2013. A demissão “irrevogável” de Paulo Portas

2013. A demissão “irrevogável” de Paulo Portas


O então ministro dos Negócios Estrangeiros demitiu-se por não concordar com a escolha de Maria Luís Albuquerque para substituir Vítor Gaspar. E disse que era “irrevogável”. Mas durou apenas quatro dias: Portas voltou atrás e manteve-se no governo como vice-primeiro-ministro


No verão de 2013, a bomba caiu sobre o governo de Passos Coelho. Na manhã desse dia, Paulo Portas, na altura ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, apresentou a sua demissão e disse que era “irrevogável”. O pedido acabou por ser recusado pelo primeiro-ministro Pedro Passos Coelho e Paulo Portas permaneceu no governo, mas o episódio despoletou uma crise política.

Tudo começou com a demissão de Vítor Gaspar, ministro das Finanças, tornada pública pelo próprio a 1 de julho de 2013, ou seja, apenas um dia antes do então líder do CDS anunciar que queria sair do governo. Na carta de demissão, o ministro das Finanças queixava-se das dificuldades para fechar a sétima avaliação da troika. Não adiantou pormenores, mas percebeu-se que o entrave foi Paulo Portas, que se opôs à obrigação de aplicar uma taxa às reformas.

O centrista e o social-democrata tinham “conhecidas diferenças políticas”, como o líder do CDS escreveu na carta de demissão. Paulo Portas defendia que o governo de coligação entre o PSD e o CDS devia virar-se mais para o crescimento da economia e menos para as finanças. Quando Vítor Gaspar foi exonerado e Passos Coelho se preparava para o substituir, Paulo Portas viu uma oportunidade para obter as mudanças que queria. Contudo, a escolha para a pasta das Finanças recaiu sobre Maria Luís Albuquerque, que, para Portas, não passava de um “Gaspar de saias”. E o líder do CDS decidiu bater com a porta, sem ninguém saber, nem mesmo os mais próximos do líder centrista.

O país foi apanhado de surpresa quando, a 2 de julho, por volta das 16h20, foi divulgado o pedido de demissão de Paulo Portas qualificado como “irrevogável”. No documento, lia-se que Portas obedecia à sua “consciência”, que “mais não podia fazer” e que discordava da “mera continuidade” no Ministério das Finanças. Até o próprio Passos Coelho se confessou surpreendido com a decisão e revelou dois anos tarde, em 2015, que soube da demissão através de uma mensagem de telemóvel, o que foi desmentido pelo seu parceiro de coligação.

A demissão acabou por ser notícia em quase todo o mundo, alarmou os mercados, afundou a bolsa portuguesa e fez disparar os juros da dívida.

nova ministra toma posse No mesmo dia em que Portas apresentou a demissão, Maria Luís Albuquerque tomou posse, às 17h00 em Belém, numa cerimónia que ficou marcada por um ambiente estranho – com o Presidente da República, o primeiro-ministro e os restantes governantes, incluindo a própria empossada, de cara fechada – e pela ausência dos membros centristas do governo.

A decisão de Paulo Portas foi conhecida apenas meia hora antes da tomada de posse da nova ministra das Finanças e gerou a confusão no CDS. O líder do partido não atendia o telemóvel a ninguém nem respondia a mensagens e os ministros Assunção Cristas e Pedro Mota Soares, bem como os dirigentes do partido, acabaram por não ir à cerimónia. Apenas Paulo Núncio, que se mantinha na equipa como secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, compareceu e assinou o ato de posse.

Poucas horas depois, numa comunicação ao país, o primeiro-ministro desfez as dúvidas sobre uma eventual queda do governo. “Não me demito, não abandono o meu país”, afirmou Passos Coelho, deixando a bola do lado do CDS.

Paulo Portas reuniu com o partido e ficou decidido que ia conversar com o líder do PSD para encontrarem “uma solução viável para a governação em Portugal”. Enquanto aconteciam as conversações entre Paulo Portas e Passos Coelho, a esquerda reclamava eleições legislativas antecipadas. O então líder do PS, António José Seguro, defendia que as legislativas fossem marcadas para o mesmo dia das autárquicas desse ano, ou seja, dia 29 de setembro.

Mas a discordância de orientações entre PSD e CDS durou pouco tempo. Quatro dias depois do anúncio da demissão de Paulo Portas, foi conhecida a decisão final: o centrista continuava no governo como vice primeiro-ministro e Maria Luís Albuquerque mantinha-se como ministra das Finanças.

Paulo Portas acabou por revogar o “irrevogável” e um ano mais tarde, em declarações à SIC Notícias, apresentou o motivo que o levou a voltar atrás na decisão. “A composição do governo ficou mais equilibrada”, disse o então líder do CDS.