Crise. Soares dissolveu em 1987. Cavaco não o pode fazer em 2015

Crise. Soares dissolveu em 1987. Cavaco não o pode fazer em 2015


Em 1987, o governo Cavaco caiu e Soares recusou-se a aceitar uma solução de governo PS-PRD.


Abril de 1987. O PRD apresenta uma moção de censura ao governo de Cavaco Silva, que terá o apoio do PS e do PCP. O Presidente da República é Mário Soares.

A gota de água que desencadeou a decisão de apresentar a moção de censura foi a famosa viagem à Estónia, que criaria um conflito raro entre o governo de Cavaco Silva e a Assembleia da República. Ainda não tinha caído o muro de Berlim e ainda havia União Soviética: uma delegação de deputados aceita deslocar-se à Estónia, no âmbito de uma visita à União Soviética. Ora, o Estado português nunca tinha reconhecido a anexação pela URSS das Repúblicas Bálticas. O governo Cavaco censura violentamente e desautiza a Assembleia da República e o seu presidente, o histórico do PSD Fernando Amaral.

O conflito institucional governo-Assembleia da República desagua na apresentação de uma moção de censura pelo PRD, Partido Renovador Democrático chefiado pelo ex-Presidente da República Ramalho Eanes. O PS liderado por Vítor Constâncio e o PCP de Álvaro Cunhal apoiam a queda do governo, num acto que mais tarde, na sua autobiografia, Cavaco Silva consideraria “uma benesse”.

Vítor Constâncio tenta formar um governo com o PRD que apresenta ao Presidente da República Mário Soares. Mas Mário Soares nem tem, à época, particular apreço por Constâncio que era seu sucessor na liderança do PS e sabia que o PRD, que tinha obtido 17% de votos nas eleições de 1985, tinha disparado à conta dos socialistas. 

Mário Soares não aceita a solução de governo que lhe é apresentada pelo parlamento e decide dissolver a Assembleia da República. Foi, sem dúvida, a melhor benesse que Cavaco Silva podia ter tido. Em Julho de 1987, os portugueses dão-lhe a sua primeira maioria absoluta. Desta vez, Cavaco Silva não tem à mão o mecanismo de dissolução da Assembleia da República, uma vez que se encontra nos últimos seis meses do seu mandato, que termina em Março. 

Se se confirmar que Passos Coelho, que se prepara para indigitar como primeiro-ministro, não consegue fazer passar o seu programa no parlamento – coisa para a qual o PS só contribuirá caso tenha um acordo de governo fechado com a esquerda – Cavaco só tem duas hipóteses. Ou dá posse a um governo PS-BE-PCP ou mantém Passos em gestão, deixando a decisão para o próximo Presidente da República. 

Conforme o i noticiou ontem, o Presidente está inclinado em deixar Passos Coelho em gestão até que haja a possibilidade de novas eleições, não empossando o governo de esquerda. No entanto, o acordo de esquerda ainda está longe de estar adquirido. Ontem à noite, prosseguiam as conversações entre o PS e o PCP.