Toupeiras dos três clubes grandes geram mal-estar na PJ e no MP

Toupeiras dos três clubes grandes geram mal-estar na PJ e no MP


Procuradores e juízes já não confiam no Citius e estão a tentar ‘esconder’ vários processos, nomeadamente o caso dos e-mails do Benfica. A ‘clubite’ relacionada com os  clubes grandes preocupa as hierarquias da justiça portuguesa


A justiça está a braços com algumas das maiores investigações de sempre no mundo de futebol, mas a ‘clubite’ acaba por ser um fator decisivo no desenvolvimento dos trabalhos. O i sabe que existe um mal-estar dentro do Ministério Público (MP) e da Polícia Judiciária (PJ) devido a alegadas fugas de informação que têm condicionado as investigações, nomeadamente no que diz respeito ao caso dos e-mails do Benfica. No entanto, não são apenas as ‘toupeiras’ ligadas ao clube da Luz que preocupam as altas instâncias da justiça: as alegadas fugas de informação estão relacionadas com a ‘clubite’ de ‘toupeiras’ também associadas ao FC Porto e ao Sporting.

A informação está a ser passada tão facilmente que há até quem exiba na Internet os dados confidenciais a que tem acesso. Na segunda-feira, o blogue ‘Mercado de Benfica’, que tem divulgado várias informações relacionadas com dirigentes benfiquistas e com o caso dos e-mails do clube da Luz, mostrou que tem acesso à investigação judicial que decorre contra a página. Os autores do blogue divulgaram um ofício da procuradora Vera Camacho, ao que parece dirigido ao serviço de alojamento WordPress, que alberga esta página.

O blogue divulgou o documento no qual a procuradora pede a identificação da morada eletrónica usada para alimentar o blogue, mais precisamente o IP usado a três de outubro de 2017, quando foi divulgado um documento da Polícia Judiciária protegido por lei. O documento, datado de 29 de setembro desse ano e sem qualquer assinatura no final, diz respeito a denúncias de possíveis atos de corrupção por parte de responsáveis benfiquistas junto de funcionários judiciais – trata-se do caso que ficou entretanto conhecido como Operação e-toupeira e que levou à detenção de Paulo Gonçalves, assessor jurídico do Benfica, e do funcionário judicial José Nogueira da Silva. Para além deste blogue, também as páginas ‘Mister do Café’ e ‘O Polvo’ têm revelado informações relacionadas com processos ligados ao Benfica e são associados a adeptos portistas com ligações a fontes da investigação e a vários meios de comunicação, através de jornalistas também simpatizantes do FCP.

Para evitar mais fugas de informação relacionadas com processos que envolvem os vários clubes de futebol, os magistrados tomaram medidas drásticas: o Correio da Manhã revelou ontem que o caso dos e-mails é agora tramitado fora da plataforma informática Citius. A dificuldade em encontrar as ‘toupeiras’ que acedem a esta plataforma e a existências de vários ataques informáticos ao sistema estão na base desta decisão. A mesma publicação revela que vários procuradores e juízes de norte a sul do país optam por não colocar as peças processuais no Citius por não confiarem no sistema.

Questionada sobre a aplicação de processos disciplinares na PJ, fonte oficial disse ao i que “a matéria referente à eventual instauração de procedimentos de natureza disciplinar está abrangida pelo dever de segredo profissional; Por esse facto, não podemos responder à questão que nos foi colocada nem tão pouco s questões subsequentes”. O i também confrontou a Procuradoria-Geral da República com o mesmo assunto, mas, até ao fechod esta edição, não obteve resposta.

“É mais banal do que se pensa”

O fenómeno da ‘clubite’ não é algo novo. Recorde-se, por exemplo, o caso Apito Dourado: o presidente do Futebol Clube do Porto, Pinto da Costa, foi avisado por um alto responsável da PJ do Porto de que seria detido e alvo de uma busca domiciliária no âmbito deste processo, em 2004. 

Fonte ligada à PJ disse ao i que este não é caso único  e que se trata de uma situação mais comum do que se pensa: “Isto é mais banal do que se pensa. É mais fácil um inspetor passar informações privilegiadas ao seu clube do que a troco de muito dinheiro. Não há explicação racional para o que é irracional. Não há hipótese de acabar com isto a não ser afastando as pessoas em causa”.

No entanto, há quem conheça bem a PJ e discorde totalmente desta posição: “Não acredito que haja ‘clubite’ na PJ. Cada inspetor que só pode ver os seus processos. Só têm acesso ao que têm direito, ao que estão a trabalhar Se for inspetor-chefe, só terá acesso aos processos dos seus inspetores (…) A PJ tem uma secção que só trata de futebol -têm o caso dos vouchers, dos emails, etc. Por que razão uns andariam para a frente e outros não? As pessoas que seriam suspeitas de ‘clubite’ – de colocarem na web informações sobre o caso dos e-mails, por exemplo – são as mesmas que estão agora neste caso do e-toupeira. Houve um problema desse género e foi assumido – o processo Apito Dourado. Pinto da Costa foi avisado por um responsável, que acabou por sair”, disse ao i Carlos Anjos, antigo inspetor da PJ agora comentador televisivo.