Na Margem Sul há uma oficina portuguesa só dedicada ao restauro de carrinhas antigas Volkswagen e que respeita os modelos originais. Clara Silva deu lá um salto. E descobriu relíquias. Há carrinhas de 300 mil euros e a maior parte vai para revenda na Holanda. António Pedro Santos fotografou
Comprar a primeira carrinha foi o que bastou para que António Rodrigues, 47 anos, largasse o seu trabalho numa imobiliária e montasse uma oficina. “Comprei outra carrinha, pus aquela à venda. Voltei a vender e foi uma sequência… Comprei uma, duas…”
Dez anos se passaram e estamos em Casal do Marco. Onde fomos parar! É verdade, mas a visita vale a pena. Na zona industrial, os armazéns sucedem-se, feios, cinzentos, até que surge alguma cor no horizonte. Veronika, uma pão de forma verde-alface, até parece piscar um farol.
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Estamos na Vintage Vans, o último armazém do parque industrial, a oficina que António montou para o restauro de carrinhas Volkswagen que são verdadeiras relíquias. À porta, um carocha amarelo também alivia a paisagem. Além das carrinhas da marca alemã, os carochas são os únicos modelos com autorização para entrar.
Lá dentro cada empregado – na oficina, e com António, trabalham nove pessoas – parece dar atenção a uma carrinha ou uma parte dela. Há quem arranje um estofo, há quem desmonte peças. “Somos diferentes porque restauramos os carros como eles eram originalmente. Tratamos de tudo, da parte mecânica à parte dos estofos”, explica António. “Sempre de acordo com os parâmetros de origem ou do cliente.”
A maior parte dos clientes não é portuguesa. “Noventa por cento são estrangeiros: holandeses e alemães”, acrescenta. Os portugueses são os sócios da empresa de aluguer de carrinhas SurfinPortugal, com quem têm um acordo. “Entregámos-lhes quatro carrinhas e vamos entregar mais duas, sempre respeitando as cores pastel da época.” Uma carrinha também há-de ser em breve pintada de cor-de-rosa, “para despedidas de solteira, porque dizem que tem havido muitos pedidos”.
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E agora a pergunta que vai na cabeça de toda a gente que já se imagina a conduzir uma pão de forma a 80 km/h pelas estradas do país (não dão mais que isso): Quanto custa uma brincadeira destas? “O modelo que foi descontinuado em 67 custa em média 40 mil euros”, conta António. Mas valoriza. Há uns anos vendeu uma por 50 mil euros a um coleccionador que tinha comprado um Ferrari por 120 mil euros. “Tinha-o comprado há três ou quatro anos e acabou por vendê-lo outra vez por 60 mil euros. A carrinha, que comprou por 50, vendeu por 60. É assim: as carrinhas já não se fazem e os Ferraris continuam a fazer-se.”
Se não se fazem de onde vêm as peças? Segundo António, há 15 anos seria impossível encontrar peças para estas carrinhas. “Hoje já há meia dúzia de fábricas, três delas muito grandes. É uma grande ajuda ter essa base para trabalhar.”
As peças deixaram de ser um problema – até as vendem na loja a quem quiser comprar. O verdadeiro desafio é “arranjar mão-de-obra”. “É muito difícil porque ninguém quer trabalhar nisto. É um trabalho muito porco, muito sujo, porque é tudo chapa podre, ferrugenta”, explica António.
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As carrinhas são encontradas por esse país fora – segundo António, a internet veio dificultar as coisas porque as expõe mais – e outras vêm do estrangeiro, dos Estados Unidos ou de Espanha, por exemplo.
Muitas são tão fiéis ao original que nem têm cinto à frente. “Podem andar assim, até porque isso só se tornou obrigatório a partir de 1967”, tranquiliza António
Quando chegam são capazes de ficar na oficina durante “um ano e meio, dois anos” até estarem prontas. “Os clientes têm sempre pressa, mas tem de estar tudo pronto e afinado e isso demora.”
Trabalho não lhes falta. “Não estamos a aceitar trabalhos novos nos próximos três anos”, afirma António. Três anos! A culpa é do principal cliente, uma empresa holandesa que faz revenda e tem ocupado grande parte das encomendas. “Para eles isto não tem muito segredo, lá têm mão-de-obra a 55 euros e a gente tem mão de obra a 25 euros…”
É para eles também que António está a restaurar uma preciosidade que deverá estar pronta em Setembro e que neste momento repousa ao lado de uma jukebox antiga e de uma máquina de refrigerantes, as duas vindas dos Estados Unidos dentro de uma – para variar – carrinha. “Estivemos agora numa feira na Holanda com ela”, conta. “Vale 300 mil euros e já leva 2600 horas de trabalho.” Em material a soma já é de 70 mil euros – 12 mil euros só com os estofos.
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Nisto do restauro pouco importa o bom gosto ou combinar cores. O que valoriza mesmo é a lealdade aos modelos originais. “Se pusermos um estofo ao nosso gosto perde-se 50% do valor do carro”, explica António. É por isso que encomenda os estofos a um fornecedor original, “um velhote” que mora nos Estados Unidos.
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Vintage Vans, Zona Industrial de Casal do Marco, Seixal. www.vintagevans.com.pt
Tel: 939 554 474