Vêem-se gregos para resolver o problema, mas é portuguesa a solução para o sobre-pastoreio


Instituto Superior Técnico estuda solução para o sobre-pastoreio na ilha grega de Samotrácia.


Samotrácia é uma ilha grega do norte do mar Egeu, perto da fronteira marítima com a Turquia. É esta ilha que dá o nome à famosa Vitória de Samotrácia, escultura que representa a deusa grega da vitória, Nike, frequentemente identificada com Atena (ou Minerva, na mitologia romana), a deusa da sabedoria, apoiante dos portugueses no famoso concílio dos Deuses nos Lusíadas.

À semelhança de outras zonas mediterrânicas, Samotrácia tem vindo a sofrer um processo de degradação ambiental devido ao excesso de pastoreio com caprinos e ovinos. De facto, ao longo do século XX, o número destes aumentou 14 vezes, atingindo cerca de 70 mil. Associado ao declives elevados desta ilha (“Samos” significa “altura” ou “elevação” em grego antigo), este excesso de pastoreio tem levado à erosão e degradação generalizada dos solos; tem também levado à eliminação da floresta e outra vegetação nativa.

Para encontrar soluções para o sobre-pastoreio, em 2017 foi iniciado um estudo liderado por Marjan Jongen, investigadora holandesa do Instituto Superior Técnico radicada em Portugal, em colaboração com a Terraprima, spin-off do Técnico, com um técnico português (António Martelo), com investigadores austríacos (Marina Fischer-Kowalski, Dominik Noll) do Instituto de Ecologia Social em Viena e com um técnico grego local (Giorgos Maskalidis).

Este estudo focou-se na utilização de pastagens permanentes semeadas biodiversas ricas em leguminosas (PPSBRL). Este é um pioneiro sistema desenvolvido pelo agronómo português David Crespo desde os anos 60 do século passado, inicialmente na Estação de Melhoramento de Plantas (hoje Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária) e posteriormente na empresa que criou, a Fertiprado.

Estas pastagens são semeadas com misturas biodiversas de até 20 espécies ou variedades diferentes, que permitem uma adaptação às muito variáveis condições mediterrânicas de solo e de meteorologia. A sua riqueza em leguminosas permite-lhes resolver o problema crítico que o azoto constitui como nutriente para os sistemas agrícolas. De facto, o azoto na atmosfera, tal como expresso na sua etimologia grega (“a-zoion”, isto é,  sem vida), é um gás inerte, que precisa de ser transformado noutros compostos químicos para poder ser utilizado pelas plantas. As leguminosas (plantas como os trevos ou a serradela) conseguem tal através da sua consociação com rizóbios (do grego “rhiza”, i.e., raiz, e “bio”, i.e., vida), bactérias que colonizam a raiz das plantas e que lhes fornecem os compostos azotados (que obtêm da atmosfera) em troca de hidratos de carbono (que as plantas obtêm através da fotossíntese).

Estas características das PPSBRL permitem-lhes ter uma maior produtividade, que se traduz em mais alimentos para os animais, mas também em maiores entradas de biomassa no solo todos os anos, que leva a um aumento da matéria orgânica do solo. Dado que mais de metade da matéria orgânica do solo é carbono, este aumento traduz-se em sequestro de carbono no solo e correspondente retirada de dióxido de carbono da atmosfera. Assim, os agricultores que semeiam estas pastagens estão a prestar à sociedade um serviço de mitigação das alterações climáticas. O reconhecimento de tal levou à montagem do projecto Terraprima – Fundo Português de Carbono, com o envolvimento de mais de 1000 agricultores e a sementeira de mais de 50 mil hectares de PPSBRL em Portugal, com o sequestro de mais de um milhão de toneladas de dióxido de carbono. Este projecto, com a sua vitória no concurso “A World You Like with a Climate You Like”, foi considerado pela Comissão Europeia como a melhor solução para o clima na Europa em 2013.

O estudo realizado na ilha de Samotrácia confirma que, tal como em Portugal, as PPSBRL têm uma produção mais elevada (de 7 a 10 toneladas anuais por hectare) que as pastagens pobres actualmente utilizadas. Tal permite alimentar melhor os animais nos terrenos mais produtivos e diminuir a pressão de pastoreio nos terrenos pobre e declivosos, levando à recuperação do solo destes e à re-entrada da vegetação natural. Adicionalmente, nos próprios terrenos onde são semeadas, levam, tal como em Portugal, ao aumento da matéria orgânica do solo, aumentando a retenção de água, reduzindo o escorrimento superficial e reduzindo a erosão. Temos assim mais uma aplicação vitoriosa desta pioneira solução lusa.

