Como sobreviver à idade dos porquês


Dizem que o pico é aos quatro anos e chegam a fazer quase 100 perguntas por dia. Responder “porque sim” é uma armadilha


Dedo em riste, ar inquisidor e vamos lá: “Mãe, porque é que a senhora tem a cara às riscas?” No meio da sala de espera, com a senhora velhinha a olhar para nós, a tentação foi baixar-lhe o dedo e desviar a conversa, mas não havia maneira de a pergunta ir embora. “É velhinha”, respondo. “Mas porque é que tem a cara às riscas?” Rugas, colagénio… sei lá. Foi a primeira vez que me apercebi de que tinha chegado a famosa idade dos porquês e que nem sempre ia ser fácil. Desde então, estamos nisto: de manhã à noite, do mais básico ao mais complexo, tudo é questionável. Porque é que estás a dormir? Porque é que não estás a dormir? Porque é que a mana não anda, não fala, não come iogurte? Porque é que a goiabada é pegajosa? (oi?) Porque é que os cães não usam fralda? (Esta foi quando estávamos a desviar–nos dos “presentes” no passeio… e se calhar não era má ideia.)

É o cérebro deles a desenvolver-se e tem tanto de delicioso como de irritante – o estado de espírito vai depender da hora do dia e do grau de bombardeamento. A primeira coisa que descobrimos é que responder “porque sim” é uma armadilha: não se contentam e depressa passam a dominar o “porque sim, porquê?”, que já começa a ser tramado de responder e nos faz sentir que não estamos a ser criativos e estimulantes o suficiente enquanto pais – dramas da paternidade moderna. No que toca a respostas preguiçosas, já percebi que dizer “não sei”, mesmo quando sabemos, é mais eficaz – dá menos troco. Mas isso não é necessariamente bom: o cérebro deles enche-se de compaixão para com o pai ou a mãe que não sabe… e quem é que quer ser um pai ou uma mãe que não sabe? Facilmente ficamos com sentimentos de culpa – afinal, a goiabada é pegajosa por causa do açúcar (mesmo que isso signifique mais perguntas) e os cães não usam fralda porque ia ser caro e produzir lixo que nunca mais acabava, e porque são cães.

Outra coisa que também parece funcionar é dar respostas muito elaboradas ou sem sentido: para nós é divertido e eles fartam-se ou distraem-se com a maluqueira, mas não sei se os especialistas o aconselharão. A realidade é esta: isto da idade dos porquês parece ser algo estruturante e nós seguimos o instinto, esperamos estar a fazer o melhor para que eles vão apreendendo o mundo e para que essa curiosidade que não deixa passar nada nunca se perca. Portanto, aos pais que estão no mesmo barco, muita pachorra, que suponho que um dia tudo isto passa e o mais provável é ficarmos cheios de saudades.

Entretanto, eis o que nos espera. Uma sondagem junto de 1500 pais, divulgada no final do ano passado no Reino Unido, concluiu que, em média, os miúdos fazem 73 perguntas por dia e o pico chega aos quatro anos – de pergunta em pergunta, a minha vai alegremente a caminho dos três e não me vou pôr a contar perguntas porque senão, entre responder e contar, não fazia mais nada. Segundo o mesmo estudo, os pais têm dificuldade em responder a metade das inquirições e às vezes têm de ir pesquisar – portanto, quando não soubermos responder sobre a física das bolas de sabão e coisas deste género, é pensar que não estamos sozinhos e aproveitar para aprender qualquer coisa. Outra conclusão engraçada é que os pais respondem a mais perguntas do que as mães – estatística que vou passar a usar a meu favor com um fundamentado “o teu pai responde”. E estas foram dez perguntas que os pais ingleses disseram ter dificuldades em responder, caso haja por aí quem queira preparar-se com antecedência.

• Porque é que as pessoas morrem?

• De onde viemos?

• O que é Deus?

• Como fui feito?

• Porque é que não temos dinheiro para comprar isto?

• O Pai Natal existe?

• Porque é que tenho de ir à escola?

• Quando morreres, com quem é que vou viver?

• Porque é que o céu é azul?

