Make Europe Great Again: o lema da cimeira de Madrid

Make Europe Great Again: o lema da cimeira de Madrid


A cimeira que decorreu na semana passada em Madrid, demonstra o momentum da direita europeia. O encontro fica marcado também pelas inúmeras menções a Trump


Sopram ventos de mudança na política internacional. A tendência dos partidos mais conservadores, chamados de extrema-direita, é visível, após algumas décadas de relativo equilíbrio proporcionado pelo centro, principalmente no pós-Guerra Fria. A vitória de Donald Trump galvanizou este movimento, que já estava em curso, e a Europa posiciona-se cada vez mais à direita.
O mapa apresentado abaixo mostra a influência que estes partidos já têm em várias nações europeias, governando em seis e estando perto de chegar à liderança noutras cinco.

‘Make Europe Great Again’
Na semana passada, vários líderes pertencentes à família europeia do Patriots juntaram-se em Madrid numa cimeira que evidencia o momento favorável do movimento. Santiago Abascal, líder do Vox, foi o anfitrião do encontro que contou com a presença do primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, de Marine Le Pen, de Matteo Salvini, de Geert Wilders e também de André Ventura. María Corina Machado, a líder da oposição venezuelana, abriu a conferência com uma mensagem de vídeo. Donald Trump e Elon Musk, mesmo que ausentes, foram figuras maiores do encontro, um ponto comum na maioria dos discursos e a sua marca MAGA (Make America Great Again) é visível no slogan da cimeira (Make Europe Great Again).

Os discursos
«Reunimo-nos aqui hoje não apenas como indivíduos, mas como uma força poderosa unida por uma visão partilhada de otimismo para o futuro», disse Wilders no início do seu discurso. «Enquanto o presidente Trump inaugura uma era dourada para a América, temos de nos perguntar: estamos prontos para fazer o mesmo na Europa? Sim, faremos a Europa grande novamente, porque estamos a ganhar as eleições, as pessoas estão a exigir a mudança», continuou o neerlandês. «Lutaremos pelos nossos valores, lutaremos pelas nossas famílias, lutaremos pelos nossos países e recusamo-nos a ajoelhar perante a agenda extremista da esquerda woke. (…) Prezamos a liberdade e prezamos a nossa própria identidade cultural». «Faremos a Europa grande de novo», concluiu.
Marine Le Pen também referiu a «mudança global» que a eleição de Trump provocou. «Acredito que o poder da Europa reside no poder das suas nações. Neste novo contexto, nós, os cidadãos da Europa, somos os únicos que podem falar com a nova administração Trump».

‘Hoje toda a gente vê que somos o futuro’
«As elites globalistas odeiam-nos», disse Orbán, prosseguindo o ataque ao compatriota George Soros e aos «burocratas de Bruxelas» e focando uma parte considerável do discurso na questão da imigração: «Bruxelas está a afundar a economia europeia. Bruxelas está a enviar o nosso dinheiro para a Ucrânia, para uma guerra sem esperança. Bruxelas fez com que a Europa fosse invadida por migrantes. Bruxelas abriu os portões e as fronteiras a uma invasão de migrantes. Lembro-me que, em 2015, Soros anunciou que deveria ser permitida a entrada na Europa de um milhão de migrantes por ano. E eis que, em nove anos, chegaram nove milhões de migrantes ilegais! A invasão de migrantes ilegais e a substituição da população da Europa não é uma teoria da conspiração – é uma realidade. Como diz a piada negra, está na altura de procurar novas teorias da conspiração, porque as antigas já foram todas provadas como verdadeiras». «O mundo mudou em poucas semanas com o tornado de Trump», continuou. «Uma era chegou ao fim. Ontem éramos os hereges; hoje somos o mainstream. Ontem diziam-nos que éramos o passado; hoje toda a gente vê que somos o futuro», rematou.
Abascal agradeceu a presença dos vários líderes dos partidos pertencentes ao Patriots e a linha do discurso foi semelhante e alinhada com os protagonistas que o antecederam no púlpito. «Não podemos desperdiçar a oportunidade que nos é dada pelos tempos presentes. Vamos ser testemunhas de uma vitória histórica, vamos ser protagonistas de uma vitória histórica e vamos ser uma ferramenta para uma vitória histórica das ideias da liberdade e da soberania. (…) Sem medo a nada nem a ninguém, viva a Europa das pátrias e viva Espanha», concluiu o presidente do Vox.

O que significa esta nova era?
Que a política europeia parece estar a entrar numa nova era, não há dúvida, mas quais são as causas e o que significa isso realmente? «Com o desgaste, em alguns casos a implosão, dos partidos do chamado centrão, abre-se agora uma competição, entre Patriotas e ECR, pela liderança da direita não adversativa na Europa», diz Teresa Nogueira Pinto, professora na Universidade Lusófona, ao Nascer do SOL. «Uma competição que deve ser vista também à luz de “internacional conservadora” que parece estar a formar-se, e que ganhou um grande momentum com a vitória de Trump e com o arranque (frenético ou eletrizante) desta nova Administração nos EUA». Quanto a esta divisão entre os Patriotas e o ECR (do qual a primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni, faz parte), a professora nota que «há bandeiras comuns» como «o controle da imigração, a reivindicação dos valores ocidentais, o combate ao Green New Deal ou ao wokismo». Porém, «o cenário de fusão numa grande força de direita é improvável, desde logo porque para além das diferenças ideológicas (com os Patriotas mais enquadrados na direita radical e o ECR no nacional-conservadorismo), o facto do ECR ter integrado o partido romeno UAR bloqueia, pelo menos a curto e médio prazo, a possibilidade de acordo com o Fidesz [partido de Viktor Orbán]. São também assinaláveis as diferenças no que toca à política externa».

Sobre a cimeira de Madrid
Teresa Nogueira Pinto explica que «o encontro não deve ser visto como uma cimeira de marginais ou exóticos. Os Patriotas integram partidos que estão em posições de vantagem ou venceram eleições nos seus países (o Fidesz no poder na Hungria há bastante tempo, tendo-se constituído como uma espécie de “bastião da resistência” para a direita europeia; o FPÖ na Áustria, ainda que tendo falhado a tentativa de construir uma coligação com os conservadores; o Partido da Liberdade nos Países Baixos; Le Pen que poderá chegar à presidência francesa)». Independentemente disto, «é preciso ter presente que alguns dos partidos que integram os Patriotas também enfrentam uma série de desafios. O Vox, concretamente, tem sido afetado por casos de corrupção, e por críticas internas à liderança de Abascal que, segundo os dissidentes, dirige o partido como se de uma seita se tratasse».
Assim, as próximas eleições prometem para muitos dos partidos da direita e da direita radical europeia, a começar já pela ida antecipada às urnas na Alemanha, onde a AfD, há pouco expulsa do extinto Identidade e Democracia, deverá ser indispensável para a formação de um novo Governo, que, ao que tudo indica, voltará às mãos dos democratas cristãos da CDU.
Com a chegada ao poder destas fações, deverão ficar cada vez mais nítidas as diferenças entre si, mas, definitivamente, a política europeia está a entrar num novo ciclo.