Portugal, país da bola ao centro


O Estado vai ter a tentação de se desembaraçar dos “maus negócios”, enquanto as autarquias^ vão querer ficar com a melhor parte do bolo


“Lisboa é Portugal! Fora de Lisboa não há nada. O país está todo entre a Arcada e S. Bento!…”

Eça de Queiroz, “Os Maias”.

O tema, atendendo ao título, até podia ser o futebol mas, desta vez, não quis baixar tanto o nível.

A tão falada descentralização – assunto secular na história portuguesa – voltou à atualidade, agora que a Lei-Quadro do Poder Local e a Lei das Finanças Locais estarão para ser aprovadas no próximo mês de junho.

O assunto foi o tema central da cimeira das áreas metropolitanas de Lisboa e Porto – as “áreas centralizadoras” –, em que o Presidente da República chutou a bola prá frente ao afirmar que o assunto até já “transitou em julgado”. Isto é: caso resolvido.

Só que autarcas com experiência, como Álvaro Amaro, presidente da Câmara da Guarda, ou Carlos Carreira, de Cascais, deitaram água fria no entusiasmo presidencial e alertaram para a questão essencial: o dinheiro.

Falam do denominado envelope financeiro, que terá de conter “muitos milhões” para assegurar a transferência de competências do Estado para as autarquias.

E tudo se vai jogar aqui. O Estado vai ter a tentação de se desembaraçar dos “maus negócios”, enquanto as autarquias vão querer ficar com a melhor parte do bolo em áreas tão importantes como a saúde, a educação, a habitação, o ambiente ou os transportes, entre outras.

A luta não vai ser fácil e alguns autarcas pensam que se nada ficar resolvido até junho deste ano, mais uma excelente oportunidade se vai perder.

Mais uma vez, aí vêm os grupos de trabalho, ainda não constituídos, para iniciarem a discussão.

Uma pergunta: é a primeira vez que este assunto é discutido? Não há um historial dos debates já realizados?

Enfim! Nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto vive quase metade da população portuguesa, isto é, cerca de 4 milhões e meio de pessoas.

Querem mais centro do que isto?

Convém não esquecer também que, e regressando a Eça, em caso do mais que previsível braço-de-ferro, “no terreno do dinheiro, vence sempre quem tem mais dinheiro”.

 

Jornalista