A partir dos anos 90, a crise demográfica e o cada vez mais escasso crescimento económico obrigaram a que se procurassem novas formas de desenvolvimento. Como sempre, o Estado devia estimular a economia. Como, se não havia dinheiro? Gastando no presente o que se obteria no futuro com impostos: dívida pública. Mas como, para estes governantes, o Estado não era o único motor económico, foi indispensável que também se contasse com o setor privado. Como, se não havia dinheiro? Pondo as famílias e as empresas a gastar no presente o que ganhariam no futuro: dívida privada.
Este neossocialismo criou uma dívida descomunal porque os governos precisavam de crescimento económico para pagarem as promessas com que ganharam eleições. Agora, em 2018 (o tal futuro), não há dinheiro nem para investimento público nem para investimento privado. Não há mais forma de se gastar hoje o que se espera obter ou ganhar amanhã. Qualquer atividade económica rentável é de tal modo taxada e afogada em regulamentações, é de tal modo vista com maus olhos (veja-se o caso do alojamento local) que a poupança se torna impossível. Sem poupança, não há capital. E com as famílias e as empresas descapitalizadas também não há investimento sustentável. Só dívida.
Chegámos, pois, ao fundo do poço, com as consequências de que muitos portugueses já se deram conta. Talvez porque as eleições estão quase aí, porque a economia está a arrefecer e a dívida pública a bater recordes, PS, PCP e BE também se deram conta que os serviços públicos se encontram em risco de colapso. Escolas sem aquecimento no inverno, falta de material (algumas sem papel higiénico!), hospitais em rutura, em Évora, no Santa Maria, em Lisboa, na Cova da Beira (ah, o interior, o interior), Matosinhos, o São João no Porto, as urgências em Faro (ah, o turismo, o turismo), comboios parados sem manutenção, o metropolitano de Lisboa que já não cumpre horários (bons tempos em que passava de três em três minutos…) e por aí fora, num país que virou a página da austeridade mas que se está a desfazer.
Claro que a diminuição da dívida pública é difícil para qualquer governante. Ela implica que um governo corte na despesa, pague o que se deve e arque com o castigo eleitoral para que, depois, outros, perante umas finanças públicas equilibradas e saudáveis, deem cabo de tudo, prometendo este mundo e o outro ao mesmo tempo que se tornam excelentes governantes e os campeões da popularidade. Também por isso, Portugal não está preparado para o grande desafio que é desenvolver-se sem contração de mais dívida. Até lá, os nossos governantes ainda vivem nos tempos em que governar é distribuir: benesses, poderes, rendas, negócios, cargos que boa parte dos portugueses recebem. Para nos tranquilizar, ainda nos dizem que as vacas voam. Mas, bem lá no fundo da nossa consciência, sabemos que não.
Advogado
Escreve à quinta-feira