Sou mais apologista do carpe diem


Como sobreviver à idade dos porquês


Dizem que o pico é aos quatro anos e chegam a fazer quase 100 perguntas por dia. Responder “porque sim” é uma armadilha


Dedo em riste, ar inquisidor e vamos lá: “Mãe, porque é que a senhora tem a cara às riscas?” No meio da sala de espera, com a senhora velhinha a olhar para nós, a tentação foi baixar-lhe o dedo e desviar a conversa, mas não havia maneira de a pergunta ir embora. “É velhinha”, respondo. “Mas porque é que tem a cara às riscas?” Rugas, colagénio… sei lá. Foi a primeira vez que me apercebi de que tinha chegado a famosa idade dos porquês e que nem sempre ia ser fácil. Desde então, estamos nisto: de manhã à noite, do mais básico ao mais complexo, tudo é questionável. Porque é que estás a dormir? Porque é que não estás a dormir? Porque é que a mana não anda, não fala, não come iogurte? Porque é que a goiabada é pegajosa? (oi?) Porque é que os cães não usam fralda? (Esta foi quando estávamos a desviar–nos dos “presentes” no passeio… e se calhar não era má ideia.)

É o cérebro deles a desenvolver-se e tem tanto de delicioso como de irritante – o estado de espírito vai depender da hora do dia e do grau de bombardeamento. A primeira coisa que descobrimos é que responder “porque sim” é uma armadilha: não se contentam e depressa passam a dominar o “porque sim, porquê?”, que já começa a ser tramado de responder e nos faz sentir que não estamos a ser criativos e estimulantes o suficiente enquanto pais – dramas da paternidade moderna. No que toca a respostas preguiçosas, já percebi que dizer “não sei”, mesmo quando sabemos, é mais eficaz – dá menos troco. Mas isso não é necessariamente bom: o cérebro deles enche-se de compaixão para com o pai ou a mãe que não sabe… e quem é que quer ser um pai ou uma mãe que não sabe? Facilmente ficamos com sentimentos de culpa – afinal, a goiabada é pegajosa por causa do açúcar (mesmo que isso signifique mais perguntas) e os cães não usam fralda porque ia ser caro e produzir lixo que nunca mais acabava, e porque são cães.

Outra coisa que também parece funcionar é dar respostas muito elaboradas ou sem sentido: para nós é divertido e eles fartam-se ou distraem-se com a maluqueira, mas não sei se os especialistas o aconselharão. A realidade é esta: isto da idade dos porquês parece ser algo estruturante e nós seguimos o instinto, esperamos estar a fazer o melhor para que eles vão apreendendo o mundo e para que essa curiosidade que não deixa passar nada nunca se perca. Portanto, aos pais que estão no mesmo barco, muita pachorra, que suponho que um dia tudo isto passa e o mais provável é ficarmos cheios de saudades.

Entretanto, eis o que nos espera. Uma sondagem junto de 1500 pais, divulgada no final do ano passado no Reino Unido, concluiu que, em média, os miúdos fazem 73 perguntas por dia e o pico chega aos quatro anos – de pergunta em pergunta, a minha vai alegremente a caminho dos três e não me vou pôr a contar perguntas porque senão, entre responder e contar, não fazia mais nada. Segundo o mesmo estudo, os pais têm dificuldade em responder a metade das inquirições e às vezes têm de ir pesquisar – portanto, quando não soubermos responder sobre a física das bolas de sabão e coisas deste género, é pensar que não estamos sozinhos e aproveitar para aprender qualquer coisa. Outra conclusão engraçada é que os pais respondem a mais perguntas do que as mães – estatística que vou passar a usar a meu favor com um fundamentado “o teu pai responde”. E estas foram dez perguntas que os pais ingleses disseram ter dificuldades em responder, caso haja por aí quem queira preparar-se com antecedência.

• Porque é que as pessoas morrem?

• De onde viemos?

• O que é Deus?

• Como fui feito?

• Porque é que não temos dinheiro para comprar isto?

• O Pai Natal existe?

• Porque é que tenho de ir à escola?

• Quando morreres, com quem é que vou viver?

• Porque é que o céu é azul?

Sou mais apologista do carpe diem