Professor de Ambiente e Energia no Instituto Superior Técnico

Vêem-se gregos para resolver o problema, mas é portuguesa a solução para o sobre-pastoreio


Instituto Superior Técnico estuda solução para o sobre-pastoreio na ilha grega de Samotrácia.


Samotrácia é uma ilha grega do norte do mar Egeu, perto da fronteira marítima com a Turquia. É esta ilha que dá o nome à famosa Vitória de Samotrácia, escultura que representa a deusa grega da vitória, Nike, frequentemente identificada com Atena (ou Minerva, na mitologia romana), a deusa da sabedoria, apoiante dos portugueses no famoso concílio dos Deuses nos Lusíadas.

À semelhança de outras zonas mediterrânicas, Samotrácia tem vindo a sofrer um processo de degradação ambiental devido ao excesso de pastoreio com caprinos e ovinos. De facto, ao longo do século XX, o número destes aumentou 14 vezes, atingindo cerca de 70 mil. Associado ao declives elevados desta ilha (“Samos” significa “altura” ou “elevação” em grego antigo), este excesso de pastoreio tem levado à erosão e degradação generalizada dos solos; tem também levado à eliminação da floresta e outra vegetação nativa.

Para encontrar soluções para o sobre-pastoreio, em 2017 foi iniciado um estudo liderado por Marjan Jongen, investigadora holandesa do Instituto Superior Técnico radicada em Portugal, em colaboração com a Terraprima, spin-off do Técnico, com um técnico português (António Martelo), com investigadores austríacos (Marina Fischer-Kowalski, Dominik Noll) do Instituto de Ecologia Social em Viena e com um técnico grego local (Giorgos Maskalidis).

Este estudo focou-se na utilização de pastagens permanentes semeadas biodiversas ricas em leguminosas (PPSBRL). Este é um pioneiro sistema desenvolvido pelo agronómo português David Crespo desde os anos 60 do século passado, inicialmente na Estação de Melhoramento de Plantas (hoje Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária) e posteriormente na empresa que criou, a Fertiprado.

Estas pastagens são semeadas com misturas biodiversas de até 20 espécies ou variedades diferentes, que permitem uma adaptação às muito variáveis condições mediterrânicas de solo e de meteorologia. A sua riqueza em leguminosas permite-lhes resolver o problema crítico que o azoto constitui como nutriente para os sistemas agrícolas. De facto, o azoto na atmosfera, tal como expresso na sua etimologia grega (“a-zoion”, isto é,  sem vida), é um gás inerte, que precisa de ser transformado noutros compostos químicos para poder ser utilizado pelas plantas. As leguminosas (plantas como os trevos ou a serradela) conseguem tal através da sua consociação com rizóbios (do grego “rhiza”, i.e., raiz, e “bio”, i.e., vida), bactérias que colonizam a raiz das plantas e que lhes fornecem os compostos azotados (que obtêm da atmosfera) em troca de hidratos de carbono (que as plantas obtêm através da fotossíntese).

Estas características das PPSBRL permitem-lhes ter uma maior produtividade, que se traduz em mais alimentos para os animais, mas também em maiores entradas de biomassa no solo todos os anos, que leva a um aumento da matéria orgânica do solo. Dado que mais de metade da matéria orgânica do solo é carbono, este aumento traduz-se em sequestro de carbono no solo e correspondente retirada de dióxido de carbono da atmosfera. Assim, os agricultores que semeiam estas pastagens estão a prestar à sociedade um serviço de mitigação das alterações climáticas. O reconhecimento de tal levou à montagem do projecto Terraprima – Fundo Português de Carbono, com o envolvimento de mais de 1000 agricultores e a sementeira de mais de 50 mil hectares de PPSBRL em Portugal, com o sequestro de mais de um milhão de toneladas de dióxido de carbono. Este projecto, com a sua vitória no concurso “A World You Like with a Climate You Like”, foi considerado pela Comissão Europeia como a melhor solução para o clima na Europa em 2013.

O estudo realizado na ilha de Samotrácia confirma que, tal como em Portugal, as PPSBRL têm uma produção mais elevada (de 7 a 10 toneladas anuais por hectare) que as pastagens pobres actualmente utilizadas. Tal permite alimentar melhor os animais nos terrenos mais produtivos e diminuir a pressão de pastoreio nos terrenos pobre e declivosos, levando à recuperação do solo destes e à re-entrada da vegetação natural. Adicionalmente, nos próprios terrenos onde são semeadas, levam, tal como em Portugal, ao aumento da matéria orgânica do solo, aumentando a retenção de água, reduzindo o escorrimento superficial e reduzindo a erosão. Temos assim mais uma aplicação vitoriosa desta pioneira solução lusa.

Professor de Ambiente e Energia no Instituto Superior Técnico