas – os “números 18 a 28 da Av. Fontes Pereira de Melo, em Lisboa”, informa a fonte.

Em entrevista ao SOL, o antigo vereador da Mobilidade da CML, Fernando Nunes da Silva, ao falar do arquiteto Eduardo Souto Moura, disse não considerar “aceitável que [Souto Moura] esteja a impedir a reabilitação do quarteirão inteiro que ainda subsiste do século XIX/XX na Fontes Pereira de Melo, que tem os graffiti bonitos”. “Os proprietários entregaram [o projeto] ao Souto Moura e ele disse que não é decorador de interiores e não quer respeitar as fachadas e quer deitar abaixo para fazer de novo. Só que o Plano Diretor Municipal não permite e então está-se à espera que aquilo caia”, denunciou.

O i contactou o ateliê do arquiteto para saber se o proprietário dos edifícios tinha, de facto, entregado o projeto a Souto Moura. Fonte do ateliê confirmou a informação, especificando tratar-se “dos 3 edifícios existentes”. Questionado, depois, sobre se o projeto do arquiteto irá manter as fachadas e se existe previsão quanto ao arranque das obras, o gabinete de arquitetura não respondeu. Silêncio foi igualmente a postura adotada pelo grupo SANA, ao qual o i remeteu as mesmas perguntas.

À procura de mais informação, o i contactou então a Câmara Municipal de Lisboa (CML) para perceber se a autarquia tinha conhecimento do projeto do arquiteto Souto Moura para os edifícios, mas sem sucesso. Fonte do gabinete da Secretária de Estado do Turismo explicou, no entanto, que o projeto arquitetónico passa apenas pela CML, que “licencia todas as obras”, sublinhado que a Secretária de Estado do Turismo tem à sua responsabilidade apenas a atribuição da licença de utilidade turística.

A licença atribuída ao futuro hotel SANA Palace, de resto, é a título prévio – um licenciamento que, de acordo com o decreto-lei que define utilidade turística, é “atribuído antes da entrada em funcionamento dos empreendimentos novos […]”. Por sua vez, no despacho que concede o licenciamento ao empreendimento turístico, lê-se que “a validade da utilidade turística prévia” do hotel é de 36 meses. Por isso, até ao final desse período, a lei determina que as obras sejam finalizadas e o hotel seja aberto ao público, momento em que é então possível fazer o pedido de atribuição de utilidade turística a título definitivo. Contudo, o requerente da licença prévia pode pedir a prorrogação do prazo dos 36 meses por igual período. Por isso, contas feitas, o novo hotel de Picoas está ainda num horizonte longínquo.

GRUPO SANA, AZINOR E AZIPALACE A proximidade das datas do registo predial do novo hotel e do despacho relativo à licença prévia levantam algumas dúvidas: o despacho foi emitido cerca de duas semanas antes do registo da aquisição dos edifícios na Conservatória do Registo Predial pela Azipalace – Investimentos Turísticos, S. A., a 28 de dezembro, data que pode não coincidir com a data em que a transação foi feita. Por isso, o i consultou a escritura e concluiu que a venda – no valor de 24 milhões de euros – ocorreu a 21 de dezembro de 2017, três meses depois de o pedido de utilidade turística ter sido submetido, como esclarece fonte do gabinete da Secretária de Estado do Turismo: “foi apresentado um pedido de utilidade turística ao Turismo de Portugal, através do SiGUT (sistema de Gestão da Utilidade Turística) em 18 de setembro de 2017 e foi registado no dia 19 de setembro de 2017”.

Ora, como se lê na escritura, os edifícios foram comprados pela Azipalace – Investimentos Turísticos, S. A. à Azinor Imobiliária, Lda. – que detém grupo SANA em Portugal – e ambas as empresas têm a mesma sede. O i contactou então a Azinor para esclarecer se o grupo detém a sociedade Azipalace. Fonte do gabinete de media explicou que a Azinor detém o grupo SANA em Portugal, enquanto a Azipalace – Investimentos Turísticos, S. A., que pertence à Azinor, trata apenas do novo hotel que abrirá portas em data ainda não conhecida.